No último Guia de Pranchas da Fluir, publicado na virada deste ano, fiz a leitura de um texto muito interessante assinado por Avelino Bastos, um dos grandes shapers e fabricantes de pranchas de nosso País.
“Medo e Delírio” (título do texto) dá uma passeada pela evolução das pranchas e alguns de seus termos gerais. De início, Avelino destaca o auge das criações na busca da competitividade em meados das décadas de 70 e 80 – a era Mark Richards, Shaun Tomson, Cheyne Horan, Simon Anderson e Ricardo Bocão (criador das quadriquilhas).
Explora o lado disponível dos competidores da época para shapear e / ou trabalhar com mais tempo junto aos seus shapers, coisa que nos dias de hoje são poucas as oportunidades devido à carga de competições e a demanda do que precisa ser feito para se estar nas cabeças.
Talvez (e Avelino relata isso) as gerações atuais estejam muito mais preocupadas e focadas em buscar evoluir a parte física e psicológica do que em equipamentos diferenciados propriamente ditos para evoluírem dentro de suas próprias necessidades e talentos. O termo “pasteurizado”, que também é usado por Avelino para relatar a linha de surfe determinada pela WSL, quase que anula criações bruscas pra quem vive a competitividade.
A real é que nos dias de hoje a avaliação dos juízes está mais ampla e melhor, mas, mesmo em minha época, tínhamos medo de arriscar a usar coisas diferentes para não ter prejuízos por falta de boas notas. Pranchas muito pequenas, por exemplo, era um fato, já que na época os juízes gostavam de ver o bico aparecendo na onda. Nos dias atuais, alguns tops se arriscam nas salas de shape. Mas poucos sozinhos, a maioria com a supervisão dos seus shapers atuais.
Kelly esboça sempre uma busca por novos e diferentes equipamentos e creio que este atualmente seja também seu combustível para ainda estar na empreitada de competições. Ele que imprimiu “segundo Avelino” – também em seu texto – seu padrão de prancha e de surfe durante anos, desde sua aparição, talvez seja o que mais busca coisa diferente e que faz parte do primeiro escalão.
Dane Reynolds e Josh Kerr também aparecem com coisas diferentes, mas dificilmente veremos competidores da elite shapeando (botando a real mão na massa, bloco) e surfando com suas próprias pranchas full time como no passado. A não ser que algum deles adote isso com mais afinco e vislumbre a própria evolução em cima de suas necessidades, sem olhar, seguir ou se importar com que o outro está usando, independentemente de funcionar em pés alheios.
Daniel Thomson trouxe inovação. Stuart Kennedy apareceu arrebentando com seus modelos. Pranchas sem bicos, linhas paralelas, etc, viraram uma febre em alguns verões passados, mas não vimos ninguém assumir um material desses 100% e vencer um evento até o presente momento. Mas é claro, cada prancha é pra um tipo de onda, cada material usado e desenvolvido também funciona pra determinado tipo de onda, e assim segue difícil surgirem mudanças bruscas.
Outro dia vi uma prancha antiga de Romero Naldinho (legend shaper brasileiro, criador de modelos exóticos). Uma biquilha Keel “muntcho lôca”. Me apaixonei, mas nas competições jamais iria usar.
Recentemente vi uma foto postada por Maurice Cole. O shape é um “fin less”, sem quilhas, só canais fundos e com saliência. Mas aquilo funciona como quilhas, que doideira! Viajei no modelo, deve correr pra caramba. A foto havia sido repostada do @rchbrgsurf e quando abri acabei constatando um novo modelo de quilha, as bio fins design. E quem aparece em um post testado? “Carlos Leite”! Metade rígida e com foil flexível, deve ser uma experiência interessante. Aliás, se prancha exótica fica mais visível em performances, as quilhas que, andam embaixo d’água, só são vistas pelos mais atentos e / ou curiosos.
S-wing fins é também um novo modelo no mercado que vem com proposta diferente e muitos estão usando, tal como constatei no Havaí em pranchas de Mason Ho. Havia recebido um jogo desses no ano passado e já fiz algumas experiências. Com quadriquilhas, o modelo se mostrou ainda mais veloz. Em tempos “maquinados”, ideias são muito bem vindas, logo a monotonia da “pasteurização” vai por água abaixo.