Os catarinenses Diogo Guerreiro, 23 anos, e Flavio Jardim, 22, estão no meio de uma jornada inusitada: percorrer os cerca de 9.500 km da costa brasileira à bordo de pranchas de windsurf.
Eles já percorreram 1.700 km do litoral brasileiro usando suas pranchas de wind como único meio de transporte.
O projeto, chamado ”Destino Azul” , prevê uma viagem completa pelo litoral brasileiro – do Chui ao Oiapoque, conhecendo e desbravando nossa costa.
Durante uma parada pela cidade do Guarujá, litoral sul de São Paulo, eles relatam as dificuldades e vitórias alcançadas até agora na empreitada.
Vocês começaram a velejar de windsurf mesmo?
D: Eu comecei por influência do meu pai, que já era windsurfista, e o Flavio, com mais dois amigos nossos.
Que idade vocês tinham na época?
D: Eu tinha 13.
F: E eu 16.
Além do wind vocês também velejam de barco?
F: Eu comecei no optimist com seis anos de idade, e há cinco anos começamos a correr a costa brasileira.
Vocês já exploraram a costa toda do país?
F: Nós já fizemos de Santa Catarina ao Nordeste três vezes. E mais algumas viagens até o Rio de Janeiro e Porto Alegre. Também fomos até Fernando de Noronha.
Como surgiu a idéia de fazer a costa toda do Brasil com uma prancha de windsurf ?
D: De Wind você entra em qualquer canal, sem se preocupar também com a profundidade.
Então vocês planejaram essa viagem toda devido à roubada no Espírito Santo e a vontade de conhecer toda a costa?
D: Quando planejávamos nos mapas a trip, olhávamos para certa localidade e víamos que seria difícil passar devido a formações de rios, correntes, etc. Mas, a vontade era grande e não visualizamos as dificuldades que estamos passando na pele agora.
Falem sobre uma dessas roubadas.
Carona com pescadores em um rio no litoral do Paraná. Foto: Flavio Jardim. |
D: Nós calculamos que iríamos fazer o Rio Grande do Sul em 12 dias, velejando dia sim e outro não. Mas, acabamos levando um mês.
F: Fomos roubados em Atlântida e durante a noite tentaram entrar na casa onde dormíamos. Colocamos armários nas portas e fechamos somente um dos olhos. Adrenalina. Na seqüência tivemos que carregar a pé todo nosso equipamento até Torres, cerca de 60 km. Não foi brincadeira. Muito desgastante.
D: Na saída de Torres foi punk também. Na época estavam rolando alguns ciclones e certos dias os ventos estavam com 45km/h. O pior é que nos dias seguintes da tormenta não dava para passar a arrebentação com as malas e tal, afinal as ondas estavam enormes.
De que cidade vocês saíram e por quais pretendem parar?
D: Saímos do Chui e a primeira parada foi em Farol do Abadão, a 60 km do Chui e 120 km da próxima cidade. Não tem ninguém. Só tem duas casas de pescadores e uma casa do Ibama nessa área toda. Não foi fácil. Na seqüência fizemos todo o litoral do Rio Grande do Sul, passando pela famosa Tramandai, Atlântida e paramos um pouco para dar uma entrevista para a TV de Porto Alegre. Na seqüência Balneário Gaivota até Farol de Santa Marta. Esse trecho foi o mais longo dentro d’água. Fizemos 120 km. Depois Itaperubá, Imbituba, Ibiraquera e na seqüência Florianópolis. Caravelas, Palmos, Ganchos, Porto Belo, Itapema, Navegantes, Barra Velha, Barra Sul, São Francisco do Sul, Matinhos, Ilha do Mel, Nova Brasília, Superagui, Bertioga, Maruja, Cananéia, Peruíbe, Santos e agora Guarujá.
Chegando em casa não pensaram em desistir?
F: Paramos por duas semanas em Floripa para analisar o que deu certo e errado.
O que começou na mochila de vocês e o que tem agora?
D: Um rádio VHF, dois walktalks, câmera de filmar com caixa estaque, máquina fotográfica, barracas, saco de dormir, toalha de rosto, pílulas de purificação de água, fogareiro e as nossas roupas. Tivemos que nos livrar de algumas coisas.
Quanto pesava e quanto pesa agora essa mochila?
Uns 12 kg cada, e agora 10 kg. Era muita tralha que não usávamos. Tínhamos um rádio de carregador 220v e tinha lugar que era 120v, além de outras coisas.
Quais foram algumas das lições que tiveram até agora?
D: Fica difícil de saber o quanto você vai andar, ou melhor, programar o tempo de chegada em determinado local e tal. Tem dia que você pensa que vai se deslocar muito e não rola. Como ontem, que pensávamos que sairíamos de Santos e pararíamos em Maresias e não conseguimos passar do Guarujá. Mas foi bom que rolou essa hospitalidade sua e da Sylvia (Nabuco) (risos).
Foram 1.700 km dos cerca de 9.500km. Quanto tempo mais vocês acham que levam para terminar?
D: Uns nove meses, se tudo der certo.
E agora vocês têm uma noção de quais serão as paradas?
Boracéia, Maresias, Ilha Bela, Ubatuba, Angra, Rio de Janeiro, Búzios, Macaé, Espírito Santo, Vitória, Sul da Bahia, Caravelas, Porto Seguro, Ilhéus, Itacaré, Morro de São Paulo e na seqüência tentaremos priorizar as capitais. Ao todos são 17 Estados. No Norte tentaremos fazer por fora, pois o vento é ruim, de repente tentaremos contratar um barco de apoio, afinal temos informação que as condições são muito adversas.
Quantos quilômetros vocês já percorreram até agora?
Cerca de 1.700 km. Já estamos prestes a sair no Guiness (livro dos recordes).
Diogo com seus novos amiguinhos. Foto: Flavio Jardim. |
Já teve algum louco que fez esse tipo de percurso antes?
D: Não. Pesquisamos e não achamos nada perto. Teve dois velejadores na Europa que fizeram 85 km. Sendo que em um só trajeto fizemos 120 km.
Desses 1.700 km, quantos foram dentro d’água e quantos caminhando, com caronas, etc?
D: Uns 80 km de caronas, etc, e o resto velejando. Tinha dia que velejávamos 4 km e outro dia 100 km. Não é fácil depender do vento.
Vocês já pensaram em desistir?
F: Eu já pensei. Foram tantas roubadas que eu me perguntava “o que eu estou fazendo aqui?”. Coisas tipo começar um trajeto e ter que voltar de carona com algum pescador no meio do caminho porque o vento acabou, e no dia seguinte rolar a mesma coisa. Tudo isso no meio do nada, dormindo sem luz, em lugares obscuros. O Diogo está muito determinado e sabemos que a força dele é muito forte. Isso me contagia e me motiva a completar. Eu comecei achando que não iria conseguir, isso depois da primeira semana de viagem. Mas as roubadas estão me dando mais forças. O apoio que recebemos do pessoal bacana onde paramos é um super combustível. Se todo pico que chegássemos fosse tão bacana como o Guarujá, com você e a Silvia, seria alucinante, mas a realidade não é fácil. Todo lugar que chegamos tentamos descobrir se tem algum amigo do amigo e tal. Dessa vez, nosso amigo Santosha, de Floripa, conhecia a Silvia que por sua vez era sua amiga. O mundo na real é pequeno, pois nos conhecemos no Hawaii e nos trombamos aqui novamente. Isso é positivo.
D: Nesse aspecto de conhecer as cidades e as pessoas é estranho, pois tem cidade que chegamos às 18 hs e as 9 hs já estamos na água de novo. Acabamos não conhecendo nada. Inclusive existiu um terceiro companheiro, o Eduardo Moreira, mas ele desistiu no começo, no Rio Grande do Sul.
O que levam para comer?
F: Na mochila de comida só tem barra de cereais e água.
Quem banca o projeto?
A Mormaii e a Naish como co-patrocinadora.
Vocês ficaram doentes ao passar pelas águas geladas do sul?
Não. Alguns lugares chegaram aos 3 graus. Muito frio. Mas, até agora não rolou. Colocar a roupa molhada era fogo. Mas, valeu a pena. Agora a expectativa é de água quente.
E a prancha? Uma só fica difícil, afinal a vela pode ficar grande demais em vento forte e pequena em vento fraco.
Usamos uma prancha de 2,7 metros e 8 metros de vela. Tentamos pensar em algo que pudésse aumentar e diminuir o tamanho da vela, mas não deu certo. O rendimento iria aumentar muito se tivéssemos uma vela reserva.
O bacana nessa história também é que no Wind, kite e barco a galera sai para praticar e tem que voltar ao que mesmo lugar que saiu, sem aproveitar o melhor do vento. O que vocês têm a dizer?
D: Com certeza. Não temos que nos desdobrar para orçar de volta para o ponto de partida. Ficamos horas aproveitando o melhor do vento. Deixando ele nos levar o máximo que der.
Vocês pegaram muito vento contra?
Sim e corrente contra também. Isso dificulta muito.
O sacrifício vale a pena. Visual irado em algum ponto entre Chui e São Paulo. Foto: Diogo. |
Qual o vento mais forte que rolou e que velocidade atingiu a prancha?
D: 45 nós e andando a 50 km/h. Mas, conseguimos andar somente 10 km.
F: Eu caí nesse dia e minha mala foi parar longe. A água fica dura. Ainda bem que a mochila é impermeável e também serve como bóia.
E a família e namoradas?
D: Falamos direto com eles. Temos dois celulares e no começo da trip no Sul rolaram algumas visitas. Agora é só telefone mesmo.
Rolou um treinamento físico específico antes?
Fomos para o Hawaii e ficamos dois meses treinando pensando nessa viagem. A academia Corpore de Florianópolis nos deu um treinamento especial por alguns meses.
Quais foram a viagens internacionais que já fizeram?
D: Duas para o Hawaii e Caribe. Temos um plano de fazer uma volta ao mundo de barco. Estava tudo certo, mas o governo que iria patrocinar mudou e cortou a verba. Mas ainda temos a esperança de fechar essa viagem no futuro.
F: Hawaii.
Quais devem ser as piores roubadas daqui para frente?
Os tubarões no Recife e a pirataria no Norte. No Amazonas rolam alguns assaltos.
Qual mensagem vocês gostariam de passar?
F: Mesmo tendo um site e por mais entrevistas que tenhamos dado, fica difícil passar para as pessoas as roubadas e aventuras que passamos nesses últimos meses.
D: O engraçado é que o normal é passar boas e más aventuras e voltar para casa e contar para os amigos. Nessa trip são tantas horas boas e ruins que não acabam mais. Uma trip prolongada dessas é impar.
Para entrar em contato com a dupla, envie mensagem para contato@destinoazul.com.br e acesse Destinoazul.com.br para obter mais informações sobre a viagem.