Victor Ribas enfrenta um momento delicado na carreira e precisa, mais do que nunca, mostrar serviço dentro da água para vencer uma bateria. Foto: Grant Ellis/ASP. |
Chamar juiz de ladrão é um dever do torcedor. Quem nunca encostou a barriga no alambrado do Maracanã ou de qualquer outro estádio para soltar um grunhido contra o homem do apito? Quase nunca resolve, mas alivia.
No futebol é assim, mas, no surfe, como nenhum moleque ainda se dispôs a fundar uma “Força Jovem do Vitinho” ou uma “Raça Peterson Rosa”, quem grita por um julgamento justo são os próprios atletas. É aí que começa o drama do carioca Victor Ribas.
O cara sempre reclamou seus direitos na boa. Depois de mais de uma década de bons serviços prestados à ASP, com ficha limpa e repleta de honras, como o terceiro lugar no WCT de 99, ele tropeçou numa das 1001 armadilhas contra brasileiros no circuito mundial. Foi ano passado, no WQS das Ilhas Maldivas. Mal julgado, o atleta saiu da água com a veia do pescoço saltada, catou umas pedrinhas na beira d’água e lançou contra o palanque dos juízes.
Não pegou em ninguém e, mesmo que pegasse, não machucaria. Mas a entidade máxima do surfe tinha argumentos de sobra para puni-lo. Uma multa em verdinhas, aplicada na primeira reunião da ASP após o incidente, parecia ter sido justa para coibir outras agressões. Oficialmente não houve mais nada. Vitinho seguiu competindo e conseguiu voltar à elite depois de um ano fora.
Corta para 2002. Victor Ribas fecha novo patrocínio, volta ao circuito cheio de vontade, os parceiros brasileiros de WCT elogiam o surfe dele. Hora de vencer? Seria, se não fosse também o momento esperado para a ASP começar sua punição velada, aquela contra quem ninguém pode reclamar, a covardia do roubo mascarado de critério técnico.
O carioca foi o brasileiro melhor colocado na história da ASP, com a terceira colocação no WCT em 99. Foto: Pierre Tostee/ASP. |
Na primeira fase do evento na Gold Coast ele não perdeu para Michael Lowe, pelo menos para quem estava na areia. Em Bell´s Beach, foi estranhamente derrotado por Damien Hobgood na repescagem. E, em Fiji, contra Richard Lovett e Shane Dorian, ele entubou, deu batida, rasgada e o diabo, mas foi parar na repescagem.
A ASP errou na mão. O castigo secreto tornou-se público, descarado. Até Renan Rocha, em sua última lista de atuações para a Fluir, escreveu sobre a má fé dos juízes com o surfe no pé de Vitinho. Incompreensível.
A vítima discorda, e busca entender justamente para ter a chance de virar o jogo o mais rápido possível: “Estão de saco cheio de mim. É isso. Se eu não vencer por diferença esmagadora, vou perder”, lamenta Vitinho sem baixar o tom.
As pedras estão novamente soltas no chão, prontas para virar as armas da vingança do surfista. Mas Victor Ribas aprendeu um caminho mais racional que o da raiva. Está guardando todas as papeletas com julgamento duvidoso para, no fim do ano, apresentar um relatório bem fundamentado ao “board” (diretoria) da ASP sobre os erros de julgamento.
“Essa é a via certa para reagir. Por enquanto vou ficar quieto, dar show dentro d’água e convencer quem me vê com olhos virados. O surfe, no circuito mundial, é o que os juízes acham de você. Só me resta voltar a ter um momento especial na carreira.”
Seduzir pelo surfe. É o que precisamos para trazer o caneco do WCT para o Brasil. Não há dúvida: a leveza polida de Vitinho, o refinamento de Fabinho, a agressividade de Peterson, a projeção de Teco, o dom raro de Neco, a força de Renan e tantas outras qualidades dos demais brasileiros na elite do surfe mundial podem, sim, vencer a barreira cada vez mais falha do preconceito.
Rasgadinhas
– Inverno de 2002 no Rio. Tem onda, mas falta aquela grande ressaca para esquentar a briga dos big riders pela maior da temporada. A mídia, embalada pelo surgimento do Tow-in, está de olho.
– Leia o texto ouvindo “Superágua”, o primeiro disco de Jonas Rocha e Ulisses Cappelleti. Um ‘lounge’ bacana, bom de ouvir depois do surfe. A dupla de música eletrônica já havia inovado na boa trilha sonora do filme “Trocando as Bordas”, de Pepê Cezar.