Quem o conhece não imagina que, com toda aquela calma, simpatia, e humildade, existe um verdadeiro monstro nas ondas.
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Calma. Monstro sim, mas com muito carisma e educação. Assim é Márcio Farney Loureiro da Rocha, que no auge dos seus 25 anos, é mais um exemplo de excepcional talento em desperdício.
Farney é natural do Ceará e aportou em Florianópolis há cerca de oito anos.
Figura cativante no meio do esporte, o surfista desde cedo aprendeu a se portar fora de casa. Quando está em ação, o atleta impressiona até mesmo o mais experiente dos surfistas.
Adepto convicto do surf forte e radical, Farney vive o mesmo drama de muitos outros surfistas profissionais. Está sem um patrocinador há quatro anos.
O jovem talento se esforça muito para se ?manter e bancar? seus próprios custos durante os campeonatos. Investe tudo o que ganha de premiação, sem sobrar nada.
Desta maneira, como ele mesmo diz, e muitos de nós sabemos, não há como mostrar resultados.
Confira, nesta entrevista exclusiva, um pouco da personalidade de Márcio Farney, que, através de poucas palavras, mostrou o que a sociedade levou anos para aceitar. Que além de profissional, o surfista atual é consciente, inteligente nada alienado.
Como você se iniciou no surf e quem foram seus principais influenciadores no esporte?
Foi em uma praia ao Sul de Fortaleza (CE), chamada Caponga. Meus pais se separaram e minha mãe foi morar nessa praia. Meu irmão mais velho surfava e eu ficava com muita vontade de aprender, mas eu só tinha 3 anos e ele não se arriscava em me colocar no mar. Às vezes eu e meu outro irmão roubávamos a prancha do mais velho e levávamos na cabeça correndo até a praia para dar tempo de aproveitar algumas ondas. Depois meu irmão viu que não tinha jeito e decidiu me dar uma chance, agradeço a ele, pois foi o primeiro a me fazer andar sobre as ondas e estou até hoje dedicando a minha vida inteira ao surf.
Meus influenciadores no esporte foram Fábio Silva, Tita Tavares, Lucinho Lima, Bichinho, César Picuréia, eram muitos que tinham um surf bastante radical para me espelhar.
Há quanto tempo você vive em Florianópolis? E qual o motivo da sua vinda para a ilha?
Há cerca de oito anos. O principal motivo foi treinar em ondas melhores e geladas, para me adaptar às condições que enfrentava durante as competições pelo Brasil, e pela quantidade e qualidade de ondas boas.
Quais as principais diferenças da cultura local dos surfistas daqui do Sul e do Nordeste?
Não tem muita diferença na cultura do surf. Em qualquer lugar do mundo, os gostos, as conversas são as mesmas. O que muda é a cultura tradicional do lugar. Aqui no Sul, um pouco mais fechada para quem vem de fora, tem que ter força de vontade e muita dedicação para ficar, até se destacar e ser reconhecido. Mas existem muitas pessoas especiais e acolhedoras também, lugares mágicos que te fazem não parar de lutar pelo seu sonho. O guerreiro cresce com as dificuldades e fica forte para combatê-las.
Todos sabem que o Nordeste é um celeiro de talentos. Corrija-me se eu estiver errado, mas, por que tenho a impressão de que os circuitos por lá são desvalorizados? Não há investimentos?
Todo mundo sabe que existem muitos e muitos talentos pelo Nordeste, em lugares que ninguém imagina, onde desde criança surfam ondas de corais. Se eles tivessem oportunidade de ter um patrocínio para competir desde pequeno e viajar para se aprimorarem, o Brasil, com certeza iria ter o triplo de atletas de ponta nos circuitos nacionais e internacionais. Na minha época de categoria de base era muito bom, tanto no número de etapas como nas premiações. Mas a discriminação, no Nordeste, com os surfistas é muito grande e a falta de respeito com o valor pago aos atletas, que têm sempre de viajar com dificuldades. Os patrocinadores precisam se sensibilizar mais! Quanto mais o atleta ganhar, mais poderá fazer para evoluir ao longo de sua carreira.
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Por ter vindo do Ceará, você sofreu algum tipo de preconceito aqui na região Sul? Que tipo de preconceito?
Preconceito existe em qualquer lugar. Alguns gostam da sua cara, outros não, alguns te acham folgado, outros te acham gente boa. Alguns acham que você está roubando o espaço deles, mas as pessoas precisam entender que todo mundo tem algo a passar para o outro, a ensinar coisas que só aprendemos fora do seu lugar.
Já sofreu devido ao localismo? Em quais praias você surfa mais?
No começo sim, pois era meio solitário. Agora conheço muita gente e tenho muitos amigos. Mas sei como me comportar nos picos onde o localismo é maior e acho que esse é um dos segredos.
Não sou mais tão fominha como no começo, agora conheço vários picos secretos e surfo sem ninguém ou com amigos. Trocamos informações importantes para a evolução. As praias são praia Mole, Galheta e um secret na região.
Quem são seus maiores parceiros de treinos aqui em Florianópolis?
Raphael Becker, Nishirra, Havenga (meu shaper) e a galera da escolinha Surfclub Praia Mole, com o professor Roger, com quem comecei a fazer um trabalho sério agora para a evolução no surf.
Assim como eu, muitos gostam do teu surf e estilo. Por que você acredita que ainda não conseguiu patrocínio principal? Há quanto tempo está sem patrô?
Estou sem patrô há quatro anos. Acho que está próximo o dia em que vou poder competir sem preocupação e chegar à competição leve, só pensando em surfar bem e fazer o que mais sei e gosto. Ainda sinto que não devo desistir e vou lutar enquanto tiver forças e pessoas para me ajudar.
Você acredita que existe certo preconceito por parte dos empresários, no sentido de padrão de beleza e estética mesmo? Um cara loirinho, olhos claros, fortinho e tatuado consegue patrocínio mais fácil? Independente do surf que apresenta?
(Muitos risos). Realmente essa pergunta é muito delicada de responder. Veja só a Tita Tavares, que talento!! Há quanto tempo sem um bom patrocínio, né?
Sei que ainda não é o suficiente, mas está havendo um maior investimento gradativo no esporte. O que está faltando para se tornar um esporte extremamente profissional de uma vez por todas? Muitos atletas ganham uma ninharia e ainda são pagos com roupas e acessórios.
O Brasil é o segundo maior consumidor do mundo de surfwear e um dos que menos investe. Se compararmos o Brasil com a Austrália, EUA, etc, o Brasil investe ainda muito pouco no surf. Como é a realidade do País, acho que é a realidade do surf atual, existe poucos com muito e muitos com muito pouco. Sem oportunidade de mostrarem seu potencial, dificultando ainda mais as chances de chegar lá! Poderia haver uma sensibilidade maior dos empresários e empresas, não só de surfwear, todas as empresas que usam a imagem do surf, para olhar com mais carinho e atenção aos grandes talentos que temos hoje e que, como você mesmo citou, somente com peças e acessórios não conseguiriam chegar muito longe. A dificuldade da competição sem patrocínio é muito grande!
O surf virou moda de vez, está em todas as classes sociais, na mídia em geral. Você acredita ser um bom fator para o esporte ou algo ruim?
Acho bom para o crescimento do esporte, pois acho que, em alguns anos, grandes empresas que hoje estão fora do surf, como bancos, escolas, universidades e empresas aéreas estarão apoiando. O esporte ficará mais reconhecido e não dependerá somente das marcas de surf.
Gostaria de deixar algum recado?
Aos surfistas, para lutar pelo crescimento do esporte. Não podemos deixar desvalorizar o surfista profissional. Temos que multiplicar cada vez mais o número de profissionais que lutam pelos nossos direitos, para que as novas gerações possam ter um caminho mais amplo e fácil, e assim conquistar lugares mais altos nos pódios.
Ping pong
Ídolo: Neco Padaratz
Pico predileto: Secret
Viagens inesquecíveis: Hawaii
Prancha mágica: Havenga 6?0 e 5?11
Melhor manobra: tubo e curvas perfeitas.
Odeio: me estressar na água
Adoro: surfar com amigos
Superstição: não tenho