Surf Seco

Aposta que deu certo

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Desde cedo o paulista Adriano Mineirinho é apontado como promessa de título mundial. Foto arquivo: Bruno Lemos / Lemosimages.com.

No final dos anos 1990 parecia fácil para mim e muitos outros observadores, apontar o surfista guarujaense Adriano de Souza como um nome certo para estar entre os tops do mundo.

 

Estar entre os melhores do mundo em qualquer esporte não é tarefa fácil, ainda mais oriundo de um país como o Brasil.

 

A primeira vez que o vi surfando, ele tinha apenas 9 anos de idade e usava uma prancha amarelada, velha e sem bico. O que me chamou a atenção foi a sua agressividade e energia dentro da água.

 

Muito rápido, o Isaac, shaper bastante habilidoso aqui do Guarujá (SP), também enxergou o potencial do garoto e começou a fazer as suas pranchas. Mineirinho, como é conhecido por aqui, vem de uma família humilde do bairro Santo Antonio.

 

De qualquer maneira, para ele e para muitos outros surfistas do Guarujá, a praia e as ondas estão há pouco mais de 1 quilômetro de distância.

 

Nos campeonatos colegiais e nas etapas amadoras, ?Desousa?, como hoje é conhecido mundialmente, dominou todas as categorias. Muitas vezes venceu a categoria Iniciantes e as outras duas acima (Mirin e Júnior).

 

Quando garoto, já com patrocínio da Hang Loose e da Reef e com as pranchas Ricardo Martins, que hoje estão entre as melhores do mundo, além de treinar natação e ter uma remada impressionante com apenas 13 anos de idade, ele tinha a raça e a ousadia necessária para derrubar gigantes.

 

Depois de inúmeras e valiosas conquistas, como o mundial Pro Junior, o WQS, e mais uma meia dúzia ou mais de vitórias em eventos WQS, hoje, no seu terceiro ano na elite, ele parece muito determinado e está na nona posição depois das duas primeiras etapas.

 

Em suas duas baterias contra o norte-americano Kelly Slater, Mineirinho botou pressão no ?hómi? que é oito vezes campeão mundial e que está invicto em 2008.

 

“Desousa” está aproveitando esta oportunidade de competir com a mega-lenda Kelly Slater, mas ainda não o venceu por muito pouco.

 

Mineirinho não se intimida com ninguém, consegue se impor no outside e tem uma inteligência nas baterias que faz a diferença necessária.

 

Outras baterias dele também me chamaram a atenção, como foi a de Bells Beach contra o aussie Adrian Buchan. Ele ditou o ritmo, pegou as ondas certas e botou pressão sob o adversário. O garoto sabe jogar no psicológico de seus oponentes.

 

As suas armas são a sua forte rasgada de frontside e o surf de backside, que também pontua alto. Suas manobras aéreas 360 o colocam na vanguarda da nova geração dos anos 2000.

 

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Mineirinho exibe o adesivo SMF, Surfers Moving Foward, a ideologia do Taiu. Foto: Divulgação.

Talvez essa vitória no Mark Richard Pro no último final de semana foi um dos momentos mais especiais de sua meteórica e brilhante carreira.

 

Não pelos pontos ou pelo peso do campeonato – apenas quatro estrelas -, mas sim pelo significado e pela performance apresentada e pelo elogio pessoal disparado pela lenda MR.

 

A maneira que ele venceu a semifinal contra Shaun Gossman e a final contra seu amigo Jeremy Flores, deixando ambos adversários em combinação, foi absurdamente impressionante, para não dizer humilhante.

 

Jeremy Flores é francês das Ilhas Reunião e é um ano mais novo que Mineirinho. Ele venceu o WQS no ano seguinte à vitória do guarujaense e teve uma estréia excelente no WCT, terminando em oitavo lugar em 2007. Na corrida pelo título do WCT 2008, Jeremy ocupa atualmente a quarta colocação. Ele é outro garoto prodígio.

 

Muito educado, Mr. Flores mostrou respeito ao falar de Mineirinho antes da final e frisou, por ambos serem jovens, que o futuro brilhará para os dois.

 

Nas altas horas da madrugada no Brasil, depois que Jeremy jogou a toalha no final da bateria decisiva, ele dropou a saideira de base trocada.

 

Já Mineirinho pegou a saideira nos 20 segundos finais para dar a manobra do campeonato, um aéreo 360 perfeito, muito alto e de ponta cabeça na finalização, em cima das pedras vulcânicas de Merewheater Beach, casa do quatro vezes campeão mundial Mark Richards.

 

?Desouza?, essa era para você comemorar mesmo, ?claiming? como dizem os gringos. Merecidamente, eu afirmo.

 

O legend Mark Richards cumprimentou os finalistas no pódio e falou diretamente ao jovem campeão, elogiando sua manobra final, impressionado e dizendo que foi um grande aéreo.

 

Gostaria de dizer que essas competições e baterias decisivas de brasileiros são momentos em que a adrenalina sobe e fico com ?borboletas? na barriga, como na minha época de competidor.

 

O Brasil arrebentou neste final de semana. Na mesa hora do pódio, Chorão e Gabriel Pensador quebravam no programa Altas Horas, com raps improvisados e com as bandas invertidas.

 

Eu achava que no Brasil os rappers não tinham esse dom da improvisação igual aos gringos. Fiquei surpreso e mudou meu conceito. Adoro o Charlie Brown Jr. e o Gabriel Pensador, de quem sou amigo. Mas esse poder me tirou do sério.

 

Horas depois, nas areias do deserto do Bahrein, Felipe Massa saiu da lama e venceu pela primeira vez nesta temporada da Formula 1.

 

Quando as vibrações são positivas e o universo conspira a favor, as muitas coisas boas podem acontecer para nós brasileiros.

 

?Desousa?, obrigado por mais uma alegria.