Espêice Fia

Bastidores do Rio

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Pelo segundo ano consecutivo, participei da transmissão em português da etapa Brasil da World Surf League. O que estava pra ser divertido, ocasionou em um certo stress no início, pois, por erro de comunicação, a direção da prova me colocou como participante da transmissão em inglês. Mas, como posso? “Meu inglês não é fluente, não acompanho as etapas ‘in loco'”, eu disse.

 

Mas, conversa vai, conversa vem, o diretor das transmissões Jason Rem quis de todo jeito me colocar pra fazer um “heat recap” juntamente com Strider Wasilewski depois de algumas baterias no primeiro dia, em Grumari. Abro um parêntese: a mega estrutura montada no Postinho (Barra da Tijuca) havia sido parcialmente comprometida por um grande swell antes do campeonato. Logo o palco alternativo, que seria em Grumari, passou a receber a nova estrutura enquanto a do Postinho era arrumada. Fecha parênteses.

Holofotes ligados (pela turma do Eduardo Crivella, shaper das antigas e que agora trabalha com iluminação de cinema), e lá estávamos eu, Strider e duas canequinhas da WSL. Nervoso pouco, eu estava era muito! O headphone e o ponto no ouvido não permitiam escutar minha própria voz direito. Resultado: o “caba”, sem falar inglês fluente e nem ter o embalo de comentar baterias na língua estrangeira, só pôde ser um desastre. A confirmação foi logo um recado do meu filho Ian: “Pai, tu tava parecendo a gaga do Pânico!” (risos).

 

Com a necessidade de ter alguém do País para incrementar a web em Inglês com informações locais, a pressão ainda existia, mas acabei mesmo foi ficando na web em português juntamente com Klaus Kaiser, André Gioranelli e Pedro Muller, que, aliás, estão formando um ótimo time, todos redondinhos e encaixadinhos nos comentários.

Sim, mas a turma ainda me colocou pra fazer algumas entrevistas com alguns brasileiros que iam saindo das baterias. O primeiro foi Alejo Muniz. Bom, também não tenho jeito pra ser entrevistador. Nervosismo bateu de novo, e mesmo sendo Alejo (de casa), ao término da entrevista deixei o microfone com ele e saí batido. Poxa, quem era o entrevistado? O microfone teria que ter ficado comigo, pô! (Risos). Bom, mas essa foi mais uma “primeira e última”.

Então desistiram e me deixaram quieto com o trio oficial na web portuguesa. Ano passado, participei da transmissão casada entre a WSL e a ESPN Brasil. A turma era Tiago Brant, Renan Rocha e também Pedro Muller. Também foi ótimo, muitas mensagens de internautas entravam e rolava uma interatividade. Mas foi de 8 a 80, pois, com a profissionalização da entidade, este ano as mensagens não eram lidas, ou melhor, não mais existiam. Acho que pelo menos um pouco poderia ser legal, mas respeito as novas regras e o desenrolar foi legal.

 

Nossa cabine em Grumari era maior, já no Postinho tava parecendo mais uma lata de sardinha. Pra ficarmos os quatro comentaristas e um (às vezes dois) operador de som era até cômico. Trabalhávamos duas baterias e folgávamos duas. Mas, quando estava em horário de descanso, acabava ficando o maior tempo na cabine para que não perdesse a ação, pois ao assumir a cadeira novamente precisava comentar também algumas nuances das duas baterias anteriores.

A base de todos era o Postinho, logo no começo da Barra da Tijuca, e como precisávamos estar cedo em Grumari, os transportes partiam do Royalty Hotel às quatro horas da manhã. O primeiro era para os técnicos de som e pessoal da transmissão em geral. Já das quatro e meia era o restante da turma. Pense num rip matinal?!

Dois dias de evento rolando na paradisíaca Grumari. Não cheguei a ver o trânsito, pois passava o dia inteiro na estrutura. Mas disseram que tava enrolado. Muitos atletas também optavam em passar o dia inteiro acampado, o que fez os dias de disputas ali um evento interessante e diferente. No terceiro dia consecutivo, um stop. Aproveitei pra dar um surfe matinal com a galera. Ali deu pra ver a dificuldade de conciliar os backwashes, pois na transmissão falávamos muito dele. Realmente muitos surfistas acabavam em alguns momentos embicando ou entrando de borda, mas a parada era realmente difícil.

Naqueles treinos, destaque para um tubo de Wiggolly Dantas e os aéreos de Medina, como também umas rasgadas de Marquinho Fernandez, que venceu a triagem e varou o primeiro round direto para o terceiro. Nas baterias, show de Italo. Bicho forte e seguro nas manobras! O chamava de “pé de cola”. E posteriormente o Deivid Silva “num” derruba o líder do ranking?! O magrão Wilko viu o poder de mais este nosso aspirante ao CT nos minutos finais com dois alley oops em ondas distintas.

No surfe feminino, Silvana da adeus à prova surfando bem. Começou caindo bastante em sua bateria, mas depois acertou o pé e liderou até o fim, quando Carissa Moore virou o resultado. Pelo menos ainda está no páreo. Precisa trabalhar ainda mais pra voltar e seguir a evolução, pois além de manobras de vanguarda, algumas mulheres estão surfando muito forte!

Evento rolando no Postinho e praia lotada, já era de se esperar. Medina faz 10! O foco, que até então estava em Italo, passa pra ele. Com isso, Filipinho podia vir por fora, pois muito se especulava sobre sua volta pós-contusão. Vi seus treinos físicos com o pessoal da Personal Boards na academia do hotel e ele parecia bem – ágil, forte e flexível.

O incrível  atual campeão mundial Adriano de Souza não era o centro das atenções, mas tá aí um cara que começava a crescer no evento! Talvez justamente esse crédito ofuscado seja seu atual combustível. Sinto uma situação parecida com Matt Wilkinson. Tudo bem, estávamos no Brasil, mas o nome do líder do ranking era muito pouco mencionado em relação às estrelas.

Estrelas essas que fazia-se de John John o destaque, com direito a fã clube instalado na calçada do seu apê alugado no Postinho. Era engraçado ver algumas meninas e meninos novos com suas cangas estiradas no passeio quando volta e meia Jonh aparecia na sacada dando aquele tchauzinho de super star.

O mar diminuiu e tivemos uma pausa na competição. Mesmo assim, uma marola se fazia presente. Água clara, “parecendo o Caribe”, alguns diziam. E era verdade. Por sorte a corrente predominante foi mais de sul, logo mantinha a poluição pro lado oposto, salvo em alguns momentos de maré vazante, quando a mancha chegava perto do palanque.

Nas condições pequenas, parecia não ter ninguém andando mais que Italo, e começava-se ali as apostas pra quem levaria a prova. O cara tava impossível, muito rápido e completando muitos aéreos.

E com mar baixo, aí “dále” turismo na Cidade Maravilhosa. O simpático e destaque Leo Fioravanti foi bater na cabeça do Cristo Redentor. Quem mais foi ali? Que eu me lembre, só Didi Mocó! (risos). Trabalhei em paralelo ao evento com a cerveja Corona, que fez muitas ativações pra divulgar sua campanha #coronasunsets e #thisislinving. Os caras tinham um catamarã de 48 pés que passava o dia decorando o line up do evento e aos fins de tarde se encontrava na baía de Guanabara. Fui em uma saída destas com vários “influencers” (como eram chamados os contratados nas ativações Corona), entre eles blogueiros, beldades, convidados e alguns atletas como Jeremy Flores e Juliam Wilson.

O velejo foi regado a muito sushi e Corona, com direito a um excelente DJ que embalava as pick ups com saxofone, gaita e flauta. O cara era top. Como o dia seguinte seria de flat, nego aproveitou. Foi um fim de tarde e tanto! Mais um dia off e o swell, que não havia chegado naquela manhã de quarta, pintava no meio do dia. Ali finalizava-se o feminino. Altas baterias e um mar super difícil, vitória de uma guerreira Tyler Wright em cima de Sally Fitzgibbons. Ô bichinha “monstra”! Surfa muito! Pé de cola!

Na quinta-feira, o swell ganhou um pouco mais de força e a dificuldade continuava. Até então, Italo, que era cotado para ser o vencedor, pareceu nervoso, não estava em seu dia. Já Medina, Mineiro e John Jonh só cresciam. O funil aperta, Medina com mais um 10 em um full “rotêichion”, fica em terceiro.

Aliás, na bateria de Toledo, o bicho quis extrapolar depois de sair de um belo tubo. Tentou um full rotêichion e caiu. Se tivesse apenas dado um floater na “junça”, teria passado. Mas ele é show man; se completa, faria talvez um 10 também. Falar depois da bateria é fácil e Medina fez o contrário de Filipe em sua segunda nota na derrota para um competitivo Freestone.

Aliviou em uma junção, mas, se tivesse extrapolado, teria passado. Mais uma vez, falar é fácil, mas na bateria são outros quinhentos. De qualquer forma foi um ótimo resultado, quebrando a sequência de maus aproveitamentos.

Da mesma forma, Capitão “Mineiro” Nascimento se solidificou durante a prova e fez também seu melhor resultado. Seguro de si, esse bicho ainda vai dar muito o que falar, quer falem menos dele ou não.

E John Jonh reinou. Também veio na evolução e diante do mar parecido com Ehukai Beach Park, sentiu-se em casa. Ô “mizeravi” pra ter faro de tubo! Com eles e alguns aéreos, assim foi coroado.

O mar da quinta estava torto. A sexta e sábado finais do prazo permitido para a realização do evento possivelmente estariam melhores. Por que será que a turma adiantou? Tinha swellzão pra Fiji? Bom, não sei e nem vi o mar na sexta. Só sei que não vi competidores reclamando e pra mim foi até melhor, pois voltei naquela madrugada pra casa a fim de adiantar os trabalhos pra embarcar rumo à Indonésia. Fui! Até a próxima!
 

Fábio Gouveia
Campeão brasileiro e mundial de surfe amador, duas vezes campeão brasileiro de surfe profissional e campeão do WQS em 1998. É reconhecido como um ícone do esporte no Brasil e no Mundo. Também trabalha como shaper.