Trip baiana

Prazeres do México

Marlos Viana8, Puerto Escondido, México

Marlos Viana prestes a passar por dentro de Zicatela, México. Foto: Arquivo pessoal.
Afrânio Modesto de olho no salão verde. Foto: Arquivo Pessoal.

Havia acabado de chegar de uma snow trip para Utah, Estados Unidos, durante o carnaval, quando alguns amigos começaram a me pilhar, dizendo que já haviam fechado a viagem para o México para o final de maio.


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Afrânio Modesto, Alessandro Bonaspetti, Lucas Brito, Márcio Viana, Sérgio Melo, o fotófrafo Tom Almeida, entre outros, faziam parte do grupo de baianos que decidiu pegar as ondas mexicanas no mês mais constante de todo o ano.  

Quando faltava pouco mais de um mês para a galera viajar, comecei a pensar seriamente a respeito e também a me movimentar. A essa altura, a galera já estava emanando aquela vibe que rola antes das trips.

Todo mundo compartilhando fotos e vídeos das ondas da região, acompanhando previsão, já mostrando fotos do quiver (conjunto das pranchas), entre outras coisas.

E, para abalar ainda mais minha cabeça, Salvador era assolada pelo maior período sem ondas que me vem à memória. Não tive muita opção, tinha que me jogar.
 
Inicialmente, minha intenção era ir no dia 27 de maio, acompanhado do meu irmão Márcio, de Afrânio e da sua esposa Joana. Como estava em cima da hora, só consegui passagem com preço bom para o dia 21. Acabou sendo legal também porque chegaria junto com Alessandro Bonaspetti, “local” de Vilas do Atlântico, e Rafael JJ, bodyboarder faixa-preta que viria a conhecer no aeroporto da Cidade do México.

Depois de 24 horas de viagem, passando por três aeroportos internacionais, finalmente chegava ao minúsculo aeroporto de Puerto Escondido. Quando desci do avião, senti um enorme baque com o calor que fazia. Tinha pelo menos uns 43 graus. Estava beirando o insuportável.

Eram duas horas da tarde e ainda estava na expectativa de fazer o surf no final de tarde, ou melhor, no início da noite, já que anoitecia às 20:30 horas.

Bonaspetti, que havia passado 20 dias no México no ano passado, sugeriu o Beach Hotel Inês como hospedagem. O hotel fica na praia de Zicatela, exatamente em frente à torre principal dos salva-vidas, entre o pico das direitas e das esquerdas, conhecido como Mex Pipe.

O preço certamente não era dos melhores, mas as instalações, o excelente rango e, principalmente, o ar-condicionado nos quartos, eram os seus principais atrativos.  

Tom Almeida, grande conhecedor das ondas mexicanas, já estava em Puerto há algumas semanas e nos fez companhia durante o almoço. Ele conseguiu transmitir um pouco da energia e da tensão que rolaram durante um swell potente na semana anterior.
 
Dia D em Zicatela No sábado, dia 2 de julho, as ondas já amanheceram com bastante força. Diferente dos dias anteriores, o terral (vento que vem do continente para o mar) soprava forte. As maiores ondas ultrapassavam facilmente os 3 metros de face.

Surfei com uma prancha 6’9 pés, e apesar de ter feito bons tubos, sentia que era pequena. Já Afrânio fez a escolha certa ao cair com uma 8’4 para já ir se acostumando. À tarde, já era possível perceber o quanto o mar subia a cada série.

Como o vento havia virado para maral, fui a La Punta tirar umas fotos de Afrânio e de sua esposa, por sinal os únicos baianos em Puerto no momento. Fomos conhecer o centrinho, tomar umas coronas, preparar a gunzeira, etc.

Mal consegui ter três horas de sono, e às 6 da manhã no domingo, já estava de pé. Ansiedade enorme para saber como estariam as condições e, mais ainda, se daria para encarar. Ainda escuro, já estava na pousada de Afrânio fazendo a concentração.
 
Finalmente, quando chegamos à praia só acreditei no que estava à minha frente porque já havia estado no North Shore de Oahu, Hawaii. As ondas estavam enormes, ultrapassando os 6 metros de face nas séries.

Engraçado que muitas pessoas haviam me dito que, quanto maior, mais perfeito e mais fácil de dropar. Bom, acho que esse dia fugiu à regra. As ondas estavam difíceis e vários locais respeitavam bastante as condições.

Depois de tomar um baita susto logo na primeira onda que remei, fiquei bastante tempo tenso e inseguro na hora de dropar. Afrânio também ficou um bom tempo analisando, mas conseguiu pegar uma boa direita, dropando no vazio.

O gaúcho Igor Lurmetz pegou provavelmente a maior onda do dia, uma esquerda que fez um pico cabuloso, de mais de 6 metros de face. Já impaciente com a demora em pegar uma onda, consegui uma intermediária e saí inteiro.

No meu último dia de viagem, o mar permaneceu com o mesmo tamanho, sendo que o terral soprava mais forte, deixando as ondas mais tubulares e o drop ainda mais desafiador.

Como meu voo saía às 13 horas, nesse dia decidi cair com cordinha. Talvez por esse motivo, fiquei mais relaxado e decidido a catar algumas ondas da série. Ao final da sessão, tanto eu quanto Afrânio sentimos o gostinho de missão cumprida.

Depois de passarmos varias séries enormes, no último momento sentirmos aquela adrenalina, o respeito e aquela vibe que rola num mar de responsa como aquele. Assisti de camarote a alguns poucos conseguirem completar tubos gigantes e também pegamos nossas ondas com bastante humildade. Ondas realmente grandes.

 

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Alessandro Bonaspetti encara uma craca em Zicatela. Foto: Arquivo Pessoal.
Marcio Viana em ação no outside. Foto: Arquivo Pessoal.

Zicatela é a onda Ainda que tenha visto inúmeros vídeos, escutado varias histórias e analisado diversas fotos que atestam que algumas das melhores direitas do mundo estão na região de Salinas Cruz e Barra de La Cruz, ao Sul de Puerto Escondido, eram os enormes canudos de Zicatela que eu tanto desejava.  

 

 

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Queria pegar o tubo da vida, voltar a sentir aquela vibe que só um surf de respeito pode proporcionar e voltar a desafiar meus limites no surf. Uma coisa eu garanto: se é isso que você também quer, Zicatela é o lugar!
 
Os dois primeiros dias em que o mar esteve bem pequeno, pelo menos 1 metrão na série, confesso que já foram suficientes para mostrar que naquele mar não é você que está com o controle. É Zicatela!

Muitos drops atrasados, tubos perdidos e “massagem”, como costuma dizer Tom Almeida. No terceiro dia, finalmente tomei o primeiro “sossega maluco”. O mar havia subido para o que eles chamam de 4 pés (3 metrões na série). Precavido, resolvi entrar pelo canto direito e ir surfando até as famosas esquerdas.

Era muita onda se comparássemos a qualquer mar em Salvador, sem exagero. Já no outside, antes mesmo de pegar qualquer onda, veio uma grande série bem mais lá fora e a primeira me acertou em cheio. A prancha quebrou em dois pedaços que acabaram saindo por trás da onda.

Meu erro foi ter caído com a cordinha. Depois desse dia não usei mais e não parti mais nenhuma prancha. Saindo da praia, fui direto para a casa de Miguel, talvez o melhor conserto de pranchas do mundo. E 24 horas depois ele me entregou a prancha praticamente nova.

Tom Almeida já me avisava o quanto o lugar é tranquilo. Na água, sabendo chegar, você pegará suas ondas tranquilamente e, ao contrario de outros lugares onde a energia é pesada e existe pouco respeito, vários experts te incentivam a dropar e vibram quando vê você completar um bom tubo.

Espírito Aloha Tom me apresentou ao havaiano do Kauai Marco Satz. O cara é o Aloha em pessoa. 51 anos com energia e surf de garoto, pilhando toda a galera e entubando como poucos.

O legend local Angel Salinas é um entusiasta de Zicatela. Surfa os dias grandes de pranchão e de SUP. Quando não está na água, registra os melhores momentos com seu equipamento de foto e vídeo profissional.

Angel, por sinal, fornece surf reports diários de Zicatela pelo seu site Centralsurf.tv, onde sempre aparece boas fotos de toda a galera. Bom, assim como esses dois cascas-grossas, existem vários outros que são boa gente, respeitam a todos e botam pra baixo sem medo. Gary, Oscar Moncada, Selestino.
 
O pico de Zicatela é a joia do surf de Puerto Escondido. Sua praia com fundo de areia possui três quilômetros de comprimento e é surfavel em toda sua extensão. É possível destacar os principais picos de surf. Começando pelo lado direito (Noroeste), há o pico de Carmelitas, geralmente uma direita extremamente rasa, rápida e que quebra a poucos metros da praia.

Um tubo com características muito parecidas com o Backdoor de Pipeline, no Hawaii, ou seja, drope acelerando, acelere mais, um pouco mais e, se possível, um pouco mais ainda. É placa atrás de placa. Uma vez completado o tubo, você percorreu uma extensão incrível em poucos segundos.

A principal onda de Zicatela, no entanto, é a famosa esquerda localizada a algumas dezenas de metros a sudeste da torre dos salva-vidas, conhecida mundialmente como Mexican Pipeline, devido à enorme semelhança com a esquerda mais famosa do mundo, Pipeline, no Hawaii.

Quebrando mais para fora, essa esquerda forma um tubo extremamente largo, mais lento e aberto que o de Carmelitas. Nos dias grandes, a forte correnteza leva para o fundo e deixa as condições bastante perigosas. O risco de afogamento é grande e real.

Ainda mais à esquerda desse pico existe o Far Bar, uma onda bastante surfada nos dias menores. Ela quebra mais no outside, num banco de areia formado pela correnteza que sai do Mexican Pipe. As ondas, geralmente esquerdas, podem ficar bastante extensas, proporcionando mais de um tubo por onda.
 
Finalmente, no outro extremo da praia de Zicatela, existe a lindíssima praia de La Punta. Uma costeira de pedras que avança para o mar. Por isso o nome, proporcionando uma clássica formação de point break.

Excelente opção para quando as condições em Zicatela estão acima do seu limite. A onda é muito extensa e favorece a realização de todas as manobras.
 
A cidade de Puerto Puerto Escondido é uma cidade com certa de 25 mil habitantes, localizada ao sul de Acapulco, ambas pertencentes ao estado de Oaxaca. Até 1960, a cidade se resumia a um pequeno povoado de pescadores com pouco mais de 400 habitantes.

Teve um grande crescimento populacional e econômico depois da construção da Carretera 200, uma rodovia que ligou a Ciudad de Oaxaca, capital do estado, até então praticamente desconhecida. Não demorou muito para que belíssimas praias com suas águas cristalinas e quentes atraíssem os primeiros resorts e seus hóspedes.

Entre eles alguns surfistas que descobriram o enorme potencial do local, em especial a praia de Zicatela, com suas ondas de dimensões havaianas. A fama do local correu o mundo do surf e logo surfistas californianos, australianos, brasileiros, entre outros, se estabeleceram no local, impulsionando ainda mais a sua economia e seu crescimento.

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