Quando o avião aterrissava em Kuta, na ilha de Bali, Indonésia, imaginei a chegada de um grande swell, daqueles que deixam surfistas na expectativa de botar pra baixo na melhor onda da vida. Mais de 70 pessoas, pela Fundação Surfing The Nations (STN), embarcavam de Honolulu, Hawaii, no dia 5 de julho, para 25 dias na viagem missionária do surf.
Entusiasmada pela oportunidade de surfar as perfeitas e desafiadoras ondas no maior arquipélago do mundo, tive todas as minhas expectativas superadas com umas das melhores experiências da minha vida.
Em Bali, tudo estava preparado para nos receber, organizado pelos diretores da STN, Tom e Cindy Bauer. Tom promove viagem de surfistas cristãos por todo o mundo. Em 1997, fez a primeira viagem para a Indonésia, com apenas sete pessoas, e este ano comemorou o décimo aniversário com mais de 100.
Eu era a única brasleira no meio de 121 pessoas de várias partes do mundo. Dezenas de pranchas e centenas de malas, com roupas e brinquedos para doações, faziam do grupo uma "surfesta" ambulante. Não passávamos despercebidos em qualquer lugar. Taxistas dos tradicionais pequenos caminhões de Bali perguntavam: "Surfing The Nations?".
Nos hotéis de Bali, o banheiro sujo, sem descarga e a água salobre não conseguiram tirar o encanto da inédita experiência. Os objetivos da viagem eram resumidos pela frase: "surfers giving back" (surfistas devolvendo). Era a remada no prazer de surfar as melhores ondas do Oceano Índico e o drop na compaixão pelos habitantes de uma das regiões mais necessitadas da terra.
Grupos foram separados para diferentes surf breaks, incluindo G-land, Dreamland, Belong e Cangoo. Escolhi a ilha Nusa Lembongan para surfar as direitas de Shipwrecks. Eu era a única menina entre os 10 surfistas do grupo de 55 pessoas, em Lembongan.
Ondas perfeitas, de 3 a 6 pés, água cristalina e os rasos e coloridos corais eram o típico cenário do surf indonesiano. Atípico, foi o crowd em Shipwrecks, com mais de 60 cabeças. Surfava melhor nos 40 minutos depois das 18h, quando quase todos deixavam o outside de barco. Eram momentos dos sonhos até sentir os braços cansados, que me faziam cair na real. Vinte e cinco minutos de remada contra a correnteza até a praia. Nunca remei tanto na minha vida.
Ao desbravar a Ilha de Lembongan, distribuíamos roupas, brinquedos e Bíblias. Tinha muita satisfação em ver a alegria da garotada e a gratidão dos locais. As crianças costumavam pedir dinheiro. Julguei-as interesseiras até ser chocada com a real necessidade que tinham em pedir ajuda.
Nas vilas, as pequenas casas eram de madeira e sapê. Panelas vazias ficavam no chão de areia junto ao improvizado fogão à lenha. Um pouco de arroz era toda comida que tinham. Bebês brincavam descalços e pelados com areia por todo o corpo. Kade, 7 meses de idade, tinha feridas infeccionadas por todas as pernas sujas. Explicava para as mães a importância de manter os ferimentos limpos.
A comunicação em Lembongan era difícil, poucos falavam inglês. Mesmo assim, iniciei estudos com bíblias no idioma bahasa indonesia, para esinar-lhes sobre um único Deus criador que não precisa receber sacrifícios. Eles fecham o comércio da Ilha para as cerimônias Hindu e gastam o pouco que tem nas oferendas diárias aos deuses pagãos.
O cultivo de algas marinhas é a grande atividade econômica de Lembongan. As algas são exportadas para o Japão como matéria-prima para medicamentos e cosméticos. Triste foi quando soube que recebiam apenas 100 rúpias para o árduo trabalho, o que equivale a dois centavos de reais. Logo, lembrei da senhora, de 60 anos de idade, carregando os algas na cabeça debaixo do Sol quente.
De Lembongan, fomos para a reunião de todos os grupos em Bingin. O swell de 4 a 6 pés proporcionou excelentes condições de surf. Podíamos escolher entre as rápidas esquerdas de Impossibles, os competitivos tubos da perfeita e perigosa esquerda de Bingin e as tranqüilas esquerdas e direitas de Dremland.
A galera fez a cabeça com várias quedas por dia nos diferentes picos e os rasos recifes fizeram algumas vítimas, mas nada grave. Passamos os quatro dias hospedados em camas de sacadas ao ar livre e a poucos metros do mar, chamadas "warungs". Pela manhã, tivemos visitas de macacos e, à noite, apresentações de teatro e danças balinesas.
Na última semana embarcamos para a viagem nos indonesianos barcos modelo Jukung Outrigger. 7 barcos partiram de Bali para Nusa Lembongan, Lombok e Sumbawa, onde pegamos um swell de 6 a 12 pés. Super Socks funcionou perfeito. Considerado por muitos o melhor tubo da Indonésia, as ondas pesadas podiam quebrar por até 150 metros.
As esquerda grandes e fortes de Scar Reef proporcionavam uma longa e manobrável parede com várias seções de tubo que acabavam no canal. Não resisti em encarar o desafio de surfar no maior dia e acabei quebrando minha prancha ao meio. Só o fato de não ter me machucado me encorajou a treinar bastante para a próxima temporada. No barco, vibrava com a galera que, sem dúvida, surfava as melhores ondas da vida.
Fizemos doações nas vilas mulçumanas Banco Banco e Gili. Quando os barcos chegavam à praia de Gili, o local gritava: "Surfing The Nations vocês são bem vindos na minha ilha". Eles são muito gratos pelas doações que recebem todo ano da STN.
Além das altas ondas, não perdi a oportunidade de mergulhar de cilindro nas famosas águas claras da Indonésia. Diferentes cores e formas de corais, faziam uma combinação perfeita com a grande variedade de espécies e tamanhos de peixes. O que me faz crer que, podemos descobrir mais sobre o Criador, se observamos melhor os detalhes da sua criação.
Agradeço o apoio das pranchas Sea Water e das quilhas Control Fins. Informações para embarcar nas "trips" com a Surfing The Nations pelo site Surfingthenations.com ou meu e-mail samiamore@yahoo.com.br.