Espêice Fia

Evolução em polegadas

Bruno Santos, Cacimba do Padre, Fernando de Noronha (PE)

Bruno Santos faz parte da geração que prefere pranchas pequenas em ondas grandes. Foto: Aleko Stergiou.
Famosa estátua de Duke Kahanamoku, símbolo do surf moderno. Foto: Arquivo Pessoal.
Modelos entre 7’0” e 7’6” acabam revertidos para 6’4” ou 6’0”. Foto: Arquivo Pessoal.

A temporada havaiana começa a pipocar agora, mas as suas pistas já serviram para todo o tipo de testes.

 

Ao passar por Waikiki, é possível notar a famosa estátua de Duke Kahanamoku. Com seus braços abertos, atrás do seu corpo uma tábua de proporções avantajadas indica o surf moderno.

Estas “jamantas” também eram usadas no Brasil pelos pioneiros Thomas Rittscher e Osmar Gonçalves na década de 30.

Quando comecei a surfar, no início da década de 80, o surf acabara de passar pela febre do corte das pranchas maiores.

 

Começavam a entrar no mercado as famosas mini-models. Era comum encontrar muitas pranchas serradas e remendadas à frente das quilhas, ou então, apenas serradas na rabeta com as quilhas recolocadas à frente.

Muitas delas, modelos entre 7’0” e 7’6”, acabavam revertidas para 6’4”, 6’0” e por aí iam. A turma da época radicalizou com designs de tudo quanto é jeito e usando pranchas pequenas em ondas de proporções.

Quando comecei a competir e viajar pelo Brasil, meu quiver tinha duas pranchas: uma 5’4” e uma 5’8”. Fizesse chuva ou sol (mar grande ou pequeno), tinha de me virar com aquilo.

 

Logo depois, meu quiver aumentou apenas em tamanho, pois as duas únicas pranchas ainda continuavam, sendo que agora uma 5’9” e uma 5’11”, a minha gunzera. Já no circuito mundial, final da década de 80, me antenei para o surf com pranchas grandes, até porque era quase uma obrigação entre os surfistas em mares maiores.

Era isso que eu escutava a todo momento: “Tem que aprender a surfar de prancha grande”. O que, convenhamos, era uma grande dificuldade para um recém-saído das categorias de base. Lembro-me de estar em Sunset e ver Tom Carroll fazer curvas em cima e em baixo com muita destreza e enorme sobra de bico à sua frente.

O mesmo era válido para Pipeline. Em meu primeiro inverno nas ilhas, os “brazilians nuts” tinham enormes barcos e me lembro do Taiu Bueno também rabiscando Sunset com pranchas grandes. O mesmo acontecia em mares como Surfer’s Point, na australiana Margaret River, quando muitas vezes comportava-se como o North Shore havaiano. Ondas enormes!

Sendo assim, meu quiver aumentou de tamanho a ponto de viajar com uma 7’6’’ na capa, fosse para Austrália, Indonésia e posteriormente Tahiti e Fiji, quando já rolava o “dream tour”. Vendo imagens antigas dos primeiros eventos em G-Land, anos de 95 e 96, constatei perfeitamente o tamanho das pranchas em ondas que, na real, nem precisavam de tantas polegadas a mais.

Eram todos os brasileiros, incluindo os convidados do evento Carlos Burle e Pedro Müller (venceram um concurso feito pela internet), com pranchas avantajadas e também os gringos tal como Mike Parsons, Jeef Booth, entre outros.

 

Nesta leva de análise, a constatação foi rever que Kelly Slater já estava com uma prancha menor e, naturalmente, passeando mais do que todos nos tubos. Esse lance de surfar de pranchas maiores era sentido até quando eu morava em Recife. Existia a turma do reef break, que só surfava de prancha grande, muitas vezes com 6’6” e 7’0’’.

Os anos passaram trouxeram o aprendizado. Meu ensinamento veio em Teahupoo, quando, ao dropar uma onda atrasado a bordo de uma Ricardo Martins 7’6’’, não consegui encaixar no tubo e fui reto na bancada. O mar estava enorme, cerca de 2 a 3 metros cascudos. Mas o tamanho da prancha não encaixou no vão do tubo.

Vale ressaltar que em Cloudbreak a prancha funcionou, pois a onda ali é bem diferente de Teahupoo. De fato, aquilo abriu minha mente para usar pranchas menores, diminuí um pouco o tamanho, revertendo para volume e compacto. A era Kelly Slater bagunçou muita gente, primeiro ele surgiu com pranchas hiper estreitas e depois veio diminuindo o tamanho em ondas maiores. Se bem que também agora ele veio com “volume compacto”.

De fato, assistindo algumas de suas recentes performances, em alguns momentos seus protótipos ciscam um pouco, mas, por outro lado, há momentos que surgem coisas incríveis. A geração dos pequeninos Bruno Santos, Pedro Henrique, Anselmo Correia e companhia me chamava atenção na permanência do surf com os modelos pequenos recém-saídos da categoria de base.

Algumas sessões de ambos acompanhei na Austrália, Hawaii e até mesmo em Saquarema. O mar podia estar enorme, mas sempre a turma das 5’9’’ e 5’11’’ se encontrava por ali. Bernardo Pigmeu também era um adepto de pranchas menores em mares maiores. Eu analisava e ficava incrédulo com a turma, mas ali já havia mudado a concepção. Ou então realmente não rolava uma adaptação de surfar com pranchas maiores.

De fato, a turma dos anos 80 e início de 90 continuava a surfar com pranchas maiores. Mas ainda fico meio na dúvida em ondas volumosas, nas quais a remada é mais difícil e geralmente tem sempre um terral forte segurando.

 

Em mares assim e sem tubo, onde as menores estão encaixando em espaço menor, tal como os melhores do mundo vem provando, ainda gosto também de ver um volume de prancha embaixo dos pés. Assim como faz Sunny Garcia, Pancho Sullivan e até mesmo os dropadores de Pipe como Kalani Chapman – que mesmo eu achando que não é o melhor ali com prancha grande, tem o tempo da onda e consegue tubos insanos.

Vale ressaltar que neste caso o cara é goofy-footer, pois de costas para onda, senão encaixar no trilho de primeira já “elvis”, a embicada pode ser grande e o prejuízo vem em relatório médico.

Talvez o tow-in tenha contribuído um pouco para alguns, pois há gente que desce ondas abissais com pranchas bem pequenas. Porém o peso das mesmas funcionam a favor, o que para o surf normal fica meio complicado, salvo em mares realmente maiores e nas Waimeas Guns, por exemplo. Mas, neste quesito, as manobras são mais escassas.

Prancha pequena em ondas grandes, o “cabra” tem de ser macho, pois invariavelmente tem que estar embaixo do pico para remar e pegar a “craca”. Em meio ao crowd havaiano, por exemplo, fica ainda mais difícil, pois muitos ali surfam com barcos enormes. Alguns não tem destreza, outros tem de sobra, porém para disputar com outros barcos acabam também recorrendo a seus.

Em dias craudeados e de ondas enormes em Sunset, por exemplo, prefiro um barco 9 pés. Manobra-se muito pouco e esse é um quesito também que me deixa encucado. Muitos novatos não se vêem com uma prancha gigante, pois tamanho avantajado demais quer dizer menos performance. Logo, ninguém quer fazer feio, deixar de fazer essa ou aquela manobra e parecer inferior a outros. Sinto isso nos competidores.

Eu que não compito mais e já me livrei disso, surfo livre e solto, muitas vezes apenas curtindo a ladeira, a cavada e o retorno suave do topo para começar tudo de novo até o inside.

Vale ressaltar que o tamanho de prancha grande que relato aos competidores não são barcos de 9 pés, claro, são pranchas em mares que normalmente precisa-se de uma 7’6’’, mas que neguinho surfa de 6’10’’ e até mesmo 6’6’’, 6’4’’.

O surf não para de mudar e hoje em dia é muito bom ver os juízes da ASP absorvendo performances com materiais diversos, coisa que carregava um certo preconceito no passado. Mas quando se é um Kelly Slater, ou um Dane Reynolds, usando coisas anormais e arrebentando, tem-se aí um novo rumo.

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