Fotografar é uma atividade que atrai muito quem gosta de surf. Ter o life style ligado à praia, estar sempre nas areias, em contato com a natureza e com os esportistas, é algo muito bacana e tem atraído cada vez mais adeptos ao redor do mundo.
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Mas não é todo mundo que pega onda que gostaria de perder o melhor horário do mar para posicionar-se atrás das lentes de uma câmera, torrar no sol, encarar trilhas e pedras em busca do melhor ângulo, entrar na água gelada com todo o corpo imerso cercado por criaturas como tubarões ou mesmo correr o risco de ser arrastado junto com um lip pesado de encontro à bancada rasa e afiada de point e reef breaks.
Eduardo Castro é um desses malucos que encara tudo isso. Mais ainda, largou uma estável carreira no mercado financeiro, onde atuou por
mais de 15 anos, e se jogou para a Austrália com tudo e mais um pouco.
Colaborador do Waves, ao lado de Marina Vivacqua, com ótimas imagens do Mundial Pro Junior este ano, Eduardo conta um pouco de como é a vida de fotógrafo fora do Brasil.
Conte um pouco de sua trajetória na fotografia.
Iniciei na fotografia fazendo cursos de extensão na UFRGS em Porto Alegre, depois de um swell gigante oriundo de um ciclone no Farol de Santa Marta (SC) em 2004. A única foto publicada foi a do Dê da Barra na Fluir, se não me engano. Uns diziam 15, outros 20, outros 24 pés de onda.
O lance é que tenho aquilo até hoje na cabeça. Não consegui uma imagem pra mostrar o que tinha visto. Conto o fato aos incrédulos amigos até hoje, então resolvi fotografar surfe já que somos surfistas. É a maneira de dividir com os outros a vibe do local.
É importante fazer um curso, pois te dá a idéia das possibilidades manuais de abertura, exposição e como arrumar as coisas na foto. A partir de então, vi que meu negócio era fotografia de esporte e movimento. Não gosto particularmente de fotos posadas ou de pessoas, mas gosto daquelas onde a pessoa passa, em um momento de descontração ou algo que você possa compor na hora como paisagem. Prefiro a fotografia artística ou jornalística, nunca a tradicional.
Meu equipamento é simples para competir com as potentes lentes e avançados corpos de câmera que possuem os profissionais com mais tempo de mercado, contudo, para investimento inicial consigo fazer algumas boas fotos.
Precisava fotografar surfe, comecei em Tramandaí (RS), onde eu e minha esposa surfávamos todo o inverno (no litoral sulista, poucas praias são como ?Tramanda? e têm área de surf demarcada, parece que está mudando agora, pois muita gente morreu em outras praias enrolado nas redes de pesca) em águas que chegam a 9 graus e vento tão gelado quanto.
Faço um trabalho informativo sobre as praias daqui da Austrália para um amigo (dono de um site no Brasil). Viajava pra Santa Catarina e picos mais próximos pra surfar e sempre fotografar. Mas sentia que faltava mais tempo pra me dedicar às fotos de surfe, já que não tinha condições de me transferir pra outra cidade sem um custo muito alto e a praia mais próxima de Porto Alegre fica a 130 quilômetros.
Por que resolveu ir para a Austrália? O que você faz na Austrália?
Tinha idéia de mudar pra algum lugar perto de uma onda boa pra surfar a outra metade da vida com a família, mas não imaginava que seria tão longe. Andava pesquisando há tempos o “lifestyle ozzie”, lugar de muita onda, campeonatos, atletas profissionais e clima parecido com o Sul, frio no inverno e quente no verão.
Bom, acho que não entenderam bem o meu negocio de fotografia lá no meu trabalho (risos), e eu estava um pouco cansado da rotina caótica da cidade. Já havia decidido que iria abandonar a vida estável e estressada por algo que eu realmente gostasse de fazer, como a ?promissora? carreira na fotografia.
Achei bem interessante a vida selvagem daqui da Austrália, posso fotografar em um lago, no mar ou simplesmente parar em um lugar sentado e esperar acontecer alguma coisa. Vários pássaros vem na tua sacada, vários mesmo! Existem diferentes tipos de aranha, cangurus, patos, pelicanos, etc., tudo isso na porta da tua casa ou bem na tua janela, incrível!
No mesmo dia que saí do trabalho, cheguei em casa e anunciei: “Mulher, faz as malas que estamos indo pra Austrália!”. Foi o caos em cadeia: esposa, família, família da esposa, ninguém entendia nada!
Passei seis meses estudando e me organizando e vi que era possível cozinhar e fotografar. Hoje cozinho e fotografo. Ou melhor: cozinho pra poder fotografar.
A culinária aqui é outra profissão rentável a ser explorada. Consegui trabalho com um paranaense muito gente boa que faz pizzas excelentes aqui nas Northern Beaches de Sydney.
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A fotografia na Austrália é mais valorizada do que no Brasil. Por quê?
É difícil ser fotógrafo no Brasil. Fiz fotos muito boas de um campeonato de Pólo que eu acreditava ser esporte da elite local, ricos em peso, carrões, roupas caras, cavalos e etc. Mandei para a organização por um preço compatível, pois estava começando. Acharam caro. Acredito que seja falta de informação do custo operacional para fazer uma foto daquela a 200m de distância, com qualidade pra fazer um pôster e quanto custa um simples clique com um equipamento similar.
Quando completei cinco meses na Austrália, (estou aqui há 10 meses), fiz algumas fotos de still para uma revista nova local, hoje indo pra terceira edição. Continuo trabalhando na mesma publicação fazendo fotos de culinária, fashion e surf. Também faço fotos para
publicidade, freesurf, lifestyle, paisagismo e fotos artísticas.
Outro quesito seria quanto à cultura da fotografia local. Existem muitas galerias de exposição e fotógrafos. Aqui na Austrália, equipamento semi ou profissional você encontra em casas especializadas no “mall” (shopping) mais próximo. O preço é bem mais em conta e o poder aquisitivo do pessoal aqui é maior. Lembro de algumas fotos muito boas no Margs, em Porto Alegre, e ter visto obras do Cartier-Bresson em outra galeria por lá.
Quais as diferenças técnicas em se fotografar na Austrália ou no Brasil?
O inicio da manhã e final de tarde possuem luz igual a um filtro alaranjado. Em dias de swell de Sul, encontro muitos picos a poucos quilômetros de casa. Swell de Leste aqui em Narrabeen é a bênção. Quando o vento vira, sempre tem uma onda protegida. Muitos cliffs e point breaks.
Sem falar que você encontra o Tom Carrol na água, o Nathan Hedge quando você fotografa, o Ross Clark Jones fazendo tow-in num dia chuvoso, a galera local e os grommets. Brasileirada também representa aqui. Você aprende com os caras e o teu mercado fica a duas quadras, pois sempre tem onda de qualidade quando entra swell. Mas não é raro ficarmos 10 dias ou mais sem onda. Sempre sonhei em morar em algum pico no Brasil, mas era inviável financeiramente e as coisas conspiraram pra virmos pra cá, dei sorte de morar em South Narrabeen, que também é perto de onde rola o Pro Junior.
Tranquilamente você deixa teus pertences à beira-mar ou no teu carro (os parks geralmente são pagos e tem fiscalização aqui em Sydney). Acredito que a segurança seja a maior diferença entre nosso país e aqui, pois te dá condições de andar sozinho com o teu equipamento e surfar também. Cautela é sempre bom. Tenho amigos que receberam mais de uma vez a carteira perdida pelo correio, com todos seus pertences e dólares.
Aqui perto existem picos conhecidos. Deadmans (onde o Kelly Slater surfou), Avalon (onde o Kelly Slater surfa e tem casa), North Narrabeen, Dee Why, Curl Curl, Freshwater, Long Reef, Whale Beach, entre outras. Todos ótimos e com ondas pra todos os gostos, de 2 a 12 pés, até onde eu vi.
Quais suas experiências profissionais com fotografia no surf?
Campeonatos locais no Sul do Brasil: WCT- Imbuituba 2007; Volcom Stone 2008 ? Sydney ? Austrália; Billabong Pro Junior – 2009 – North Narrabeen ? Sydney – Austrália; fotógrafo da revista Radar Magazine ? Sydney – Austrália e colunista do site Ondasdosul.
O que você acha do mercado de fotografia do surf mundial atualmente?
Considero-me novo no mercado, mas já dá pra traçar parâmetros quanto às limitações e dificuldades do mercado mundial com o advento digital. Informação mais rápida vinda da ASP, que tomou conta dos principais campeonatos obstruindo o trabalho de fotógrafos autônomos. Acredito que não com o mesmo cuidado e qualidade que andei observando. Acho que tudo que é produzido industrialmente perde qualidade, alma, feeling.
Fotografar o Jadson ou o Alex Ribeiro, ou qualquer um daquela gurizada que esteve por aqui no mundial, é bem diferente quando se trata de freesurf. Portanto ainda dá pra criar, fazer material promocional e diferente, galera que faz arte gráfica, enfim tem que inventar pra se adequar à situação. Até cubro campeonatos, mas acredito que trip e ondas diferentes são o caminho a ser percorrido.
O que e quem te inspira para fotografar?
As fotos do Sebastian Rojas, Tony Fleury, Sean Davey, Donald Miralle, David Púu, Scott Aichner, Julian Breever (não é surfe, mas é legal), Clemente Coutinho, Thiago Braga, James Thisted, Borghi, entre tantos outros. Todos eles tem linguagem própria e aprecio a diversificação.
Outras são as praias, o tipo de luz incidente, tipos diferentes de ondas, onda como filtro e todas as condições que você consegue enquadrar e dizer: ?pôxa, isso daria uma boa foto!? Gosto de fotografar animais também, são espontâneos. Acredito que cada fotógrafo tem sua maneira de ver o surf e colocar sua alma na foto. Isso faz a diferença.
Quais seus planos dentro da fotografia?
Atualização, evolução e fotografar na água. Essa última não muito aconselhável, pois semana passada cinco tubarões brancos de 4 a 5 metros cercaram pessoas em caiaques em Long Reef, derrubando um homem, isso a 1 quilômetro da praia! E ainda acharam outros bichos rondando Narrabeen e Palm Beach. Tenho que fazer amizade com eles!
Gosto do trabalho fotográfico voltado para informação de surfe e pretendo continuar neste sentido. Sinto-me à vontade pra desenvolver meu trabalho aqui, pois sei que Indonésia, Bali e Taiti não são muito distantes, nem custam tão caro como se fosse saindo do Brasil. Acredito que sejam meu próximo objetivo.
Gostaria de ver uma foto de surfe ganhando o World Press Photo, pois o foto jornalista português Miguel Barreira chegou perto com o Bodyboard em 2007, conquistando o terceiro lugar. O Aleko Stergiou tem foto na National Geographic. Seria bom ver o surfe quebrando alguns paradigmas.
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