Tracks Mag

Tempestade sem fim

Tradicional site de revista australiana, Tracks ressalta domínio e relevância do surfe brasileiro no circuito mundial e afirma que a tempestade ainda está longe de se dissipar.

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Na França, Gabriel Medina conquistou sua primeira vitóra.© ASP Covered Images
Na França, Gabriel Medina conquistou sua primeira vitóra.

 

O artigo A Storm That Shows No Signs Of Passing (tempestade que não dá sinais de passar), publicado no conceituado site australiano Tracks, destaca a ascensão meteórica dos surfistas brasileiros, como Gabriel Medina, e a forma como eles desafiaram o domínio australiano no esporte. Além disso, discute a paixão e a dedicação desses surfistas em busca do sucesso, bem como as mudanças na percepção e na atitude em relação a eles ao longo do tempo.

 

Adriano de Souza , Billabong Pipe Masters 2015, Pipeline, Hawaii.Bruno Lemos / Sony Brasil
Adriano de Souza , Billabong Pipe Masters 2015, Pipeline, Hawaii.

O Tracks também menciona o desafio contínuo das surfistas brasileiras em competições femininas e a possibilidade de uma futura campeã brasileira no surfe feminino. O texto continua a narrativa sobre o surfe e seu desenvolvimento, com foco na influência crescente do Brasil na cena mundial da modalidade.

 

Confira o artigo na íntegra
No rescaldo da vitória do título mundial de Toledo, surge uma nota desagradável para os fãs do surfe na Austrália. A Austrália não ganha um título masculino há um tempo recorde. Desde que Mick Fanning venceu pela última vez em 2013 (há dez anos), a ascensão meteórica do Brazilian Storm (Tempestade Brasileira) tem sido tão completa que apenas John John conseguiu interromper o domínio deles na coroa com vitórias consecutivas em 2016 e 2017.

 

Mick Fanning, Billabong Pipe Masters 2013, Pipeline, Hawaii© WSL / Cestari
Mick Fanning, Billabong Pipe Masters 2013, Pipeline, Hawaii

É difícil imaginar que antes de 2014 o Brasil não tinha um único campeão mundial de surfe. Dessa forma, desde que Medina começou com aquela vitória inaugural, nada menos que sete dos últimos nove títulos foram conquistados por quatro surfistas brasileiros diferentes. O nível de sucesso não é muito diferente da dominação inicial da Austrália no circuito mundial entre 1976 e 1983, quando PT, Rabbit, MR e Tommy Carrol ganharam oito dos nove primeiros títulos disputados.

 

Shaun Tomson e Wayne Bartholomew.

Os quatro títulos consecutivos de MR (1979 – 1981) foram um fator importante na dominação inicial da Austrália no surf profissional. Uma rápida pesquisa das classificações do circuito mundial e dos campeões correspondentes desde que foram oficialmente coroados em 1976 mostra que o Brasil não teve sequer um surfista masculino classificado entre os 16 melhores no final do ano por 15 anos, até que Fabio Gouveia terminou em 13º lugar em 1991.

O isolamento geográfico, fatores socioeconômicos e políticos contribuíram para um início lento na competição, já que predominantemente australianos e depois norte-americanos dominaram. Gouveia foi acompanhado em 1992 por Flavio Padaratz, e o Brasil foi representado entre os 16 melhores em todos os anos subsequentes da década de 1990.  Victor Ribas foi o surfista mais bem colocado dos brasileiros nos anos 90, com um terceiro lugar na classificação geral em 1999. No entanto, pelo menos para o público do surfe, os sul-americanos ainda eram vistos como uma ameaça competitiva bastante tranquila. Mais uma vez, em 2002, nenhum surfista brasileiro estava entre os 16 melhores.

No mesmo ano, 8 dos 10 melhores surfistas eram australianos, com Kelly e Andy (que dominaram com cinco vitórias em competições) sendo as únicas exceções. A dominação da Austrália e dos EUA foi ainda mais reforçada durante a maior parte da década de 2000, à medida que o Brasil atravessava um período de seca e, mais uma vez, ficava sem representação entre os 16 melhores não apenas em 2002, mas também em 2003, 2006 e 2007. Em 2008, Adriano De Souza entrou em cena, carregando quase sozinho as esperanças de seu país, até a chegada do próximo grande talento da América do Sul, Gabriel Medina, quando a tempestade realmente começou a se formar. A geração inaugurada por De Souza logo ficou conhecida em português como Tempestade Brasileira.

Gabby não demorou muito para se destacar, vencendo dois de seus três primeiros campeonatos e conquistando seu primeiro título aos 20 anos em 2014. Isso o transformou em uma mega estrela em um país obcecado pelo surfe, especialmente após a derrota humilhante de sua lendária seleção de futebol por 7 a 1 para a Alemanha na Copa do Mundo realizada no mesmo ano.

No entanto, à medida que a Tempestade começou a ganhar impulso e o número de competidores no circuito aumentou, juntamente com as vitórias nas competições, também pareceu crescer a antipatia em relação aos sul-americanos. Nem todos amam um vencedor, aparentemente, pelo menos parte disso pode ser atribuída à inveja e às diferenças culturais. Os brasileiros ganharam a reputação de serem ótimos em tumultuar as disputas, o que foi personificado por seus principais protagonistas, De Souza e Medina.

 

Não mais satisfeitos em terminar nas posições inferiores, ficou claro que estavam dispostos a fazer qualquer coisa para vencer. Seus fãs também são apoiadores fervorosos, o que muitas vezes aumenta a atmosfera dos eventos, embora em 2015, na praia de Pipe, a maneira muito alta como os ‘zillas’ apoiavam Adriano era uma coisa, mas vaiar Mick Fanning sempre que ele caía parecia desagradável, especialmente considerando que Mick havia perdido seu irmão apenas alguns dias antes. O que não está em questão é a dedicação à vitória.

 

Adriano de Souza , Billabong Pipe Masters 2015, Pipeline Hawaii.© WSL / Kirstin
Adriano de Souza , Billabong Pipe Masters 2015, Pipeline Hawaii.

Na manhã seguinte à vitória do título do “padrinho” da Tempestade, Adriano, eu o vi prestes a remar em Pipe com ondas pequenas e maral. Eu tinha assumido que pensara que ele poderia ter se perdido nas festas por semanas a fio, mas lá estava ele, logo após o nascer do sol, na manhã seguinte, treinando em Pipe em condições médias. Extraordinário. Ou talvez ele apenas quisesse reviver a glória do dia anterior. Para se lembrar de que era real. De qualquer forma, sua paixão era evidente.

A competitividade acirrada e a intensidade na água certamente são sintomáticas de ter que compartilhar um país com mais de 200 milhões de pessoas, cujos recursos são predominantemente escassos. Os estereótipos de gênero mudaram mais lentamente na América Latina, o que contribuiu para a falta de sucesso semelhante no surfe competitivo feminino.

 

Silvana Lima, Rip Curl Women’s Pro Search 2009, Belgas, PortugalWarbrick / Rip Curl
Silvana Lima, Rip Curl Women’s Pro Search 2009, Belgas, Portugal

 

Silvana Lima e Tatiana Weston Webb (que inicialmente representava o Havaí) representaram suas nações, com uma ou ambas figurando entre as 16 melhores surfistas em cada um dos anos desde o início do Dream Tour em 2010. A falta de oportunidades de patrocínio para as mulheres foi apontada como uma razão para a falta de sucesso comparativo com os homens, mas o segundo lugar de Tati há alguns anos indica que a espera pode não ser longa para a primeira campeã brasileira no surfe feminino.

 

 

Certamente não há dúvida de que estamos vivendo uma era dourada para os homens brasileiros. As vitórias consecutivas de Toledo ocorreram em um cenário ideal para sua combinação de surfe elegante nas bordas da prancha e manobras acrobáticas. Muitos de seus compatriotas prosperam no mesmo ambiente de rampas que Trestles oferece, e, portanto, parece que a Tempestade (Storm) não pretende cessar tão cedo. Isso deixa o restante do campo com duas opções: ou pegar um guarda-chuva ou descobrir uma maneira de abrir caminho pelos céus.

 

Open J-Bay 2023, Jeffreys Bay, África do Sul

NR:

O Tracks é uma revista australiano tradicional especializado em surfe, e é considerado uma das publicações mais icônicas e respeitadas na indústria do surfe. Fundado em 1970, o Tracks desempenhou um papel fundamental na promoção e no desenvolvimento do surfe na Austrália e no mundo todo.

A revista foi fundada por Albert Falzon, um surfista e cineasta australiano, e Luke Kennedy, um jornalista. Desde o início, o jornal foi dedicado à cultura do surfe, à cobertura de eventos, à exploração de destinos de surfe e à promoção de talentos locais e internacionais.

Italo Ferreira, campeão mundial e medalha de ouro olímpica. Não é para qualquer um.

Fonte Tracks

Canais citados na matéria

Surf Radio 5513

VHS Surf Vault

WSL

Billabong Womens