O sonho de habitar uma ilha com ondas perfeitas está na cabeça de quase todos os surfistas do mundo. Foto: Daniel Arena/Liquid Trips. |
Ele morava na capital, aliás, a maior de seu país, milhões de pessoas amontoadas nos ônibus, a luta pela vida, a labuta do dia-a-dia. A cor da cidade era cinza e os sons da loucura do homem estavam em cada esquina.
E assim Johnny foi crescendo e aprendendo a amar o seu sonho. Cada período de férias escolares era ansiosamente aguardado, pois sua família ia para o litoral. E o garoto de um pouco menos de uma dezena de anos foi crescendo e, com ele, seu sonho.
Agora, já adolescente, com longos cabelos loiros, descalço, com os pés na areia e sua prancha, mirava para o horizonte, esperando o sol nascer. Ele era um cara de muitas amizades, mas no fundo um sujeito reservado em seus sentimentos. Ali naquele ambiente, ele se sentia à vontade para ser ele mesmo.
Quantas vezes Johnny madrugou para surfar. Ele podia falar até sozinho, talvez conversar com seu inconsciente, falar com Deus. Sim, ele tinha uma busca espiritual e os elementos desta força se encontravam bem diante dele, ou pelo menos ele assim acreditava.
Seu plano era fazer do surf, do mar, do contato com a natureza seu estilo de vida. Talvez comprar um barco e dar a volta ao mundo. Enquanto isto não acontecia, ele voltava-se cada vez mais para seu mundo interior.
Os conflitos em casa apareceram, afinal Johnny queria tomar rumos diferentes daqueles inicialmente imaginado por seus pais. Parecia mesmo aquele conflito de gerações. O que era importante para a família e a sociedade não importava para ele, e seu modo de pensar e agir os chocava.
Muitas vezes, a ocupação desenfreada do homem pode causar danos irreparáveis aos tesouros da natureza. Foto: Sebastian Imizcoz. |
Um certo dia, as coisas mudaram para Johnny. Ele acabou por receber uma herança.
Inicialmente ficou sem ação, mas logo seu sonho o impulsionou. Resolvera arrendar uma ilha num arquipélago onde, numa de suas viagens, havia surfado as melhores ondas da sua vida. Os nativos eram amigos, o clima agradável e as ondas, nem se fala!
Começou seu surf camp com alguns bangalôs, muita disposição e vivendo sua paixão. Logo seus amigos e conhecidos começaram a freqüentar seu pequeno paraíso. Aliás, era este o nome do camp: Paraíso de Johnny.
A imagem da cidade em que nascera era apenas uma lembrança e seus familiares o viam de vez em quando. Na ilha, cada amanhecer era um renovo, afinal suas esperanças estavam ali depositadas. Os anos se passaram e Johnny agora era um adulto, mas que se sentia de certa forma como uma criança.
O que Johnny não esperava eram os fatos que viriam a acontecer. O arquipélago começava a enfrentar sérias crises. Na verdade, Johnny esquecera que vivia no mundo e ele chegara até ali. Muitas pessoas já lotavam os points da ilha, a gritaria e discussão chegaram. Os nativos se dobraram ao deus dinheiro e a poluição tomou conta de tudo.
Eram tantos os pontos de deterioração que Johnny começou a se desesperar, a ver tudo indo literalmente por água a baixo. Nem mais aquela gostosa sensação dos pés descalços na areia o fazia se sentir feliz. Johnny havia crescido e seus valores foram mudados. Muitas pessoas já lhe tinham decepcionado, enganado.
Ele começava a ver as coisas diferentes. Será que aquilo realmente o preenchia? Será que Johnny havia se enganado achando anos atrás que aquilo era a razão de sua vida, mas não era mais? Sua mente vagou por lugares áridos e Johnny começou a perder de vista seu sonho.
Vencido o tempo em que arrendara a ilha, Johnny tinha que tomar uma decisão. Ele sabia que era algo que mudaria sua vida. O dinheiro falou mais alto e os nativos já obcecados pela ganância, receberam uma proposta muito maior e promessas de muitos negócio$.
Seu mundo caiu. Johnny chorou amargamente sua desilusão.
Olhando para o céu, refletiu sobre sua vida, suas escolhas, e viu que dentro dele existia então algo muito maior que seus sonhos; a convicção de um sentido para a vida. Ele nunca se sentira tão perto do vazio. Mas sabia no seu interior que Deus estava com ele e isto não era um sonho de garoto, mas uma realidade no seu espírito. Algo que nada nem ninguém poderia tirar dele.
Johnny acabou por arrendar uma outra ilha no mesmo arquipélago, as ondas eram melhores ainda, mais perfeitas, os nativos amigos e sinceros. Ele constituiu família e prosperou, mas algo muito importante aprendera na jornada da vida, que independente das circunstâncias, sua relação com Deus estava ainda mais forte e seu sonho continuava vivo.
Não o sonho do pequeno Johnny, mas agora de um homem que aprendera a não se iludir e se refugiar no seu interior, uma pessoa disposta a enfrentar os problemas de frente como uma série que às vezes a vida apresenta, uma onda fechando a baía, aparentemente sem chances.
Sua fé o fazia crer no impossível, e isto mudou a maneira dele ver o mundo e as pessoas…