Passado, presente e futuro do North Shore

Damien Hobgood durante as semifinais do Pipe Masters 2001

Visual do North Shore de Oahu, Hawaii. Foto: Ricardo Macario.
O sonho de grande parte dos surfistas é um dia poder curtir o visual translúcido das águas do North Shore de Oahu, Hawaii.


Durante um bate papo com representantes de diferentes gerações na Surf & Beach Show 2004, cheguei à conclusão que infelizmente o local ficou extremamente agressivo e hostil nos últimos três anos.


Nos anos 70, a galera começou a deslizar na onda mais tubular daquele trecho de cerca de quatro quilômetros, Pipeline. Essa onda particularmente carrega grande parte de toda a energia que circula no local. É a onda mais tubular e mais almejada pela tribo.

 

Brasileiros e havaianos treinam jiu-jitsu na academia North Shore. Foto: Bruno Lemos / Hawaii Surf Pix.

Segundo o paulista e local do Guarujá Fabrício, frequentador do pico nos anos 70, os dias de maior crowd tinham cerca de dez pessoas dividindo o line-up. Quem remasse pegava onda. As brigas não eram constantes, porém existiam.


Nos anos 80, o número de pessoas no outside pelo menos duplicou, e nos 90 triplicou. No ano passado chegaram a contar 50 cabeças nos cerca de dez metros quadrados que definem a “pista de lançamento” de Pipe.


Uma declaração interessante de Carlos Burle define bem o conteúdo desse artigo. “Nas minhas primeiras temporadas eu disputava as ondas da série, alguns anos depois eu disputava as que sobravam. Depois comecei a pegar ondas fechando mesmo, só para me divertir e fazer umas fotos. Agora nem onda fechando sobra. Mas, é claro que com muita sorte você ainda pode pegar uma boa…”, desabafou o pernambucano.

 

As esquerdas de Pipeline são palco de shows de surfe e de batalhas entre locais e haoles por um espaço no line-up. Foto: Juninho.
Cheguei na última temporada bem cedo, no meio de outubro, e aproveitei os primeiros swells que bateram no lado norte da ilha. A minha primeira temporada foi em 1993 e, com dez temporadas nas costas, já fiz algumas amizades e pude desfrutar de dois Backdoors/Off the Wall, sendo o único brasileiro na água e dividindo as ondas somente com os locais.


Por falar em localismo, ele piorou e muito nos últimos três anos. O brasileiro vem tomando do próprio veneno. Na década de 90, os brasileiros começaram a  ensinar jiu-jitsu para os havaianos, e hoje eles estão graduados e unidos. Unidos mesmo. Igual aos anos 80, quando os “black trunks” pagavam US$ 100 por cada soco dado em um brasileiro.


Naqueles anos, enquanto a “arte leve” era apenas curiosidade, respeito e um talento somente praticado pelos brazucas, as coisas ficaram mais leves para os tupiniquins. Um apagado aqui e outro ali criava um clima de respeito.


Hoje, brasileiros dividem o mesmo tatame no North Shore, mas mesmo assim o sangue quente que corre nas veias dos brasileiros também passa na dos havaianos e o negócio pega fogo.

 

Inclusive, na última temporada na Indonésia uma briga feia envolvendo o havaiano Braden Dias e seus amigos e alguns brasileiros deve esquentar ainda mais o clima para a próxima temporada havaiana.

 

Existe o outro lado da moeda também, pois os havaianos são obrigados a aguentar todos os anos surfistas de todos os lugares do globo invadindo as ilhas. Acredito que se o Hawaii fosse no Brasil seria pior ainda…


Os surfistas profissionais cansaram de reclamar que não conseguem treinar nos picos mais famosos do Hawaii. Por um outro lado em Sunset, Waimea, Laniakea, Rocky Point sempre cabe mais um. É muita onda e o line up é bem espaçoso.

 

Agora imaginem para os simples mortais que somente sonham em um drop em Pipeline? Rezem bastante e sigam o meu conselho. Os meses de outubro, fevereiro e março são mais amenos e vocês terão mais chances de realizar seus sonhos.


Nesses últimos anos passei cada vez mais tempo na ilha de Maui e, graças a Deus, o tow-in e o kitesurf tem me mantido nas águas mais “calmas” da ilha vizinha. No Kauai o clima também é tenso dentro d’água, mas existem ótimos picos alternativos.


O que será do North Shore na próxima década, especialmente em picos como Pipeline/Backdoor? Bons tempos aqueles do Fabrício…

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