O big surf na remada está em alta. Mais do que nunca, as gunzeiras seguem seus trilhos. A temporada havaiana de 2013 / 2014 acaba de começar. No último inverno, vi apenas seus foguetes, seus Cadilacs desfilando pelo North Shore, embaixo dos braços e dos pés de muitos big riders, uns renomados, outros não. Assim como eu, muitos praticantes são fãs das “Vicenteiras”.
Jorge Vicente está vivendo novamente no Brasil. De Florianópolis estão saindo suas obras de arte shapeadas à mão. “Para mim, Floripa é o Hawaii brasileiro, a capital do surf”, relata. E foi da esquina das “Rendeiras”, na avenida Osni Ortiga, que saiu para o North Shore de Oahu, em 1984. Ia para a Califórnia para pegar experiência na fabricação de pranchas, mas acabou no Hawaii, onde logo fez amizade com Mark Foo e Marvin Foster, renomados big riders já falecidos.
Vicente foi responsável por muitos foguetes de Pancho Sullivan, e também uma peça importantíssima nas conquistas dos títulos mundiais de Derek Ho e Sunny Garcia, em 93 e 2000, respectivamente, se não me falha a memória.
Logo que retornou das ilhas, Jorge destinou seu tempo ao sul com seu filho Gabriel Vicente, que herdou do pai a arte dos shapes. Atualmente, vem trabalhando ao lado de outra fera com bagagem também no North Shore, Havenga, e com Ricardinho, da Hot Glass. Todos no eixo Barra da Lagoa e Joaca.
Durante muito tempo, fiz minhas pranchas no Hawaii com Jorge. Em duas das minhas melhores ondas filmadas e fotografadas, estou justamente com seus shapes. Uma foi capa do filme Fabio Fabuloso, uma 9 pés verdinha na qual apareço dropando uma rampa em Sunset. Já uma 7 pés amarela-limão foi responsável pela onda da minha vida, em Teahupoo, no ano de 2002.
Separado, teve com sua ex-esposa dois filhos havaianos e ótimos surfistas. O mais velho, goofy, é o Brandon, e o regular, mais arisco e promissor, chama-se Austin, presença constante nos line ups de Haleiwa, Pipe, Off-The-Wall e Backdoor.
Com certeza, Jorge Vicente tem muitas histórias pra contar, mas lembro de uma cômica passagem na qual estava ao seu lado. Em um dos últimos eventos em que participei em Sunset, estava escalado na primeira bateria, e na ocasião não havia encontrado amigos para me servir de “cadie”, ou seja, levar minha prancha reserva ao outside em caso de necessidade. Naquele momento, as duas pranchas do meu quiver eram shapeadas por Jorge – uma 7’6 e uma 7’10.
O mar vinha subindo e apresentava-se com séries de 6 a 8 pés de norte / oeste. A essa altura, Vicente já não surfava diariamente, logo estava um pouco fora de forma, o que o fez tentar fugir de minha solicitação. Tranquilizei dizendo que ele não iria ter que nadar no canal de Sunset, pois eu não iria perder minha prancha e aquilo era mais pra eu ter uma segurança.
Resultado: na primeira bateria, o mar aumentou, e em minha segunda onda quebrei a 7’10. A cena foi cômica, pois o jet-ski de apoio havia ido buscar algum fotógrafo no inside. Quanto mais eu remava pra pegar a minha prancha reserva, ele remava pra longe, pois não queria de forma alguma ficar nadando naquele canal. Eu não sabia se ria ou se entrava em desespero, pois os minutos estavam passando e eu precisava voltar para a bateria. Mas o jet voltou, consegui “arrancar” minha prancha reserva das mão do Vicente e, no fim, avancei para a fase seguinte. Na areia, demos muitas risadas do episódio.
Os brasileiros estão em crescente ascensão nas ondas. Na confecção de pranchas, também temos muitos feras. Xanadu, Marcio Zouvi e Ricardo Martins, por exemplo, são bastante requisitados. A lista de shapers é enorme e fica até injusto citar poucos nomes, mas com certeza, em se tratando de “gunzeiras”, Vicente é o cara!