O futuro do Brasil

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#O carioca Pedro Henrique, de 18 anos, nunca havia estado no Hawaii até participar do Billabong Junior World Championship, evento da ASP (Association of Surfing Professionals) considerado o WCT para surfistas com até 21 anos, encerrado no dia 7 de novembro, em Makaha. Pedrinho também não participou da primeira seletiva que definiria o time brasileiro para esse evento, realizada em Pernambuco no início do ano. Já na segunda, ele não só correu como foi o grande campeão, mas mesmo assim não conseguiu a vaga, ficando na lista de espera. Tudo indicava que ele ainda não iria para o Hawaii, mas a desistência de dois competidores, Paulo Moura e Marco Polo, colocaram Pedrinho na disputa. Mesmo estando mais preocupado em pegar boas ondas e ganhar experiência nas ilhas, ele arrebentou no campeonato e venceu os principais nomes da nova geração, como o português Tiago Pires, os havaianos Jamie O´Brien e Jason Shibata e os australianos Joel Parkinson e James Noble, para conquistar o título de campeão mundial na categoria Junior.
Nessa entrevista exclusiva para o site Waves, feita pelas repórteres Nancy Geringer e Camila Menezes, Pedrinho contou como foi o campeonato e como se sente sendo o primeiro campeão mundial brasileiro do WCT.

Nancy – Como foi o seu desempenho nas seletivas do Billabong Pro/Júnior realizadas no Brasil?
A primeira seletiva, em Pernambuco, eu não corri. A segunda, que foi realizada no Posto 5 da Barra (da Tijuca, RJ), eu venci. Consegui, então, a vaga de segundo alternate para participar do campeonato no Hawaii, com a desistência do Paulo Moura.

Camila – Como você recebeu a notícia de que tinha conquistado a vaga?
Assim que eu venci, o Maradei (Fábio) chegou pra mim e falou: “Olha, você tem chances, mas ficou em oitavo, você vai ser o segundo alternate”. E eu pensei: “Pô, vão ter que faltar dois, maior oportunidade irada, os caras não vão deixar, né?!” Acabou que o Marco Polo já disse de cara que não ia, e faltava um só pra mim e eu pensei que de repente daria, se um faltou o outro falta também… E eu fiquei esperando o Paulo Moura decidir. Aí ele disse que ia e eu fiquei meio desanimado e desisti. No WCT, no último dia que tinha que dizer, o Paulo Moura disse que não ia porque ia disputar o WQS. Aí meu técnico ficou sabendo, foi me falar e eu fiquei amarradão, já tava tudo no esquema, tudo pronto caso rolasse essa desistência.

#Nancy – Você fez algum tipo de preparação para esse evento no Hawai? O que essa vitória significou na sua carreira?
Ganhar não era a minha maior preocupação. Queria pegar boas ondas, fui passando as baterias e acabei vencendo o campeonato. Essa vitória serviu mais como um incentivo. Isso porque na realidade fui para treinar, melhorar minhas condições físicas e com os meus patrocinadores. A calma foi a minha maior aliada.

Camila – Quais eram suas expectativas antes do evento?
Eu nunca tinha ido pro Hawaii e lá é aquela coisa que todo mundo fala: “Você vai pro Hawaii, vai pegar onda grande e tal…”. Todo mundo tem aquele medo do Hawaii, na verdade eu queria ir, mas não estava muito preocupado com o campeonato. O campeonato era uma forma de eu ir pro Hawaii, de conhecer um lugar que eu sempre tive vontade. Quando eu cheguei lá fiquei deslumbrado com o pico, com as ondas, com tudo e só queria saber de pegar onda boa, esperar o “Céu” chegar pra ver como é Sunset grande e tal. Então o campeonato rolou no domingo, em Makaha. Eu fui pro campeonato sem preocupação nenhuma, tipo ‘vou correr o campeonato, legal’, mas estava doido pra ir pro North Shore ver Sunset, que já tava rolando com 8 pés. Aí eu tava no campeonato, mas com a cabeça no North Shore, querendo ver o swell de dez pés que tava dando lá. Então eu competi com calma, tranqüilidade, se perder, perdeu, se ganhar, ganhou. Mas lógico que tentando buscar as ondas certas, as ondas boas, porque tava difícil o mar. Eu achei o mar muito difícil de competir. E eu consegui perceber nas primeiras baterias onde eram as ondas boas e onde eram as ruins, quais eram as ondas high score, quais eram as ondas médias. Então isso foi legal, porque eu fiz uma tática que deu pra entrar, pegar as ondas boas e mostrar o surf.

#Nancy – Você derrotou os favoritos da nova geração. Qual foi o segredo para superar esses caras?
Procurei usar a mesma tática durante todo o campeonato. Era muito difícil pegar uma onda e completá-la perfeitamente.

Nancy – E qual foi essa tática?
Como o mar estava muito difícil, com as ondas quebrando muito longe, decidi que pegaria as três primeiras ondas rapidamente no pico que estava quebrando mais à frente, na beira. Depois de garantir essas três notas, remava para o outro pico, que ficava mais atrás, e pegava ondas melhores para tentar trocar pelas notas anteriores.

Camila – Qual foi o seu adversário mais difícil?
A bateria mais difícil que eu corri foi nas quartas de final, contra o James Noble, o Jason Shibata e o Craig Wilson. Essa bateria foi muito disputada, no início eu me perdi um pouco, não consegui pegar as ondas boas, peguei duas boas e ficou faltando uma. No finalzinho, o Jason Shibata precisava de um cinco, eu peguei uma onda e aumentei um pouquinho. Aí ele veio na onda de trás, deu uma batida, deu outra batida e a onda morreu, acabou, uma onda que parecia ser alucinante de repente sumiu. Aí ele tirou 4,5 e eu passei a bateria em segundo, por meio ponto. Foi aí que eu vi que dava. Já era semi-final, tranqüilidade total, eu já tava ali e já tava bom pra caramba. Aí eu pensei: “Vou entrar, pegar as ondas e se passar, passei, se não passar, não passei, tá legal também, fiz meu máximo”. Aí eu fui pra semi e a minha tática era bem diferente da do Joel Parkinson. Ele foi lá pra fora como a maioria dos competidores. E os únicos que eu vi fazendo a minha tática, que era pegar a onda no meio, pegar três ondas rápidas, foi o Tiago Pires, o Jason Shibata e eu. Acabou que o Parkinson se deu mal, porque no início, ele tomou as três séries que entraram na cabeça e eu peguei. E foram três ondas boas minhas. Aí complicou um pouco, ele não conseguiu se encontrar e acabou perdendo.

Nancy – Quando você sentiu que havia ganhado o campeonato?
Todos na bateria final estavam quebrando. O Tiago Pires era o que estava melhor. Eu sabia que tinha três ondas boas, mas como o pico era muito longe e eu não escutava nada do que o locutor dizia, só fui saber quando acabou, meus amigos na areia já estavam comemorando. Não acreditei…

Camila – E como é que isso funcionou na sua cabeça?
Acho que na verdade nenhum dos brasileiros era favorito. Acho que eles não esperavam nem que eu passasse das quartas de final. Mas isso não me afetou em nada, eu vi como mais uma etapa, vou surfar normal como eu sempre surfo. E quando eu venci foi como um susto, era uma coisa que não estava nos meus planos de início de ano. Fiquei meio sem reação, fiquei amarradão, mas sem reação. Os caras até perguntaram se eu não ia chorar e eu não tinha reação, não sabia o que iria fazer. E na verdade eu não sabia a repercussão que isso ia ter aqui no Brasil, eu não sabia que ia ser um negócio tão grande assim. Aí eu liguei pra contar pra minha mãe e ela já sabia, falou que tinha saído em todos os jornais, começou a chorar… Mas foi só quando eu cheguei aqui no Brasil que eu fui perceber a importância, quando vi os jornais e vi a repercussão. Na verdade eu até fiquei meio assustado, nunca tinha acontecido isso comigo de sair em tudo, ser o centro das atenções. Assusta um pouco, você tem que ter uma cabeça legal pra continuar sendo a mesma pessoa, continuar batalhando, saber que ainda tem muita coisa pra conquistar. E minha família foi fundamental. Minha mãe e meu pai estão me dando a maior força e eu estou conseguindo me equilibrar bem pra isso
Nancy – Quem faz as suas pranchas e qual o quiver que você usou nesses dias de competição e free-surf no Hawaii?
Há algum tempo realizo um trabalho com o Joca Secco. Gostei desde a primeira prancha e estamos procurando sempre melhorar alguma coisa. O quiver que usei no Hawai foi uma 6’6, uma 6’0, uma 5’11 e duas 5’8. Ganhei com a 5’11, que já não existe mais.

#Camila – Há quanto tempo você está ralando nas competições?
Comecei a competir em 96. Tive resultados separados, ganhava uma etapa do brasileiro amador, fazia umas quartas de final, mas nunca fechava um ranking em primeiro. Fiz um segundo lugar no ranking do estadual como júnior, mas sempre foi essa luta aí. Quando me profissionalizei, no meio do ano, foi a maior batalha, foi difícil pra caramba, eu não tava conseguindo ter um resultado muito expressivo. Mas não parei, continuei batalhando. Aí veio esse campeonato na Barra, eu consegui vencer, consegui me classificar, fui pra lá sem muita preocupação e acabei vencendo.

Camila – Você sempre teve a determinação de ser um surfista profissional?
Desde que eu comecei a competir, o meu sonho, acho que o sonho de todo atleta quando começa, é chegar no WCT. Eu sempre tive isso na minha cabeça, que eu ia virar um profissional. E eu queria ser um profissional bom, que ia ter que treinar muito, batalhar muito. Eu acho que se desde o início você pensar assim, se esforçar, batalhar e treinar bastante, você consegue chagar lá. Mesmo que demore um pouco.

Nancy – Como você descreve o seu estilo de surf?
Busco sempre a harmonia. Gosto de fazer a onda direito, com bastante velocidade.

Camila – Como você avalia a evolução do seu surf?
Desde que eu comecei, sempre fui melhorando de pouquinho em pouquinho. Acho que quando eu comecei a ir pra Saquarema para treinar e evoluir, eu senti uma melhora muito grande. Eu consegui melhorar minha linha de onda, mas sempre surfei mais ou menos no mesmo nível, não foi uma coisa que eu melhorei do nada. O que eu consegui melhorar bastante em competição foi a minha tática. Treinando com o Eduardo Resende, a gente conseguiu melhorar tudo isso.

Camila – A que se deve essa melhora, na sua opinião?
Acho que não é uma coisa que eu tenha que agradecer a uma pessoa só. Por exemplo, o Rick (Werneck) sempre acreditou em mim desde que comecei. Logo no começo também tinha o Eduardo Gonçalves, do Colégio Paula Bastos, e se não fosse ele eu não ia ter toda essa força que eu tenho. A minha família, minha mãe que me botou pra competir o primeiro campeonato, meu pai que me ensinou a surfar. Então eu acho que é um conjunto. Pranchas boas também ajudam a evoluir. O técnico ser forte e não deixar cair também. Tudo isso é que faz com que a gente consiga um bom resultado no final.

Nancy – Você se inspira em alguém para criar seu próprio estilo?
Gosto muito do Slater (Kelly), Kalani (Robb) e Shane Dorian. Cada um tem uma característica própria muito legal. Entre os brasileiros o Vitinho (Ribas) e o Fábio Gouveia são os melhores.

Nancy – E entre os surfistas da nova geração, quem arrepia na sua opinião?
O Raoni (Monteiro) e o Léo Neves, que tem um surf radical irado.

Nancy – Em quais praias você costuma treinar?
Quando não estou no Leblon, onde moro, surfo na Barra, Ipanema ou em Saquarema. Me amarro em cair no Pontão do Leblon ou em Ipanema, onda bem tubular, buraco, mais pressão.

#Nancy – Em quais lugares do mundo você já surfou?
Em Bali, quando fui correr o Mundialito, na Austrália em outro Mundialito e agora no Hawaii.

Nancy – O que você achou dessa sua primeira viagem ao Hawaii, tirando a conquista do título?
Foi ótimo ver ondas muito boas abrindo! Mas não fiquei muito tempo. Para conhecer tudo melhor tenho que ficar muito mais tempo e surfar em todas as condições de mar.

Nancy – Quais são seus patrocinadores?
HD, Extreme-Rider, Veltra e K-acessórios.

Nancy – Tem alguma viagem em vista para o final desse ano?
Talvez faça alguma rapidamente ainda este ano. Provavelmente, em fevereiro, vou para o México.

Nancy – Quais são as suas expectativas para 2001?
Virei profissional no meio deste ano. Em 2001, pretendo correr algumas etapas do WQS e as etapas do Super Trials, visando uma vaga no Super Surf.

Camila – Pedro, esse é o primeiro e eu quero saber se daqui pra frente é o WQS e WCT.
Se Deus quiser. O objetivo, o sonho, sempre foi chegar no WCT, e eu acho que esse campeonato foi um incentivo pra mostrar que se a gente continuar treinando, continuar batalhando, com mais força, a gente consegue chegar lá. E daqui pra frente, ano que vem, é batalhar pro WQS, correr pra pegar experiência. Eu tenho o maior apoio do meu patrocinador, a Hawaiian Dreams (HD). Ele quer mesmo que eu vá pra pegar experiência, sem cobrança de resultado. E eu acho que isso é super importante. Sem a cobrança do patrocinador você vai muito mais tranqüilo e aprende muito mais. É assim que eu acho que, no outro ano, com mais base e mais preparo, eu tenho grandes chances de entrar pro WCT.

Nancy – Você tem algum recado para a galera?
Até a minha vitória no Billabong Junior World Championship, esse não estava sendo um ano muito bom para mim. Não conseguia bons resultados… A vitória serviu para me mostrar que nunca devemos desistir. Temos sempre que insistir, porque uma hora a recompensa chega.