“Obrigado, Kai Otton. Sei que você estava apenas fazendo o seu trabalho, mas lhe devo uma. As coisas ficaram mais interessantes para o fim da temporada.”
Em 140 toques, Kelly Slater demonstrou uma necessária gratidão a Kai Otton. O australiano eliminou Mick Fanning nas quartas, venceu a parada de Peniche, em Portugal, adiou a decisão do título mundial e encheu o americano de esperanças.
O sentimento de Slater deve ser compartilhado pela ASP. Um título decidido em Portugal, num ano sem um craque fora da curva, não é bom negócio para o esporte, especialmente em tempos difíceis como os atuais. A temporada de 2013 precisa de uma decisão em Pipeline.
A chance caiu no colo de Slater. Depois da inesperada derrota no round 2 de Portugal, decidir num palco em que já venceu seis vezes, contra um adversário que jamais esteve no topo no arquipélago, é o melhor dos presentes. A esta altura, do alto de seus 41, as derrotas para Andy Irons e Joel Parkinson não devem lhe atormentar.
Fanning terá que passar das quartas para assegurar o título. Ou seja, fazer mais do que fez em Portugal. Ele sabe que, em Pipeline, o imponderável pode vencer suas conhecidas qualidades. Talento, precisão, competitividade, foco e outros atributos nem sempre saem do tubo.
Os juízes, que andaram perdidos este ano, terão muito trabalho em Pipeline. A história do surf profissional dependerá dos décimos que têm separado a glória das tragédias.
Será a consagração de um surfista cerebral, dono de uma linha irretocável, com um terceiro título que poucos surfistas alcançaram, ou a redenção definitiva do melhor da história, que busca o cabalístico décimo segundo troféu para a sua obsessiva carreira.
A vitória de Kai Otton premia um excelente surfista, legítimo representante do estilo goofy clássico, que muitas vezes passava despercebido nas etapas. Seu sucesso é mais um indício da guinada conservadora do julgamento da ASP, sem qualquer demérito a isso.
Os brasileiros não foram longe. Miguel Pupo, o melhor colocado, fez um nono lugar.
Em Portugal, acumulamos mais uma pá de derrotas por décimos. Já são muitas ao longo do ano. Talvez seja a hora de esquecer os juízes e pensar numa forma de ganhar mais décimos. Afinal, essa é a única forma efetiva de voltar a ganhar. É isso ou abandonar o circo.
Veio do leitor Felipe de Toledo, por exemplo, uma dica preciosa para Gabriel Medina, postada no rico fórum do Waves: “Continuo achando os aéreos do Medina fantásticos, mas me dá aflição assisti-lo deixar o pocket para trás e seções de lip pedindo uma abordagem power para ?finalizar com mais um aéreo. Posso estar ultrapassado, tenho 39 anos, mas surf é linha, é faca na manteiga. Aéreo tem que ser encaixado, e não perseguido.”
Quem lembra da leveza de Medina em suas aparições antigas, especialmente nas vitórias de um WQS lá no Sul e o King of Groms, na França, sabe bem o que é aéreo encaixado.