Promessa nordestina

Fininho segue trilha dos campeões

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Fininho já manda bem nos aéreos, Bandeirinhas, Baía da Traição (PB). Foto: Caio Túlio.

“Fininho olha o mar com superioridade! Desafia-o mesmo! Dentro dele esquece o mundo que fica em terra firme. De cabelo queimado pelo sol, pega na prancha, sua aliada na vida, e entra na água”, foi assim que o português Marco Francisco, licenciado em Ciência da Informação em Coimbra, Portugal, abriu em 2006 um artigo exaltando o exemplo de superação que o pequeno José Francisco, o Fininho, atual campeão paraibano Mirim, representa.

 

Para tanto foi decisivo o apoio que o garoto recebeu desde o início do surfista eventual e pequeno empresário Valdi Moreira Silva, já conhecido pelo trabalho pioneiro em favor da proteção às tartarugas urbanas, ponto de partida da criação da ONG Güajirú, cuja dirigente maior é a bióloga Rita Mascarenhas.

 

“Eu gosto é de ver os pirralhos felizes como aquele ali”, diz Valdir, proprietário do Bar dos Surfistas, apontando para o atual campeão Mirim da Federação Estadual, José Francisco, o Fininho, que em 2007 também garantiu títulos no “Surf-Escola”, no qual foi decisivo seu boletim escolar com notas boas, outra conquista que o garoto alcançou através do seu amor ao surf e das exigências do mentor Valdir.

 

Outras crianças foram aparecendo por ali, tantas que Valdir já não conseguia ter olhos em todas. “Eu peço acima de tudo para eles estudarem. No começo eu deixava que ficassem por aqui surfando com pranchas que eu emprestava, mas depois eu tive que aceatar apenas aqueles que estudam e vão à escola, para que eles possam ser alguém na vida”, afirma o profissional da radiologia que virou dono de restaurante, “só surfa quem estuda. Em 2005 dei uma bicicleta para o Fininho no final do ano, porque ele se esforçou muito para aprender a ler e escrever. Muitos ficaram tristes e com ciúme, mas é uma forma de motivá-los para que façam o mesmo e se esforcem mais” , diz Valdir, salientando que estes meninos até podem não chegar à universidade, “porque existe muita gente, mas se eles souberem ler e escrever, pelo menos serão alguém”.

 

Valdir brincava muitas vezes com Fininho para lhe incentivar nos estudos, quando passava uma garota na praia ele dizia: “Tá vendo Fininho, se você não sabe ler nem escrever como vai sair com uma gatinha quando crescer? Vai chegar num restaurante sem saber ler o cardápio? Sem educação nenhuma mulher vai te querer, meu irmão, se liga!”

 

Fininho sempre dizia que tinha mesmo que aprender a ler e a escrever para ler um gibi , ler sobre o surf e para levar sua pretensa futura namorada a um restaurante.

 

Valdir fala com orgulho do púpilo. “O Fininho vai sempre à escola porque sempre quis muito aprender a ler e a escrever. Quando estava na segunda série quase não sabia ler. Faltava um trabalho do início porque a família problemática e carente não lhe botou na escola. Eu colcoquei ele na escola, porque senão não o deixava surfar.”

 

Em 2005, Valdir inscreveu Fininho no Surf-Escola e o pequeno surfista passou a disputar também o Circuito Paraibano. Na categoria Infantil, o garoto foi sempre o destaque. “Ele sempre se inspirou nos maiores para surfar, ia para o mar com eles. Ele aprendeu muito rápido o surf. Eu digo sempre a ele: com o surf dá para você crescer, para garantir renda futura e morar num bairro como esse aqui”, diz Valdir para o menino.

 

Fininho, em 2006, participou com destaque da assinatura de renovação do Bolsa Atleta Estadual. Valdir relembra: “até chorei de felicidade porque ele foi o destaque. Até o governador falou muito bem dele e todo  mundo queria bater fotos com ele, mas ele é um garoto tímido e não queria! Fiquei muito feliz por ele!”

Mesmo hoje não mais recebendo a ajuda pública, Fininho consegue prancha e ajuda de custo de apoiadores paraibanos para disputar eventos na Paraíba e estados vizinhos, e não decepciona.

 

O título Mirim estadual foi conquistado com vitória na etapa final em Barra de Camaratuba (PB), e para a grande maioria dos presentes foi a oportunidade de vibrar com as manobras precisas que o pequeno Fininho faz a cada dia com maior desenvoltura e precisão, tendo realizado na recente vitória manobras como tubo e  aéreo.

 

Fininho aponta Kelly Slater como o melhor surfista do mundo, o norte-americano octacampeão mundial, cujo início da carreira foi em Cocoa Beach, Flórida (EUA), onde ondas pequenas, a exemplo das de Intermares, não impediram que ele se tornase unanimidade.

 

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José Francisco dedica sua vida aos estudos e ao surf competitivo. Foto: Divulgação.

Mas as outras preferências de Fininho são paraibanas, referências muito presentes nas ondas do Mar do Macaco, em Intermares, Cabedêlo. Para ele, o melhor filme de surf é “Fábio Fabuloso”, a premiada biografia do também paraibano Fábio Gouveia, ex-morador do bairro. O melhor surfista brasileiro na sua opinião é  Jano Belo, o pessoense que se manteve entre os cabeças de chave da elite do Circuito Brasileiro Profissional, que reside na primeira das praias da cidade portuária.

 

Sem falar que a onda favorita de Fininho é a do Dique de Cabedêlo, de formação perfeita durante uma pequena temporada todos os anos. Fininho desenvolve treinos mais constantes no Mar do Macaco, em Intermares.

 

Em 2006, entrevistado pelo Português Marcos Francisco, Fininho já demonstrava gratidão: “Os meus dias são maravilhosos. Vou à escola de manhã e depois venho aqui para a praia, junto do Valdir, que é muito bom para mim, me dá comida, roupa e sandálias. Quando chego vou logo surfar se tiver onda. Quando não tem onda fico meio triste e vou assistir televisão. Quando tem muita onda eu passo umas quatro horas no mar”, diz o dedicado garoto, feliz da vida, olhando envergonhado para a prancha e passando as mãos por ela como se fosse a coisa mais preciosa que a vida lhe deu. E foi… pelas mãos de Valdir!