Carlos Sanfelice

Cinegrafista aventureiro

Carlos Sanfelice, Bali, Indonésia

Carlos Sanfelice é cinegrafista e produtor de cinema. Foto: Bruno Lemos / Lemosimages.com.

O carioca Carlos Sanfelice, 43, é cinegrafista e produtor de cinema.


Antes de consagrar-se como produtor dos filmes Surf Adventures, Sanfelice pintou pranchas, foi shaper e trabalhou como chefe de equipe da marca Redley, quando contratou nomes como Pedro Muller, Guilherme Gross, Carlos Burle e Eraldo Gueiros.


Em entrevista concedida ao amigo Bruno Lemos, Carlos Sanfelice fala sobre sua trajetória no surf, o trabalho de cinegrafista e produtor, novos projetos e as trips de surf que já fez ao longo da carreira.

 

Como você começou a se envolver com o surf?

Greg Long leva vaca cabulosa em Jaws, Hawaii. Foto: Carlos Sanfelice.

O surf exerceu uma força muito grande na minha adolescência e nessa fase queria só estudar, passar de ano e depois curtir as férias surfando o dia inteiro. Nessa época da minha vida, descobri as primeiras surf trips para a praia da Guarda, e para minha sorte, nessa mesma época minha mãe se mudou de Copacabana para o Recreio dos Bandeirantes e se casou novamente, com um surfista das antigas do Recreio, Luiz Eugênio.

 

 

Ali comecei a ter envolvimento com as fábricas de prancha da área e fui convidado a pintar umas pranchas na oficina de Daniel Feingold, que era amigo da minha mãe. Esse foi meu primeiro emprego. Parecia um sonho, surfava umas duas, três vezes por dia na Prainha, Macumba ou Recreio, e pintava as pranchas entre uma caída e outra, numa época em que o Recreio era a maior paz. Esse foi meu primeiro envolvimento profissional com o surf .

Por que você optou por essa área?

Foi totalmente na vontade de continuar podendo surfar todos os dias, ganhar meu sustento e não entrar para uma grande empresa e ficar longe do mar. Essas opções de vida que todos nós temos que fazer entre realizar um sonho e seguir uma carreira tradicional. Não foi fácil fazer essa escolha, pois de um lado vieram as cobranças naturais da família e da sociedade, e do outro, minhas próprias dúvidas em relação ao futuro, já que as fábricas de pranchas naquela época não tinham tanta produção, pois o surf era relativamente pequeno como negócio.

Mas o caminho não tinha mais volta e comecei a fazer minhas próprias pranchas, chamadas Breakaway, com Laureano e Zé Augusto, dois super brothers dessa época mágica da praia da Macumba. A oficina era na areia da praia, show! Só saía foguete, uma prancha melhor que a outra. Fiz muitas pranchas para Dadá Figueiredo, Burle, Crivella e a maior galera da Barra e Recreio, inclusive para o nosso colunista Bruno Lemos, quando ele era competidor de destaque no Rio.

Depois de alguns anos fazendo pranchas, fui ficando meio incomodado com o cheiro da resina, poeira, barulho de lixadeira e vendi minha fábrica e fui fazer uma trip com Burle para a Europa e Indonésia. Foi quando chegamos em Desert Point, uma trip que mudou toda minha concepção de surf. Ali conversamos muito sobre o free surf e a competição, vantagens que um surfista como o Burle tinha de surfar bem em condições épicas como em Desert e o circuito mundial com ondas nem sempre tão boas.

 

Idealizamos o conceito de free surf profissional, só faltava alguém para comprar a ideia. Na volta dessa viagem, Clemente Borges me chamou para ser chefe de equipe da Redley, que estava se reposicionando no mercado e queria reestruturar sua equipe. Aceitei o convite e contratei Pedro Muller e Guilherme Gross para as competições e na sequência Burle, vindo da Seaway, e Eraldo para serem os primeiros free surfers brasileiros pagos só para surf trips.

 

Em uma dessas surf trips da Redley – para o Tahiti -, conheci Roberto Moura, que posteriormente me convidou para trabalhar nos programas Surf Adventures, exibidos no Sportv. Nesse momento o Surf Adventures tinha a edição do Olivio Petit e fotografia do Flavio Alexin, além da direção do Roberto Moura.

Minha missão seria fazer produção e câmera d’água, que no Surf Adventures sempre foi em 16 mm. Roberto e Alexin me ensinaram tudo, foi uma época de muito aprendizado operar uma 16 mm que filma a 140 – 200 frames por segundo dentro d’água era um super desafio.

Tínhamos que exibir um programa por mês dos melhores picos do planeta, ou seja, muitas viagens pela frente. Roberto só escolhia pico clássico e galera voltava com a bagagem recheada de altas imagens. Época maravilhosa. 

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Sanfelice é só alegria durante trabalho em Bali, Indonésia. Foto: Bruno Lemos / Lemosimages.com.

 

De quais trabalhos você mais gostou de ter participado?

 

Sem dúvida, os programas Surf Adventures para o Sportv, que foram em torno de 60 ao longo de 6 anos (de 97 a 2002), e os filmes Surf Adventures 1 e 2 para o cinema foram a base do meu trabalho e por isso eu gosto tanto.

 

Fiz trabalhos de câmera aquática para publicidade, dos quais também gostei bastante, com Fernando Meirelles (O2 Filmes) para a Coca Cola, Felipe Jofily (Cinerama Brasilis) para a Petrobras e também alguns longas e clips de música que ficaram bem legais.

Em quais projetos você está envolvido no momento?

Tentar estar presente nos maiores mares do ano para documentar o big surf de tow in da galera e inscrever o

Carlos Burle explora a laje de Saquarema (RJ). Fotos: Carlos Sanfelice.

material filmado no XXL, principalmente com Burle, Eraldo e Maya. Esse material tem como destino final um documentario da vida do Burle. Um documentario da Neymara Carvalho com Nakamura, da Cinerama.

Nessas trips de surf que você participou, onde você viu as melhores ondas e as melhores performances?

São muitas ondas incríveis e performances de destaque da maior galera, mas vou tentar fazer um bom resumo. A barca com Fabio Gouveia e Teco Padaratz em 98, nas Maldivas, foi uma das melhores performances que já vi. Pasta Point perfeito e Teco de front quebrando e Gouveia de back surfando o seu melhor. Foi casca grossa.

Danylo Grillo nas Mentawai, em 99, ali eu vi que o cara era muito bom tube rider. Viagem da vida. Bruno Santos em Pipe e Teahupoo surfa muito. Merece todo o respeito. Guilherme Gross numa trip para Puerto tava entubando muito de backside com uma prancha mágica do Sheena.

Rato Fernandes e Calunga dominavam Desert Point, os caras fizeram história naquele pico. Numa trip para Panaitan, Raoni e Fun fizeram a mala, pegamos uma semana de mar clássico.

Leo Neves, em Cabo Verde, também fez um surf animal, o cara tava destruindo. Fizemos uma trip mágica para Super Sucks com Betinho Dengue que foi inesquecível.

Renan Rocha, tirando 10 em Pipe, tava no auge. Também fizemos juntos uma trip no Quiksilver – The Crossing para Mentawai que foi surf na veia, com Mick Campbell e os irmãos Jake e Paul Paterson. Muito maneiro.

Passamos por uma aventura muito boa em Moçambique. Eu, Rato, Resende, Phebo e Joao Maurício, juntamente com Sebá e Bruno Lemos, chegamos a um país africano sem saber praticamente de nada. Só havia uma referência de que o Tom Curren tinha pego boas ondas lá, mas onde? Em que parte do pais – Norte, Sul? Não sabíamos de nada.

As performances do Kelly Slater no Backdoor, os tubos casca em Teahupoo do Manoa, Bruce e cia também precisam ser mencionados.

Falando de big surf, as ondas que Burle, Eraldo e Resende já pegaram colocam os caras como os melhores do mundo.

Burle sempre surfou muito bem na remada, já fez seu nome no Backdoor, Waimea, Maverick’s e África do Sul, depois com o tow in, “o céu e o limite”  para ele. O nível de profissionalismo que Burle colocou no surf está fazendo a diferença, mostrando um caminho para a nova geração e colocando o Brasil em lugar de destaque.

 

 

Adriano Mineirinho, Jadson e uma geração inteira que está vindo aí, como Gabriel Medina, devem olhar o exemplo de Burle como referência de dedicação ao surf.

Nos últimos 25 anos, Burle passou em média quatro a cinco meses por temporada no Hawaii. Sem dúvida, quem quer chegar realmente no topo tem que ter esse tipo de atitude .

 

Como está o mercado em termos de equipamentos de captação de imagens?

O mercado de equipamento está cada vez mais dinâmico, com grande evolução das câmeras fotográficas digitais que estão filmando com uma super qualidade, como a Canon 5D, além das câmeras Red.

Como você vê o futuro de vídeos e filmes de surf?

Com a democratização do acesso aos bens de produção como as câmeras e os laptops, todos que quiserem podem fazer seus próprios filmes, isso é muito bom. Antigamente, uma câmera profissional era a maior grana e uma ilha de edição tinha preço de carro zero. Só para ricos… Hoje em dia, todo mundo tem uma câmera, esse é o presente e o futuro, todo mundo filmando tudo.

Deixe um recado para aqueles que gostariam de um dia vir a trabalhar nessa área.

Poder ganhar a vida com o que se quer é uma dádiva, e ganhar a vida no surf é um dos maiores presentes que Deus me deu. Estar sempre podendo surfar, estar próximo do mar, ver seus amigos quebrando a sessão e você lá filmando tudo, show! Como tudo na vida, você tem que querer e se dedicar para fazer um bom trabalho e ter reconhecimento do meio. Lembrando as palavras do mestre Raul: “Basta ser sincero e desejar profundo”.

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