Eric Arakawa

Por trás das lendas

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Eric Arakawa, o homem por trás dos foguetes de lendas como Andy Irons, Derek e Michael Ho. Foto: Reprodução / Instagram.

 

Por trás de cada grande surfista, existe um grande shaper, e as pranchas de Eric Arakawa encontraram o seu caminho junto a algumas lendas mundiais. Andy Irons, Michael Ho, Fred Patacchia e Reef McIntosh são alguns dos nomes que registraram performances incríveis com pranchas produzidas pelo shaper.

Do seu ateliê, no North Shore de Oahu, no Havaí, ali, bem próximo da casa onde passou sua infância, ele fala um pouco do que o inspirou ao longo dos anos na fabricação de algumas das melhores pranchas.

 

Como foi sua primeira experiência como shaper?

Meu pai e eu estávamos caminhando perto de um prédio de apartamentos e vimos parte de uma “gun” saindo de uma caçamba de lixo. Tinha provavelmente 3 pés, mas meu pai cortou em um formato de round pin. Essa foi a primeira vez que eu vi espuma de poliuterano. Eu estava com meus dois irmãos e lembro de uma noite, quando nós três nos juntamos em volta dessa pequena prancha e começamos a lixá-la. A gente queria fazer parte do processo. Foi muito divertido.

Como você acabou shapeando em tempo integral?

Eu não sabia como conseguir uma prancha, mas meu pai tinha uma 6’6″ twin fin shapeada por Craig Sugihara, um dos fundadores da Town & Country. Ela tinha 3 ½” de espessura, então decidi que tinha tamanho suficiente para eu shapeá-la com outro formato, até virar outra prancha. Não lembro de pedir permissão ao meu irmão, mas eu era o mais velho, então isso não importava muito (risos). Cortei e raspei até ela virar uma 5’8’’ veloz, round pin. Eu lembro que, quando terminei, achei ela linda, mas ao tentar usar em Pupukea, bom, como posso dizer, hoje tenho certeza de que foi a pior prancha que já usei. As proporções estavam todas erradas, mas eu aprendi a partir disso. E aí, um amigo pediu pra eu shapear uma prancha pra ele, mas dessa vez eu fiz uma prancha de verdade e meu amigo sabia que eu estava arrasando. Essa realmente pareceu uma prancha de surfe. Eu não sei te dizer como ela se portava na água, mas ela ficou bonita. Isso tudo foi muito encorajador e me levou a outro amigo, que também pediu uma prancha. Logo depois, amigos dos meus amigos me pediam pranchas e um dia eu pensei “talvez já esteja nesse negócio”.

 

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Michael Ho em ação no The Clash of the Legends, em Haleiwa, Havaí. Foto: © WSL / Rowland.

Como o seu relacionamento com surfistas consagrados mundialmente influenciaram sua vida como shaper?

Alguns foram mais benéficos que outros. Algumas parcerias são inestimáveis e outras são mais passivas. Depende do atleta. Quando Michael Ho começou a usar minhas pranchas, sem dúvida, ele afiou minhas habilidades e desenvolveu meu design mais do que qualquer outro atleta até hoje. Ele, provavelmente, foi a pessoa mais difícil pra quem eu tive que fazer uma prancha. Isso não foi uma coisa negativa, mas ele era muito exigente. Houve muitas vezes que eu shapeei pra ele, mas ao entregar, ele dizia que a prancha não estava boa e que ele não poderia ganhar usando ela. Ele sempre procurou a prancha mágica. Houve vezes frustantes e outras vezes muito desafiadoras. Se não fosse por esse relacionamento no início da minha carreira, hoje eu estaria atrasado. Trabalhar com ele me ajudou no trabalho com outros surfistas que vieram depois, como Andy Irons. Agora, eu estou trabalhando com Reef McIntosh e Freddy Patacchia.

E como foi trabalhar com Andy Irons? 

 

Quando a gente olha a geração do Andy, é diferente da geração do Michael. Esse lance corporativo entrou na jogada. Tinha muito mais dinheiro em questão, muito mais eventos, e foi tudo muito rápido. Dificilmente havia tempo para sentar e desenvolver, de fato, o equipamento, seguindo o mesmo processo que eu segui com o Michael. Então, a gente decidiu fazer um monte de pranchas e deixá-las prontas para ele testar. É muito comum agora para um profissional ter umas 100 pranchas por ano. Eu não consigo lembrar de ter uma pausa naquela época. Em 1998, Andy ganhou o US Open e o OP Pro com uma 6’2″ round pin thruster. Era uma prancha novinha em folha, ele nem tinha usado antes do evento. Michael nunca teria feito isso. Ele nunca colocaria uma prancha na mala antes que ele realmente conhecesse a prancha. Alguns anos depois, Andy estava tentando se qualificar no Pipe Masters. Eu o vi caminhando para a praia com uma 7’6’’que ele nunca havia usado. Ele tava passando parafina nela. “Ah, essa prancha vai rolar”, ele disse antes de ir pro mar. Era uma bateria com Luke Egan, e Andy arrasou com ele. Ele conseguiu um 10 perfeito em uma onda no segundo reef depois de conseguir um bom tubo, e se requalificou. Eu ficava coçando minha cabeça na ocasião e, quando ele saiu, eu falei “bem, funcionou, mas eu não recomendaria fazer isso de novo”.

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“Estávamos passando por algumas fotos emolduradas que perderam o seu espaço na parede nas recentes renovações e me deparei com esta. Este tubo no Gotcha Pro foi um dos meu favoritos nos tempos de AI. Na sequência da foto, dá pra ver como ele crava suas garras, faz um drop aéreo de backside um nível abaixo do mar, e vestindo apenas uma camiseta, ele olha para câmera. É como se a foto dissesse ‘É assim que lendas parecem’. Sinto sua falta Andy”, escreveu Arakawa em seu Instagram. Foto: Reprodução / Instagram.

  

Qual é parte de ser um shaper que você mais gosta?

 

A melhor parte de ser um shaper são os relacionamentos que você cria. Eu amo muito trabalhar com pessoas que levam o seu trabalho a sério, que têm uma paixão de verdade pelo que fazem. Eu tenho um time incrível de pessoas trabalhando comigo e isso me permite fazer o que eu gosto de fazer. Se não fosse por eles, eu nem teria tempo de fazer isso. Hoje, eu procuro fazer cada parte do meu trabalho divertido e agradável. Eu só quero passar mais tempo investindo em pessoas. Isso é tudo o que importa no final, a verdadeira riqueza está nos relacionamentos. No meio do oceano, no limite da selva, em uma refinaria de açúcar abandonada com paredes rachadas e chão empoeirado, conceitos revolucionários estão se formando, ideias de ponta estão se agitando e o futuro das pranchas está cuidadosamente e artisticamente criando forma. Não há sinais lá fora, nem publicidades para isso nas revistas. O único som é o zumbido distante de uma plaina mecânica, escutada entre a série de ondas ao redor. Os únicos sinais são as armas de precisão a laser que dominam as séries locais. A única indicação é o sutil ronco industrial, como as primeiras ondas de uma ondulação que se aproxima. Porém, acredite em nós, a verdadeira faceta das pranchas do século 21 está praticamente sobre nós. Tudo o que você precisa fazer é abrir sua mente. 

Quando foi informado que seria nomeado o “Shaper do Ano” da Surfing Magazine, Eric Arakawa completou: 

“Posso pensar em outros 10 caras que merecem mais do que eu”, ele disse, rascunhando uma lista rápida de seus contemporâneos. Esse é o tipo de cara que ele é. De voz suave, gentil e educado, extremamente humilde, o shaper da Hawaiin Island Creations, Eric Arakawa, prefere repassar o crédito para seus colegas, seus atletas, até para a própria história. Mas, como ele não vai reivindicar, nós iremos. 

Seus trinta anos de shaper estão enraizados (shapeava desde os 14 anos de idade), datando antes mesmo da fama das grandes marcas de surfe, como Lightning Bolt, Surfline Hawaii, Town and Country, e agora HIC. Sua relação com as grandes lendas havaianas, como Derek e Michael Ho, inspirou e elevou suas habilidades de shaper a novos níveis de perfeição, fazendo dele o shaper preferido de muitos do North Shore, principalmente entre os surfistas que curtiam o modelo gun, incluindo o campeão mundial e por sete anos atleta da HIC, Andy Irons. 

Enquanto seus designs tradicionais de poliuretano permanecem ente os mais respeitados nos picos tubulares do mundo, o entusiasmo de Arakawa permanece inteiramente no mecanismo gigante de metal, que ocupa sua sala de shapear, e no laptop, no qual ele continua a refinar e temperar o design de se quiver. Sendo um dos primeiros shapers a acolher a arte do desenho assistido por computador (CAD), as habilidades de Arakawa são amplamente reconhecidas como uma das melhores no mercado. E como as novas tecnologias se renovam, Arakawa tem estado consistentemente entre os primeiros a emprestar sua experiência aos mais novos. Um veterano com 10 anos de experimentação em vários métodos de shapear com epóxi, membro fundador da equipe de design Salomon S-Core e um formidável mentor para a nova geração de shapers hightech, Eric Awakawa humildemente resume a obra e o paradigma dos artesões modernos: seu pé firme no chão no dia a dia da evolução moderna da prancha de surfe e sua mente aberta para o céu azul do futuro.

Abaixo, vídeo produzido pela Surfing sobre o shaper*: 

 

(*) Áudio em inglês.

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Com a evolução da tecnologia, agora o shaper tem mais tempo para se preocupar com o acabamento final. Foto: Reprodução / Instagram.

Como você responde alguém que diz que o sistema CAD está levando embora a alma da prancha de surfe?

Um cliente entrou em minha loja e viu como as pranchas eram feitas, mas, como estava encomendado cinco pranchas de uma vez, ele disse ‘Da próxima vez que você fizer pranchas para mim eu quero elas todas feitas a mão’. E eu respondi, ‘Você tem certeza?’ Em seguida, o levei até meu escritório, sentei com ele na frente do meu computador e mostrei o que eu conseguia fazer com o sistema CAD, e o quanto ele era preciso. Cinco minutos depois ele disse, ‘Sabe de uma coisa Eric, a partir de agora, eu quero que você faça todas as minhas pranchas desse jeito’.

Isso muda o papel de um shaper?

É apenas uma ferramenta. O que ela faz é possibilitar que a gente seja mais consistente. Nos dá uma base melhor para trabalhar, tudo para que possamos focar mais no acabamento final. Mais do que isso, ela nos ajuda a realmente aplicar o conhecimento que adquirimos sobre as pranchas de surfe, ao contrário de apenas lutar com o bloco em uma sala. Com a máquina, podemos aplicar mais do nosso conhecimento intelectual e nossa experiência em cada prancha. Ao mesmo tempo, podemos arquivar um projeto. Quando você faz uma prancha corretamente, você consegue voltar para ela. Existe um monte de tipo de experimentos que você consegue realizar, baseados no sistema. Ela é mais consistente e te deixa apto a começar com certa base. Nunca voltaria atrás. Todos os atletas estão no sistema, e eles podem vir aqui, sentar e conversar sobre quais mudanças eles querem fazer. Qualquer um dos melhores construtores de pranchas no mundo está usando algum tipo de sistema CAD. Todos eles.

Entrevista publicada originalmente na Surfing Magazine.