O jornal O Globo aqui do Rio, o maior da cidade, noticiou a abertura do circuito mundial na melhor página do caderno de esportes. O surf é importante.
Fizeram do jeito deles, com manchete para o fato de haver em 2017 mais nacionalidades competindo pelo título, nove, incluindo o Hawaii como se fosse um país. Não é. São oito nacionalidades. Em segundo plano, enumeraram novatos e favoritos. Como esperado, nenhuma análise, nenhuma profundidade.
No mundo do surf, 2017 começa sob o signo da mudança.
Primeiramente, o CEO da WSL pulou fora em janeiro. Em fevereiro, a Samsung, principal patrocinadora do circuito não renovou o contrato de patrocínio para a temporada de 2017. Os dois fatos devem ser ligados. São sinais de processo de mudança estrutural. É fato que a Samsung está enrolada na Coreia do Sul. Isso é pouco relevante para a questão.
O problema é a WSL não ter outro patrocinador na manga. Quando isso acontece, fica difícil vender o mesmo projeto. Tem de haver novidades para atrair outra grande marca patrocinadora. Que novidades serão essas? Pergunte ao Kelly.
Claro, ele não vai abrir o bico. Mas até os patos da Lagoa Rodrigo de Freitas sabem que a influência de Slater sobre o bilionário dono da WSL, Dirk Ziff, não é pequena. Sua piscina mágica foi vendida para a WSL. Não há de ser para ficar na gaveta.
Slater já tentou dar uma virada no circuito mundial anos atrás. Pela sua proposta na época, haveria apenas 16 surfistas no circuito, em 8 etapas milionárias transmitidas ao vivo pela ESPN. Com a qualidade de transmissão ao vivo que a WSL alcançou, só se a ESPN pagar bem ou ajudarem a trazer patrocinadores.
Slater é gênio.
O circuito ainda tem surfistas demais? Sim. Algumas etapas são sem graça? Sim. E quando não tem onda boa, é uma chatice? Sim.
Essa primeira prova na Austrália é um exemplo. O pico é maravilhoso, tem ondas espetaculares. Mas, apesar do período de espera, quase sempre a maioria das baterias é disputada em merrecas, com vento. Umas das ideias seria fazer as etapas como no circuito de ondas grandes: deixar os competidores de sobreaviso e chamá-los quando as condições estiverem ótimas. Menos competidores, mais mobilidade, com possibilidade de o evento inteiro acontecer num swell só. Investimento total na transmissão.
São conversas que vão esquentar os bastidores do circuito em 2017. Meu palpite é que o menos afetado será o campeão mundial. Quando ganhou o título ano passado, JJ foi pra casa, pegou a prancha e foi surfar. Este sabe onde está o foco. Por isso é o melhor do mundo nesse início de temporada e favorito ao título.
É importante para JJ se tornar bicampeão antes de Medina, o único surfista tão completo quanto ele hoje em dia. Mas que tem o foco um pouquinho desregulado desde que fez história se tornando o primeiro brasileiro campeão mundial de surf. Ainda não vimos os duelos JJ versus Medina que a lógica prevê. Será que veremos em 2017?
Depende. Em ondas de impacto, Medina atualmente perde para ele mesmo e para JJ, que só perde para si próprio.
Kelly passou da idade. Só espero não queimar a língua. Mick, sei lá como vem. Pode estar no gás. Aquele ataque de tubarão foi uma coisa mística. Estou muito a fim de ver o Owen Wright. Casca-grossa. Quero ver Mineiro e Italo. O primeiro, reconheci num camarote do sambódromo carioca. Diz ele que treinou muito no Hawaii. O segundo terá mais um ano para mostrar que pode entrar na conversa. Acho que pode. E o Toledo. Ah, o Toledo.
O melhor surfista do planeta em onda pequena. Parece que vai continuar sendo. Qual é o problema? Em princípio, nenhum. Cada um faz o que quer.
Toledo é sempre favorito em Snapper Rocks. Mas Snapper não cria ídolos. Foco na superação, sim.
Há campeões mundiais cujos nomes ninguém se lembra.
Os que fizeram a história do surf dominaram a natureza selvagem das ondas mais impressionantes. Quanto mais perto do espírito deles o circuito mundial estiver, mais importante será para nossa cultura underground.