Imagine-se sentado no primeiro banco de uma canoa deslizando a parede de uma onda. O poder e a força do oceano empurrando sua embarcação como uma espécie de montanha-russa líquida. E essa emoção não é só sua. Você está compartilhando esse momento com sua equipe, cada um de vocês trabalhando cada músculo de seu corpo para manter a canoa na direção certa. Esse é o surfe de canoa polinésia!
A HISTÓRIA – Durante séculos os polinésios não tinham muitas opções de transporte. Enquanto a maioria dos modos de locomoção, como caminhar, correr e nadar, não possibilitava percorrer longas distâncias, a canoa oferecia uma maneira rápida de transporte de pessoas, suprimentos e comunicação. À medida que os anos passam, no entanto, o que antes era um veículo de sobrevivência tornou-se também uma excelente fonte de diversão. E os habitantes das ilhas tinham um fervoroso desejo de passar o maior tempo possível nas águas quentes e cristalinas da polinésia, e com essa devoção veio o nascimento do surfe de canoa.
Os primeiros relatos dessa prática foram feitos em 1777 pelo capitão James Cook, explorador, navegador e cartógrafo inglês, que foi o primeiro ocidental a viajar pela polinésia e registrar a experiência. Durante sua passagem pelo Taiti, Cook avistou os nativos em momentos de lazer utilizando pranchas de madeira e canoas para deslizar pelas ondas e fez aquele que seria o primeiro registro oficial da história da humanidade sobre a prática do surfe. E, sendo a canoa, o elo entre todas as populações da polinésia, não é de se admirar que essa atividade também fosse praticada em outras ilhas.
Mas nem sempre era permitido aos plebeus surfar dessa forma. No velho Havaí, o surfe de canoa estava reservado para o “Ali’i”, a realeza havaiana. Qualquer bom rei ou chefe deveria saber como surfar uma canoa. Somente após o final do sistema havaiano “kapu”, em 1819, que os plebeus foram autorizados a participar livremente do esporte. E se realeza tinha uma vantagem sobre a prática, os pescadores eram considerados os melhores surfistas, muito em parte por seu admirável preparo físico (como você deve imaginar, lançar-se pelo mar aberto e voltar com uma canoa cheia de pescado era uma atividade que demandava uma tremenda força).
Passaram-se os anos, vieram os europeus e muita coisa mudou. Mas alguns aspectos essenciais da cultura polinésia mantiveram-se vivos.
Da tradição ocidental da organização de grupos e agremiações surgiu, no Havaí, o primeiro clube de canoa e surfe. O “Outrigger Canoe Club” foi fundado em 1908 pelo ex-jornalista de Nova Iorque Alexander Hume Ford, que teve um papel importantíssimo na difusão do esporte. Além de fundar o clube, Ford também foi responsável pela publicação de um artigo intitulado “Riding the Surf in Hawaii”, em 1909, para a revista “Collier’s magazine”, levando ao conhecimento de milhares de norte-americanos o que seria a arte milenar polinésia de se deslizar sobre as ondas. (E aqui cabe um parênteses, o surfe era entendido como o ato de deslizar sobre as ondas independente do veículo utilizado).
O Outrigger Canoe Club começou a funcionar em um lote de terra alugado por USD 10 em Waikiki. Duas cabanas de palha compradas de um zoológico nas proximidades cumpriam o papel de sede e guarderia. Em resposta à criação deste clube, formado basicamente por não nativos, o Hui Nalu (clube das ondas) fundou pouco tempo depois um clube para havaianos nativos na mesma praia. Mas o clima era amistoso. Duke Kahanamoku, por exemplo, um dos co-fundadores do Hui Nalu, era também membro do Outrigger Canoe Club. Estes dois clubes começaram uma competição amigável, que abasteceu ainda mais a paixão na ilha de Oahu pelos esportes aquáticos.
Em 1926 as primeiras mulheres começaram a se aventurar no surfe de canoa, e desde então são presença constante em todos os clubes.
A canoagem polinésia cresceu através de varias vertentes (canoa havaiana, taitiana, neozelandesa) e hoje existem clubes espalhados por todo mundo.
Já o surfe de canoa mais difundido é o praticado em uma OC-4 (canoa havaiana para quatro pessoas) com bastante curva de casco. Quem pratica afirma que é uma das formas mais prazerosas e emocionantes de se deslizar pelas ondas, como afirma o havaiano Matthew Thayer, um dos mais atuantes divulgadores da modalidade:
“Não há nada como sentar em uma canoa e surfar uma onda grande. À medida que a gravidade e a energia tomam conta, o casco corta a face da água e a linha d’água torna-se vertical, você experimenta uma sensação maravilhosa, é quase melhor de sexo para mim”, revela.
Thayer, no entanto, esclarece que o melhor do surfe de canoa não se resume à adrenalina e ao prazer de se deslizar por uma onda. Há um aspecto de verdadeiro trabalho em equipe e camaradagem que torna este esporte aquático tão especial:
“Você combina o contato com o oceano, um passeio na ‘montanha-russa líquida’ criada pela Mãe Natureza e compartilha tudo isso com seus amigos. O resultado disso é o que podemos chamar de dia perfeito!”, finaliza.
Fontes: hawaiianpaddlesports.com / encyclopediaofsurfing.com