O inverno traz, além do frio, grandes ondulações à costa brasileira. Para muitos, uma oportunidade de surfar ondas grandes. Respeitar o mar e saber quais são os seus limites farão toda a diferença entre uma experiência inesquecível ou traumática. Por isso, quem deseja surfar um swell de inverno de stand up deve ficar atento a uma série de cuidados que precisam ser tomados para que tudo corra bem.
Primeiramente, o preparo físico tem que estar em dia. Você está preparado para ficar alguns segundos a mais embaixo d’água durante um caldo ou nadar até a praia caso o seu leash arrebente? Se ficar na dúvida, é melhor preparar-se mais antes de entrar no mar! Mas, se as remadas e o condicionamento estão em dia e a vontade de surfar em condições mais pesadas está falando mais alto, ok.
Prancha e equipamentos testados, chegou a hora do surf! E os desafios para quem está de SUP começam antes mesmo de se chegar às ondas. Afinal, como sabemos, a maioria das praias brasileiras não tem canal, por isso, atravessar a arrebentação é uma tarefa árdua e, dependendo das condições, intransponível. Ao contrário da pranchinha, não é possível furar as ondas nem fazer um “joelhinho”, que é como os surfistas de pranchinha denominam a passagem por baixo da espuma. Você tem que encarar a onda de frente e, na maioria das vezes, mergulhar e abandonar a prancha (lembra-se da observação sobre a qualidade dos equipamentos, como o leash?).
O gaúcho Fabiano Tissot, especialista big surf e um dos poucos SUP surfistas que já desafiaram as temidas ondas da laje da Jaguaruna, em Santa Catarina, recomenda paciência e atenção para escolher a hora certa de chegar ao outside: “Se não houver canal, o melhor a fazer é aguardar em uma área onde a espuma não seja tão forte (normalmente próximo à praia), batendo de frente com as ondas, até o mar acalmar. Quando o horizonte abrir, é hora de se concentrar na missão e remar com vontade”.
Alexandre Takeo, conhecido por seu apetite para ondas grandes e tubulares, concorda: “É na raça! Quando entra a série e as ondas fecham na sua frente, não tem o que fazer. Tem que pular do SUP e mergulhar, mas logo subo para a superfície pra ver se a série já acabou. Subo na prancha, muitas vezes deitado, em cima do remo, e saio remando com os braços com toda a força para não perder tempo”, conta o Magrinho, como também é conhecido.
Vencida a etapa da arrebentação é preciso escolher o lugar certo onde se posicionar no line-up. O stand up garante ao praticante uma visão mais ampla do que está acontecendo e isso é de grande valia na hora em que as ondas se aproximam. O remo e o volume da prancha possibilitam uma abordagem antecipada, mais segura, mas isso não dá ao remador o direito de entrar em todas as ondas sem se preocupar com o resto do crowd. As mesmas regras de boa convivência valem para qualquer tamanho de onda, e, no caso das grandes, é muito mais importante ficar atento aos outros surfistas e evitar rabeadas e colisões.
Fabiano Tissot recomenda uma abordagem bem conservadora no início e, aos poucos, na medida em que for se familiarizando com as condições do mar, buscar um posicionamento mais ousado: “O ideal é esperar lá fora e ao lado do pico. Quando avistar a série, entrar estrategicamente na zona de impacto junto com ela. Esperar passar a primeira e ir se posicionando com calma para pegar as de trás, sempre atento se não há ninguém remando com a preferência da onda. Normalmente, com essa abordagem, você irá dropar mais ao lado, em uma zona mais confortável. E o fato de esperar a série fora da zona de impacto ajuda a não levar na cabeça antes mesmo de surfar a onda. Aos poucos, conforme você for pegando confiança e identificando melhor o comportamento do mar, pode ir se posicionando em uma zona mais quente”, ensina.
Mas, mesmo estando em uma zona mais segura, é necessário ficar atento o tempo todo para não ser pego de surpresa, como conta Alexandre Takeo, que também faz parte do seleto grupo de SUP surfistas que já desafiou a laje da Jaguá: “Uma vez na laje, estava uma correnteza absurda e eu, sem perceber, em questão de segundos, me desloquei um pouco para o inside. Quando olhei para o horizonte vi a série vindo e percebi que estava bem na zona de impacto. A adrenalina bateu forte e eu quase caí da prancha. Então, não pensei duas vezes, deitei e remei com toda a força e passei a onda no limite já pensando na que estava vindo atrás, que graças a Deus não veio!”, relembra afirmando ter sido essa uma das situações mais tensas que já passou na água.
Mas nem sempre essas histórias têm um “final feliz”. Tissot já rompeu todos os metatarsos do pé esquerdo surfando de SUP em um mar enorme no Tahiti. As ondas grandes e tubulares, inclusive, são bem mais difíceis de ser surfadas por um SUP, como explica o gaúcho: “Normalmente a prancha é maior e mais larga e, caso a onda seja tubular, isso pode ser uma desvantagem, principalmente porque o arrasto embaixo d’água é maior”.
Ele também fala sobre outras dificuldades enfrentadas de uma maneira geral: “O vento prejudica mais o SUP que a gun. Subir do caldo com o remo na mão é complicado, você não quer soltá-lo com medo de perdê-lo e estragar a sessão, mas ficar com ele embaixo d’água, sem ar, atrapalha na subida; essa é uma variável complicada de negociar. E, por fim, caso o mar esteja crowd, você pode não ser muito bem recebido. Por isso, é sempre bom saber chegar e estar confiante na missão”.
O gaúcho, no entanto, garante que apesar dos perrengues surfar ondas grandes de SUP é uma experiência fantástica. Takeo concorda: “Você tem uma visão de camarote do mar e das ondas por um ângulo que poucos terão a possibilidade de vislumbrar. Além disso, o stand up facilita e muito a escolha da onda certa e isso pode fazer toda a diferença em situações mais extremas. É uma delícia dropar um rampão de stand up paddle. Você vem lá de trás e vai ganhando projeção junto com a onda, sentindo a energia ganhar força. Uma sensação difícil até de descrever. Só sei que é muito bom”, revela.
Por fim os especialistas recomendam não marcar bobeira com a segurança. “Usar um leash em perfeitas condições, não muito comprido, por volta dos 12 pés, também ajuda, pois se você tomar uma onda na cabeça fica mais rápido e ágil de puxar a prancha de volta. Além disso, disponha de um colete se as condições estiverem mais extremas, ou se você não se sentir confortável. Mas é claro que o colete não faz milagre se você não estiver com a natação em dia”, aconselha Tissot. Takeo concorda e faz uma última observação: “O (colete) flutuador joga você para a superfície que nem uma rolha e protege também de impactos. Isso te dá mais confiança se você estiver sobre uma bancada de pedra ou de coral”.
Mas é bom deixar claro, como lembram os big riders, o surf de ondas grandes é um aprendizado que deve ser adquirido passo a passo. Por isso, sem preparo físico e experiência, nenhum equipamento garantirá a sua segurança se você não estiver pronto para encarar ondas de consequência. Saiba quais são os seus limites, trabalhe para superá-los e, quando estiver pronto, divirta-se com segurança.
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