Lorraine festeja 2007

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Lorraine Lima cava forte no México. Foto: Arquivo Pessoal LL.

Sou frequentemente questionada, em entrevistas, sobre minhas maiores motivações para pegar onda ou mesmo competir. A resposta nunca demorou para sair e meu coração logo se abria.

 

Tenho o trabalho que gosto, pego muita onda boa e aprecio a simplicidade da natureza todos os dias de formas diferentes.

 

Tudo que o dinheiro não pode pagar, meus olhos tem acesso: um lindo pôr do sol, um céu estrelado, uma paisagem incrível em um lugar qualquer.

 

Lorraine Lima posa de gatona em Sintra. Foto: Arquivo Pessoal LL.

Viver em uma sociedade apegada a bens materiais nunca foi minha praia. E nunca será.

 

Hoje, num quarto de hospital, faço uma retrospectiva do meu ano e deixo uma opinião sobre o esporte. Minha mãe está, mais uma vez, na luta pela vida e eu estou aqui do lado dela. Meu ano foi bem assim: sobrevivendo.

 

Todos devemos dar mais tempo para nós mesmos. Não é preciso estar longe da terra, do país, de casa. Viajar, de avião ou em pensamento, nos tira do nosso cotidiano e faz refletir sobre os verdadeiros valores da vida.
 
Em 2006, estive fora a maior parte do ano e pude observar diferentes realidades nos países que passei. Pude também olhar minha realidade de outra perspectiva. Estava sozinha e pronta para observar meus erros e acertos, vontades e desejos. Minha felicidade e minhas tristezas.

 

2006 foi inesquecível: três meses na Austrália, um no México e outros dois na Europa. Nas competições fui razoável. Nas etapa mais importantes do WWT – Women World Tour – fui barrada nas quartas-de-final e garanti a décima-segunda posição no ranking, ou seja, sou uma das top 16 do circuito mundial.

 

O astral é muito bom, somos todas muito amigas, mas quando entramos na água é pra valer. Não tem amizade! É lógico que rola respeito, mas a luta em busca de dinheiro e resultado fala mais alto.
 
O nível técnico é altíssimo e tenho procurado melhorar cada dia. Excesso de viagem cansa muito. Pegar avião, depois ficar dias e horas esperando em aeroportos. Saudade e preocupação com a família. Tudo tem lado bom e ruim, mas essa é a vida que escolhi.

 

Muitas vezes me irrito com pessoas que pensam que vida de atleta é fácil. Competir preocupados e sem grana é a realidade de muitos de nós, atletas do tour mundial de bodyboard. Não falo só dos brasileiros esses nem se fala), mas a maioria dos atletas do circuito.

 

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Lorraine mostra moral na Indo. Foto: Arquivo Pessoal LL.

Mais triste do que ver bodyboarders de todo mundo acampados na praia grande em Portugal (durante o evento em Sintra) e sendo expulsos pela polícia, é ver organizadores  e meia dúzia de atletas em hotéis cinco estrelas. 

 

Com todo gasto físico, psicológico e financeiro, somos obrigados a vencer um campeonato que muitas vezes não paga os custos da viagem.

 

Me pergunto: qual a sensação de disputar o circuito mundial? Aquele que vive do esporte é profissional, aquele que sobrevive é

bodyboarder.

 

A bodyboarder paranaense prepara ataque ao lip mexicano. Foto: Arquivo Pessoal LL.

Anos dedicados e suados ao esporte, gastos com psicólogo, treinadores,

academias, suplementos, equipamentos  e viagens entram na balança.

 

Não sou a primeira do ranking mas tenho meu mérito e também tenho valor. Mereço um descanso e um pouco de reconhecimento.

 

Fico chateada vendo as mesmas coisas em campeonatos no Brasil. Grandes atletas sujeitando-se a  premiações ridículas por puro amor a competição.

 

Isso quando não são desfavorecidos ou roubados. O juiz que nunca errou que atire a primeira pedra ou aceite filmagens que,

absurdamente, não servem como provas.

 

Sempre quem paga o pato é aquele que treinou, suou e não teve seu nome entre os melhores por erro dos outros. E pior que errar, é jurar que não errou, não aceitar argumento nenhum. Nunca voltar baterias ou mudar resultados.

 

Longe de ser um grande negócio e de boas premiações, longe do dogma capitalista e fechado das surfwears – utópico ainda na vida real dos bodyboarders. Parece mais um sonho torto da vida do bodyboarder Pro. Falo por mim, mas sei que nascemos para viver o desejo dos nossos sonhos.

 

Minha mãe dorme tranqüila sob efeito de remédios e luta com todas as forças para continuar viva.  Passo o Natal junto com ela e embarco em 29/12 para passar o ano novo no Hawaii – todos devem imaginar que na vida boa. 

 

Tenho sonho de ser campeã mundial Pro, caso contrário não desperdiçaria tanto tempo e energia ficando fora de casa. A última etapa do tour 2006 acontece em 2007. Por quê? Tradição? Fechar o ano em Pipeline ao invés de começar o ano lá. Só porque o surf profissional é assim? Somos originais ou uma cópia falsificada?

 

Vivo o desejo de surfar bem e competir em Pipeline. Desta vez vou sem obrigação de atleta Pro. Quero evoluir de maneira profissional meu surf e não acredito que essa evolução esteja na disputa competitiva.

 

Quando estou na água tudo passa, surfando ou não. O contato com a natureza e admirar coisas simples da vida como o pôr-do-sol, um mergulho no mar e a variedade de cores, formatos e espécie da fauna e flora marinha.

 

Tudo isso renova o corpo, a mente a alma. É assim que vou viver. Sem pressão, sem tensão e sem obrigação. Nos vemos ?around the world?!