Era só mais uma visita de rotina, para saber das novidades oficiais da associação manda-chuva do surfe profissional. Entrei no site da ASP na sexta-feira certo de que veria, entre as notícias de destaque da página principal, as ondas fabulosas do WQS de Saquarema. Horas antes, eu tinha aberto uma batelada de e-mails com fotos alucinantes e notícias frescas do evento.
A despeito de ser um evento com mais surfistas caseiros que grandes estrelas mundiais, estavam lá alguns nomes importantes no mundo da própria ASP: o garoto prodígio do Hawaii John John Florence, o vencedor de Trestles, Gable King e, claro, o quarto do mundo Jadson André. Aliás, a ASP não pode esquecer que o cara é o quarto do mundo.
Ah, as ondas. John John disse que lembravam um pouco as do Hawaii. Jadson disse que estava difícil lá dentro, mas parecia bonito de fora. Esta é a chave do sucesso, desde o Coliseu de Roma. Da areia, o bom fotógrafo Daniel Smorigo registrou imagens de primeira de um swell que variou entre 2 metros e 1 metrinho em Itaúna, sempre com linhas bonitas.
Então, depois de ler e ver isso tudo, abri o site da ASP. Lá vi notícias sobre um insosso Pro Júnior feminino em Les Bourdaines, na França, e um similar masculino em Manu Bay, na Nova Zelândia. Nos dois eventos, ondas risíveis. Fui na setinha do site – onde é possível passar de uma notícia para a outra. Nada de WQS em Saquarema. Nenhuma bomba de Itaúna.
Postam bateladas de Pro Junior e não dão uma linha de um evento importante no Brasil? A primeira reação, coisa de jornalista, foi mandar um e-mail para o gerente de mídia da entidade. No texto, contei o que tinha visto, e usei como isca o John John, que além de excelente surfista, é aposta certa da ASP como o nome havaiano dos próximos anos.
Até então, a melhor foto era dele. Escrevi: “Recomendo que a associação publique alguma coisa. Apesar de o evento estar sendo realizado no Brasil, as ondas estão incríveis”, disse, com um gota de ironia no canto da boca. O gerente de mídia da ASP Internacional me respondeu prontamente, dizendo que estava havendo algum problema e que iria resolver isso.
Eu iria ainda mais longe com o texto se soubesse – como soube mais tarde – que os assessores do evento e da ASP América Latina, ambos excelentes profissionais, vinham enviando textos em inglês e uma fartura de fotos de ação para a matriz da ASP.
Bom, não sei se foi a causa, mas, no dia seguinte, o Coca-Cola WQS em Saquarema estava estampado no site da ASP. A foto, claro, era do John John, num assustador ataque de backside. Tá bom, o surfista era havaiano. Mas a onda e o evento, respeitáveis, eram brasileiros.
Sem querer desmerecer o trabalho especialmente determinante das duas assessorias, que produziram conteúdo de enorme qualidade todos os dias, a insistência de um jornalista inconformado pode ter ajudado um pouco. Uma força extra nunca é demais.
É como o bem-sucedido anúncio do chocolate que apelava para a hipnose pela repetição. Só que, na prateleira, estão o pico e o evento: “compre Saquarema, compre Saquarema…”
Onde passa um boi brasileiro, passa a boiada. A ASP reproduziu notícias de Saquarema até o fim do evento, quando deu Willian Cardoso na cabeça, em final contra o amigo Marco Polo.
Desta vez, a vitória brasileira foi ainda maior. Venceu a cidade de Saquarema, grande palco do surfe brasileiro, que voltou a mostrar a sua força para a ASP. E venceram, mais uma vez, os organizadores do evento, pelo esforço de bancar, apesar dos possíveis obstáculos logísticos, um evento do circuito mundial numa das melhores ondas do Brasil.
Tulio Brandão é repórter de O Globo, colunista do site Waves e da Fluir e autor do blog Surfe Deluxe