Bioenergética aplicada, a base de um treinamento

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Sempre que falamos em atividade física, o conceito de energia nos vem à cabeça, pois é sabido que a atividade física consome energia.

A Bioenergética está submetida às leis da Termodinâmica, como a primeira lei, que nos diz que a energia não pode ser criada nem destruída, apenas transformada. E é isso que os seres vivos fazem: transformam a energia química potencial contida nas moléculas alimentares (no rango), em energia mecânica destinada a realização de todos os tipos de trabalho biológico (pensar, transar, correr, surfar, enfim… viver…).

Dentro do universo da Educação Física, e conseqüentemente do surfe, o estudo e a compreensão dos conceitos da Bioenergética são de fundamental importância para que o surfista alcance o seu melhor rendimento técnico, pois quando o preparo está ?em cima?, a técnica apurada tem mais chances de se apresentar.

Para produzir trabalho biológico, o surfista utiliza-se da energia contida nos alimentos, com o intuito de sintetizar o ATP, uma molécula formada por adenina, ribose e fosfatos e que é considerada a moeda corrente do organismo e o CP, conhecido como fosfato de creatina. É através da desintegração desta molécula de ATP, mais precisamente, da perda de um grupo fosfato desta molécula, que a energia é direcionada para seus fins. Ou seja, todas as necessidades energéticas das células são satisfeitas através da energia contida nas ligações químicas dessas moléculas, e todo ATP é sintetizado através da energia química liberada na desintegração dos substratos, tais como a glicose (açúcar, massas, pães, etc), os lipídios (gorduras) e as proteínas (carnes, leites e alguns cereais).

O primeiro ciclo energético ? ciclo ATP-CP

Os seres vivos têm uma quantidade muito pequena de ATP-CP estocada em suas células. A quantidade de ATP é suficiente para fornecer energia imediata para somente 6 a 10 segundos de um exercício de alta intensidade (uma remada muito forte para entrar em uma onda cheia, por exemplo).

Aplicabilidade: para aumentar a quantidade de ATP-CP nos membros superiores, por exemplo, o surfista deve realizar pequenos ?tiros? de altíssima intensidade e muito curta duração. 10 tiros de 25 metros remando com sua prancha em uma piscina, descansando 1 minuto entre cada tiro. Esse tempo será suficiente para que o organismo restabeleça suas reservas de ATP-CP. Com o passar do tempo o organismo se adaptará a esse estresse imposto pelo treinamento e aumentará suas reservas naturais deste importante substrato, e o surfista desenvolverá naturalmente uma maior potência em sua remada.

O segundo ciclo ? anaeróbio lático

Uma vez terminado os estoques de ATP-CP das células, a glicose passa a ser quebrada visando realizar a ressíntese do ATP através da molécula de ADP e do grupo fosfato anteriormente retirado do ATP. Este é o segundo ciclo energético, conhecido pelo nome de glicólise anaeróbia, ou seja, a quebra da glicose sem a presença do oxigênio.

Tanto o primeiro ciclo, o ciclo do ATP-CP, quanto o segundo ciclo, o ciclo da glicólise anaeróbia, são sempre recrutados quando a célula está carente de oxigênio, ou seja, quando a célula trabalha em anaerobiose. Apesar da pequena produção de energia, esses ciclos possibilitam que os seres vivos realizem trabalho biológico mesmo estando em déficit de oxigênio (falta de oxigênio). Isso ocorre sempre que iniciamos um exercício intenso, onde a necessidade de oxigênio da célula não pode ser plenamente suprida, pois não existe tempo hábil para aumentarmos o nosso ritmo respiratório e com ele o consumo do oxigênio. Um bom exemplo é o ?rema-rema? desesperado em uma bateria de competição, onde muitas vezes nos sentimos ?sem gás?.

Essa ?falta de gás? resulta na produção de um ácido conhecido como ácido lático. Sempre que a glicose se quebrar sem a presença de uma boa quantidade de oxigênio existirá a formação deste co-produto do metabolismo energético. Se um surfista remar muito forte no decorrer de uma bateria, irá produzir uma quantidade grande de ácido lático que irá prejudicar as contrações musculares subseqüentes, atrapalhando sua performance na próxima onda.

Aplicabilidade: no plano de treinamento do surfista deve existir dois enfoques principais a-) consumir mais oxigênio, o que retardará o aparecimento do ácido lático e pode ser conseguido com um bom treinamento aeróbio. b-) tolerar a presença do ácido lático, realizando séries de remadas intensas separadas por longos períodos de descanso. Ex: 6 tiros de 400 metros de remada, por cinco minutos de descanso. Com o passar do tempo o surfista estará apto a tolerar a presença do ácido lático em seus músculos, pois suas células terão produzido mais bicarbonato de sódio, uma substância que impede a ação perturbadora deste ácido na musculatura.

O terceiro ciclo ? o ciclo aeróbio

Exercícios de baixa intensidade geralmente podem ser feitos sem déficit de oxigênio, pois a necessidade energética não é tão grande e o organismo pode suprir as células com oxigênio suficiente. Entretanto, podemos ter condicionamentos aeróbios muito melhores se treinarmos para isso. Atletas de endurance, tais quais os maratonistas de elite, correm uma maratona em velocidades que a maioria de nós, surfistas, não manteria nem mesmo por um quarteirão.
Aplicabilidade: para melhorar a aptidão aeróbia podemos correr, pedalar, patinar, etc. Porém, nada melhor do que desenvolver a aptidão aeróbia dentro da especificidade de nosso esporte, ou seja… remando! Uma série de 4 X 1000 metros, remando em uma intensidade onde a freqüência cardíaca se estabilize entre 140 a 160 bpm já é um bom começo.

É interessante notar que todos os três ciclos atuam em conjunto, entretanto, em determinados momentos o percentual de fornecimento de energia advindo de um dos três ciclos pode ser de quase 100%. No repouso os seres vivos se utilizam quase que exclusivamente do ciclo aeróbio. Já quando iniciamos um esporte ou temos a necessidade de vencer uma carga qualquer em nosso cotidiano, como levantar uma geladeira ou carregar uma caixa com compras, os outros ciclos são requisitados com maior intensidade, até que o organismo se adapte às novas necessidades metabólicas e aumente o seu consumo de oxigênio visando fornecer quase toda a energia necessária novamente através do ciclo aeróbio. Logo, no surfe existirão momentos em que estaremos em déficit de oxigênio e momentos em que estaremos em equilíbrio metabólico e o oxigênio não estará escasso.

Com um conhecimento dos mecanismos envolvidos na dinâmica da produção de energia pelo ser humano, o profissional da área da Educação Física e os atletas em geral, dentre eles os próprios surfistas, poderão atuar com muito mais propriedade tanto na preparação de suas rotinas de treino quanto na realização de trabalhos visando a melhoria da qualidade de vida e da saúde, pois saberão como sobrecarregar um determinado ciclo energético para obter as adaptações orgânicas desejadas.

Todo o surfista, freesurfer ou competidor, que deseja melhorar a sua performance na água, deveria antes de mais nada procurar auxílio de um profissional. A necessidade de um personal trainer atuando junto ao surfista vem se tornando imprescindível nos dias de hoje, principalmente para aqueles surfistas que estão engajados em atividades competitivas.

O personal trainer é aquele profissional que analisa as avaliações físicas de seus atletas e, com base nos resultados apresentados, elabora programas para desenvolvimento da capacidade aeróbia, capacidade anaeróbia, força explosiva, força de resistência, flexibilidade, tempo de apnéia (suspensão da respiração), etc. Além disso, o personal trainer elabora os ciclos de treinamento anual, com ênfase nos eventos mais importantes do calendário anual. Entretanto, para elaboração de um programa sério de treinamento físico, é necessário que o surfista seja submetido a avaliações físicas laboratoriais. Essas avaliações são feitas com o intuito de estabelecer parâmetros que servirão de base para a elaboração das sobrecargas subseqüentes que serão impostas ao surfista no programa de treinamento, além de servirem como referência para futuras comparações e avaliações das melhoras obtidas durante o processo de treino.

Em São Paulo, o Centro de Estudos em Fisiologia do Exercício – CEFE – da Universidade Federal de São Paulo, realiza diversas avaliações físicas, para os mais diversos esportistas, inclusive surfistas. O projeto Mar Azul do Dr. Marcelo Baboglhuian e do Prof. Freddy Jacob também vem realizando um excelente trabalho.

Abaixo, selecionei um relatório de uma avaliação da capacidade cardiorrespiratória para servir de exemplo.
É importante ressaltar que esses dados devem ser sempre interpretados por um personal trainer, que através deles montará um programa adequado e individualizado de treinamento.

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CENTRO de ESTUDOS de FISIOLOGIA do EXERCÍCIO
RELATÓRIO DE AVALIAÇÃO ERGOESPIROMÉTRICA DA APTIDÃO FÍSICA

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1. Identificação

Nome: Duke Kahanamoku
Data: 19 / 08 /20
Idade: 30 anos
Sexo: Masculino
Peso: 83.0 kg
Altura: 180 cm

2. Características do teste

Solicitado por:
Sociedade Polinésia de Navegação e Esportes Aquáticos.

Objetivos:
Avaliação da aptidão física e prescrição de exercícios.

Protocolo:
(2 min. de aquecimento e incremento de 1 km a cada 2 minutos, até a exaustão).

Ergômetro:
Trackmaster Research 48 (esteira rolante)

Trocas gasosas:
medida direta a cada 20 seg. – sistema Vista CX – Vacumed.

3. Resultados

3.1. Teste interrompido por:
Fadiga de membros inferiores com FC = 181 bpm (97% da FC máxima prevista) na velocidade de 16 km/h

3.2. Consumo máximo de oxigênio (VO2max)
47.2 ml.kg-1.min-1
3.92 l.min-1

3.3. Limiar Anaeróbio – LV1 (método ventilatório)
VO2: 40. 39 ml.kg-1.min-1 (85 % do VO2max )
Frequência cardíaca: 163 batimentos por minuto.
Velocidade: 13 km/h

3.4. Limiar Anaeróbio – LV2 (método ventilatório)
VO2: 45.88 ml.kg-1.min-1 (97 % do VO2max)
Frequência cardíaca: 171 batimentos por minuto.
Velocidade: 15 km/h

3.5. Resposta ventilatória ao exercício
VEmax: 115.61 l/min (70% da VVM1 / Valor Normal = 72 ± 15 %VVM1)
Frequência respiratória máxima: 33 r.p.m. (Valor Normal = 41,6 ± 9,61)
Volume corrente máximo (VCmax): 3.76 l.
VCmax/CVF x 100 : 58 % (Valor Normal = 55 ± 8,7 %1)
Teste sugestivo de limitação ventilatória da performance:
( )SIM (x)NÃO

4. Parecer

4.1. Teste realizado em condições técnicas satisfatórias.

4.2. Aptidão cardiorrespiratória dentro dos valores previstos para indivíduos normais de mesmo sexo e idade*
*Wasserman K et al.: Normal Values. In: Principles of Exercise Testing and Interpretation, 1994: pg.113.

4.3. Faixa de frequência cardíaca recomendada para treinamento aeróbio: 163 a 170 bpm.
OBS: A transferência dos resultados do laboratório para as condições de campo pode requerer ajustes da frequência cardíaca de treinamento. O nosso laboratório se coloca à disposição para orientar este procedimento.

4.4. Teste não sugestivo de limitação ventilatória da performance*.
*Wasserman K et al.: Normal Values. In: Principles of Exercise Testing and Interpretation, 1994: pg.124.

São Paulo, 19 de Agosto de 1920

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Prof. Ms. Marcello Árias
Prof. Dr. Antônio Carlos da Silva
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Esta e inúmeras outras avaliações podem ser feitas pelos surfistas que estão interessados em obter uma melhor condição física.

Onde fazer as avaliações:

Centro de Estudos em Fisiologia do Exercício – Rua Botucatú, n° 862, 5° andar, Edifício de Ciências Biomédicas – vila Clementino – São Paulo – Fone/576-4513

Abaixo, três dos melhores treinadores pessoais do Brasil

Maria Angelica Felizardo (Magê) – Profa. de Educação Física/ Pós-graduada em Treinamento Físico/ Personal Trainer – Fones/ 0**11 – 298-1121 ou 9903-6535 – São Paulo

Tácito Pessoa – Prof. de Educação Física/ Pós-graduado em Treinamento Físico/ Personal Trainer – Fones/ 0**13 – 233-6530 ou 971-3821 – Santos

Dilmar Pinto Guedes – Prof. de Educação Física/ Pós-graduado em Treinamento Físico/ Personal Trainer – Fones/ 0**13 – 284-7465 ou 233-5175 ? Santos