Espêice Fia

A saudade continua

Fabio Gouveia, Waimea, North Shore de Oahu, Hawaii

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Em sua última passagem pelo Hawaii, Fábio Gouveia botou a gun na água em Sunset e Waimea. Foto: Nancy Geringer
 

A saudade bate após ter visitado a ilha de Oahu. Passei o ano inteiro com a cabeça na temporada havaiana. Foram muitas sessões maravilhosas em Sunset e umas três caídas muito divertidas em Waimea, que nem quebrou grande como de costume, funcionando apenas a sessão de Pimbols.

Mesmo assim a delícia foi poder surfar com uma prancha grande, pelo menos acima dos 9 pés. E em meus últimos dez dias no North Shore, só surfei com este tipo de prancha. É verdade que algumas vezes não precisava tanto, mas ali era a oportunidade que tinha de testar os foguetes feitos durante o ano, nas ondas de “responsa”.

Waimea é bastante democrático, pois quase sempre surfa-se com mais companheiros na mesma onda. Mas muitas vezes o que pode ser divertido, se torna um problema. Fazer a curva em um “barco” no meio da parede não é tão simples e principalmente quando se tem uns três surfistas atrás de você e mais uns três na frente. Em uma dessas sessions passei maus bocados quando dropei atrasado em uma onda em que haviam mais brasileiros. Gutemberg Goulart vinha de trás do pico, meu conterrâneo Alessandro Costa logo em seguida e eu no meio, me sentindo a salsicha do hot dog do Costco (supermercado americano no estilo do Macro aqui do Brasil), pois Yago Dora com seu “barco” ia na frente e João Maurício Jabour, Luiz Felipe e mais outro completavam a corda de caranguejo.

Nesta onda é quase sempre assim, a turma de trás vinha querendo virar para alcançar a parede e como Yago não conseguiu virar pois um sujeito soltou a prancha na sua frente, me entalei no meio e tive que seguir reto. Não aguentei a pressão e o espumeiro me engoliu. Assim que fui atingido, caí em cima da prancha e ainda deslizei sob ela pra cair totalmente de mau jeito em seguida. Tomei um chacoalho que passei uns três dias com uma nervráugia no braço esquerdo, mas a cena foi engraçada, embora tudo tenha acontecido dentro do espumeiro e ninguém tenha visto.

Neste mesmo dia, Jamie O’Brien e sua turma apareceram com uma enorme prancha inflável. E nem sei como denominar aquela geringonça, pois podia ser uma barco, um “extreme” Sup, não sei ao certo. De fato todos abriam passagem quando a turma começava a remar e o que se viu foi um bando de homens brincando feito crianças abaixo dos 10 anos de idade. Mas este era o propósito da coisa, desafiar os limites na mais pura bagunça. A geringonça tinha um bico bastante inclinado e em uma das maiores do dia eles droparam totalmente atrasados,completando a onda em toda sua extensão. Destreza à parte, acho que a turma só conseguiu fazer aquele drop por causa da curva do bico,que lembrava um sapato de Aladin.

Já em Sunset, estive na companhia de Rico de Sousa e seu caçula, Patric. Era uma cena engraçada, pois apesar de botar a pilha no moleque pra que ele pegasse as ondas, Rico tinha todo o cuidado de pai na hora que as séries de oeste apontavam no horizonte e o filho se encontrava na zona de impacto. Mas o moleque estava maravilhado e falante após cada onda surfada. Rico na água era muito democrático e reconhecido por muitos, tais como os legends Felipe Pomar e Owl Chapman, este que desceu uma onda em minha frente e não segurou a pressão do drop. Fiquei preocupado, pois aquele “senhor” caiu de mau jeito e reclamou de dores nas costelas. Mas nada que um par de remadas na volta ao outside que não o devolvesse a energia, coisa que vem à tona em muitos “senhores” que frequentam aquele pico.

Caras como Rand Rarick, comandante da Triple Crown of Surfing, que em suas horas vagas não deixa de descer seu par de rampas em sua Backyards. Alguns dos destaques que vi nestes freesurfs no pico foi na figura de Tom Carrol. Com prancha normal ou de SUP, o bichinho estava um monstro! Era impressionante como fazia curvas em ondas grandes, recebendo inclusive elogios também de seu companheiro de empreitadas sinistras, Ross Clarke Jones. Tom também apresentou uma “gun” com duplo concave. Inspiração proveniente de embarcações de velocidade, a prancha se mostrava eficiente nessa variável. Sempre por dentro do pico, Ross Clarke pegava várias e constatei depois também a presença de Gary Elkerton. Esse também um puro Mr. Sunset. E não à toa, o apelido “Kong” foi lhe dado. Se olharmos para filmes antigos, podemos ver que suas performances condizem. Adorador do “cool surfing”, Junior Faria passeava com sua monoquilha Bill Barnefild da década de 70, tal como o filho do “Sultão da Velocidade”, Joe Fitzgerald, só que esse com um shape retrô feito recentemente de próprio punho, seguindo os passos do pai Terry Fitzgerald.

Surfar de “barco” em Sunset é um prazer. Sempre admirava muito no passado a galera usando os seus e confortavelmente surfando muitas ondas. Depois que me desprendi das competições principalmente, bastou o mar estar um pouco maior que já parto em nome do conforto, ou seja, tiro a 9 pés da capa. E muitos gostam de surfar com pranchas ainda maiores. É o caso do brasileiro Zé Guilherme. Há anos no North Shore, o alagoano estava sempre no pico com uma 10’6” shapeada pelo também brasileiro Biro, das pranchas BIRO Hawaii. Aliás, Biro é presença marcante no North Shore, depois que divide parte de seu ano em Maresias. Com grande quilometragem em gunzeiras, a prancha que Biro fez pro Guilherme rema em qualquer “besta”. Linhas paralelas e bico largo em sua extremidade, fruto dessa nova era do big surf. Para pegarmos ondas no estilo das havaianas no Brasil são poucas vezes no ano, mas sonhar com os momentos não tem limite. Como de costume (e tem sido assim nos últimos três anos), estico logo uma gunzeira quando retorno pra casa. Continuo sonhando com a próxima oportunidade de estar no Hawaii.

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