Lance Carson foi o caçula da trupe que dominava Malibu, na Califórnia (EUA), nos anos 50 e 60, da qual faziam parte Miki Dora, Mickey Muños e Mike Doyle.
Muitos dizem que Lance era o melhor deles, como John Milius, surfista, diretor de Hollywood e roteirista.
“Ele foi o melhor surfista de Malibu. Leu as ondas melhor, nunca cometia erros e só caía quando relaxava ao final da onda… ou se estivesse bêbado”.
Tudo acontecia em Malibu. Era o ponto de encontro de artistas de cinema, músicos, universitários e claro, surfistas. Carson viveu tudo aquilo intensamente, desde antes das lojas de surf e os Beach Boys existirem, quando Malibu não tinha crowd durante a semana.
“Se eu não estivesse na água, eu me sentava na praia e ficava estudando os estilos de mestres como Matt Kevlin e Miki Dora. Eu sabia que o surf ia ser a minha vida para sempre”, diz Carson.
Dora e Carson definiram o rumo das coisas em Malibu. Lance era mais arrojado nas curvas, com noseriding naturalmente impecável. Miki parecia um pouco mais teórico, mas mesmo assim fez mais fama pela personalidade e atitudes polêmicas.
Sem muito interesse em competições, em 1965 foi eleito pela Surfer como o segundo melhor noserider do mundo, atrás apenas do incontestável David Nuuhiwa. No ano seguinte estrelava no poético Endless Summer, de Bruce Brown.
A narrativa bem humorada de Bruce em uma de suas ondas diz que ele está tão relaxado no bico da prancha que parece estar esperando um sanduíche de presunto.
O legado de Lance poderia ser bem maior, mas Malibu lhe deu também o lado escuro da badalação. Naquela época vários surfistas californianos se envolveram com cinema e com ele não foi diferente.
Nos anos 60 foram três filmes, além de ter sido estrela do documentário Lendas de Malibu (1987) e ter inspirado o personagem Matt Johnson, talentoso surfista com problemas alcoólicos, em Big Wednesday (1978).
Durante os anos 60 e 70, Lance bebeu com a mesma vontade que surfava em Malibu, lamentando-se mais tarde dos anos de selvageria, que o teriam levado a ser uma pessoa de segunda categoria, como ele mesmo se definiu naquele período.
Reergueu-se como pessoa, atuando como um dos primeiros ambientalista no meio do surf e também ajudou a lançar a Surfrider Foundation.
Mesmo não tendo criado uma lenda mística como Dora, Lance é unanimidade quando se fala no surf clássico californiano, afinal ele nunca deixou de surfar de longboard, mesmo após a revolução das shortboards no final dos anos 60.
Começou a shapear na metade da década de 60, quando trabalhou na Jacobs Surfboards, em Hermosa Beach.
Em 1976 antecipou a retomada do longboard, fundando sua própria marca de pranchas, explorando seu modelo 9’6 noserider, que vendia para as lojas ao redor de Santa Mônica.
“Durante os anos 70, as pranchas diminuíram e isso revolucionou completamente o surf. Os pranchões desapareceram, era raro encontrar um para surfar e muito menos uma placa para moldar um pranchão. Nunca gostei do que vi em pranchas pequenas. Era muita performance, mas nenhum estilo. Era como se eles estivessem tentando se mostrar em vez de apenas se divertir. Eu ainda usava meu 10 pés e me sentia como um peixe fora d’água. Era provavelmente o único cara na Califórnia que não abandonou o longboard. Ouvia muitas críticas que eu não estava acompanhando as tendências e realmente me perguntava se estava fazendo a coisa certa. Mas resisti e em 76 moldei uns paddleboards, que transformei em longboards para vender e tentar resgatar o interesse nos pranchões. Honestamente não quero ter a pretensão de ser responsável pelo ressurgimento do longboards, mas por meados dos anos 80 eles estavam de volta”.
Lance Carson foi o responsável por difundir também a pintail. Em 66 a febre de marketing das fábricas de pranchas que explodiam na Califórnia era que cada surfista patrocinado tivesse um modelo de prancha assinado.
David Nuuhiwa e Phil Edwards foram os primeiros e logo o pessoal da Jacobs sugeriu que Lance tivesse a sua. Perguntado sobre qual modelo ele gostaria de usar para surfar Malibu e Rincon, ele quebrou a escrita das rabetas quadradas e sugeriu uma pintail, inspirada numa prancha que havia tido no fim dos anos 50.
“Os modelos de assinatura dos anos 60 representou um ajuste fino nos designs de longboard. No caso dos meus modelos, estávamos fazendo de 10 a 15 desses pintails em uma semana!”.
Hoje ainda dedica seu tempo fazendo pranchas e surfando. É muito requisitado na Califórnia e gosta de dar atenção especial aos clientes.
“Cada prancha minha feita nos dias de hoje representa quase 60 anos de experiência de surf e quase 45 de shape. Eu sou dos idos de 1950. Eu estava lá. Lembro-me das formas, bem como que o equilíbrio que é essencial na formação de um longboard. Nos últimos anos eu decidi manter o hand shape, em vez de usar o computador. Eu prefiro pensar em fabricação de prancha mais como uma forma de arte do que um negócio. Absolutamente todas minhas pranchas são personalizadas, não gosto nem de licenciar meus moldes para possíveis interessados em fabricá-las no exterior. Elas refletem um estilo de surf que é parte de minha alma”.