Espécie invasora no oceano Atlântico, o peixe-leão tomou a costa norte e está avançando de forma rápida no litoral do Nordeste brasileiro. Segundo especialistas, a espécie não tem um predador por aqui e se tornou uma ameaça que deve chegar a todo o litoral do país.
O peixe-leão foi encontrado pela primeira vez no litoral brasileiro, no Pará e no Amapá, vindo do Caribe, em dezembro de 2020.
Há exato um ano, um registro em águas mais rasas foi feito no Ceará. No último fim de semana, uma nova ocorrência gerou alerta: o peixe foi achado na Ilha de Itamaracá, região metropolitana do Recife. Em 12 meses foram mais de 230 peixes capturados e informados a pesquisadores. É a invasão mais rápida que já vi na história do Brasil. Eu estou impressionado, e isso traz uma situação gravíssima.Marcelo Soares, do Labomar da UFC (Universidade Federal do Ceará) .
Os pesquisadores já sabem que ele está ganhando terreno no país porque o primeiro peixe achado no Ceará tinha 14 cm. “Hoje, já encontramos aqui com 26 cm e já estão achando com 38 cm no litoral norte do Brasil”, relata. Soares cita que o peixe já está em todos os municípios litorâneos do Ceará e Piauí. Desde o início do ano, porém, a espécie foi achada ao sul do Natal, o que cria uma preocupação nacional por conta do sentido da corrente marítima no litoral do país que vai no sentido sul.
“Quando ele ‘dobrou a esquina’ no Rio Grande do Norte ganhou vantagem porque vai a favor da corrente para o sul —aqui na parte ao norte estava contra. Pela modelagem feita ele vai chegar até o Uruguai; ou seja, vai tomar toda a costa brasileira e causar graves impactos”, diz Soares, que coordena uma rede de pesquisadores que estudam o caso nos estados já invadidos.
Estuários invadidos Um dado que chamou a atenção de pesquisadores é que, diferente do Caribe, o peixe tem aparecido com frequência em estuários de rios, o que amplia o problema. “Os estuários são os berçários da vida marinha, e lá ele vai fazer um imenso estrago. E se trata de uma área que é mais turva e que o pescador usa muito. Pensamos que isso pode ocorrer porque os estuários nordestinos têm águas mais salgadas”, afirma Soares.
“Essa característica reforça a preocupação de que, por ser uma espécie invasora, não se sabe como ele vai se comportar no Brasil. Não temos como saber como isso afeta a cadeia pesqueira. Se perguntar a gente que espécie ele come aqui, não sabemos. Temos de estudar, mas para isso precisamos de recursos financeiros”, explica Marcelo Soares.
Veneno nos espinhos
Em regra, o peixe-leão cresce nos recifes mais fundos e depois se espalha pela costa. Ele foi achado primeiramente em recifes com cem metros de profundidade nas costas do Pará e do Amapá.
Entretanto, no Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte ele já apareceu em áreas costeiras a menos de um metro, causando até acidentes com banhistas e pescadores. “O peixe-leão é conhecido por ser um predador agressivo de outros peixes e invertebrados marinhos, além de ser um animal peçonhento, que possui 18 espinhos venenosos”, explica Gislaine Lima, do Projeto Conservação Recifal, de Pernambuco.
“Apesar de comer outros peixes, ele não ataca seres humanos e só pode machucar se for pisado, como ocorre com os ouriços. Essa espécie vem se espalhando pelos mares do planeta nas últimas décadas e é considerada uma das espécies invasoras de maior risco global”, diz Gislaine Lima.
Proximidade de maior área de proteção ambiental
Segundo o professor e pesquisador Cláudio Sampaio, da Ufal (Universidade Federal de Alagoas), o peixe-leão invadiu o Atlântico há cerca de 30 anos e desde lá só se expande no oceano através do Caribe. Uma preocupação a mais é que a espécie deve chegar logo à APA (área de proteção ambiental) Costa dos Corais, entre Alagoas e Pernambuco, que é a maior unidade de conservação federal marinha. Como o peixe-leão se desenvolve em recifes, há um temor que ele se adapte bem no local e cause muitos estragos a uma das principais áreas turísticas do Nordeste.
Para evitar problemas assim, Sampaio defende que sejam feitos investimentos para pesquisar a espécie. “O que falta são recursos para desenvolver programas de educação, monitoramento e capacitação dos pescadores e mergulhadores, agentes de saúde, guias de turismo sobre os riscos do peixe leão em nossas águas”, diz.
Em resposta à reportagem, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) disse que a invasão “é um tema complexo, que deve ser tratado por um conjunto de instituições”.
O órgão disse que está adotando as seguintes medidas:
1 – Proibição da importação desses animais para qualquer finalidade, mesmo que a legislação permita, a princípio, a importação;
2 – Edição da Portaria que proíbe a importação de 5 espécies do gênero Pterois;
3 – Criação, em 2022, de Grupo de Trabalho para formular proposta de ato normativo sobre manejo do peixe-leão; articular órgãos de meio ambiente e a pesquisadores especialistas; reunir informações e documentos técnicos; e discutir plano de ação emergencial para enfrentamento da bioinvasão.
Fonte UOL