Espêice Fia

Profissão surfista

Fábio Gouveia, Secret (SC)

Mesmo depois de abandonar as competições, Fábio Gouveia segue ativo em outras esferas do ramo. Foto: Marco Dias.
Uma delas é o mercado de pranchas. Foto: Marcio David.

Ter alguma dúvida de que o surf nos dias de hoje é um esporte de vagabundo, pelo amor de Deus, só mesmo com falta de informação e uma mente arcaica!

 

De passagem por São Paulo no mês passado, peguei um táxi para conhecer a redação do “uêivis”. Conversa vai, conversa vem, o taxista perguntou de onde eu era.

 

Disse que era paraibano e que morava no Sul. O senhor, apesar de aparentar idade, era um daqueles pouzudos. Resumindo, uma marra danada.

Na cidade em que aprendi a surfar, pode não ter onda de qualidade, aliás, é perfeito para se aprender, mas depois fica mais complicado seguir carreira no esporte, pois outras ondas entram no cardápio de necessidades.

Se as ondas são fracas João Pessoa bomba, por exemplo, para o kitesurf e velejo em geral. E suas praias são belas, povo acolhedor, excelente culinária, etc. A citação vem porque o senhor, já de certa forma viajado, conheceu a cidade e me deixou triste ao dizer que o pôr-do-sol na praia fluvial do Jacaré ao som do Bolero de Ravel, não era lá estas coisas.

Não retruquei, claro, cada um tem direito de gostar ou não das coisas. Direito de gostar ou não da natureza e de um belo pôr-do-sol. Mas, em meu interior pensei: “acho que esse senhor devia estar amargurado com alguma coisa, pois aquele visual de fim de tarde é magnífico!”.

Trânsito embaçado na avenida 23 de Maio (uma das mais importantes da capital paulista) e o senhor seguia com as perguntas. Em que você trabalha? “Sou Surfista Profissional”, respondi com muita convicção. “Vagabundo de praia?”, perguntou ironicamente. “Não senhor, Surfista Profissional”, respondi mais uma vez.

Mesmo vendo que aquilo havia sido uma piada de mau gosto e de uma falta de educação tremenda com o passageiro, logo saí explicando como eram os fatos nos dias de hoje, aliás, como já vêm sendo há mais de 20 anos.

O surf há muito tempo tem um apelo em muitas mídias, em muitas propagandas de marcas. Muitas empresas fora do ramo e muitas instituições, já usaram e usam o surf como meio de divulgação de seus produtos e ideais.

Expliquei que recentemente havia parado de competir profissionalmente, mas que o trabalho seguia em outras esferas do ramo. O surf foi reconhecido pelo CND (Conselho Nacional de Desportos) desde o ano de 87.

 

Ano em que o surf também organizou-se e teve seus primeiros circuitos genuinamente brasileiros, Amador e Profissional. O orgão foi extinto em 1993, dando lugar ao COB (Comitê Olímpico Brasileiro), do qual a CBS (Confederação Brasileira de Surf) é filiada. Porém, a profissão do surfista ainda hoje não existe, apesar de tudo o que engloba o mesmo e, principalmente, a movimentação financeira.

Os atletas mais organizados em geral têm suas empresas de prestação de serviços, ou seja, todos autônomos e emitem notas para se adequar a lei e receber seus salários, etc. Quem é competidor, free surfer, big e tow in rider, longboarder, etc, segue a risca uma cartilha que o próprio mercado e esporte desenvolveu.

 

Para estar em destaque e ter reconhecimento no trabalho, jamais pode-se estar vagabundando na praia. Aliás, aquele profissional que estiver “vagabundando” na praia, teoricamente seria o cara que mais estaria afiado nas ondas, ou seja, seria o cara mais psico por treinos.

Como sabemos que não é desta forma, pois trabalhos extras são mais que necessários, os que querem se sobressair dos demais trabalham duro, têm uma vida bastante movimentada.

Cada vez mais, o surf mesmo com sua áurea nostálgica, segue para ter atletas de alta performance com bastante trabalhos físicos diferenciados, acompanhamentos de profissionais de outras áreas como: psicologia e medicina esportiva em geral, onde entram nutricionistas, etc. O extra fora d’água vem carregado da obrigação da boa postura em geral, pois carrega-se a bandeira das empresas patrocinadoras e as cláusulas contratuais são severas para com os deslizes.

Na profissão, exige-se um trabalho em parceria com o setor de marketing e muitas vezes criação. Hoje, nos tempos de internet, o atleta tem quase que por uma obrigação fazer um trabalho a parte de divulgação de sua imagem, seja em um blog, twitter ou “livro-fucinhos” (facebook).

Muitos já editam e disponibilizam seus próprios vídeos de surf e procuram cada vez mais acharem formas de divulgar suas imagens e a imagem de seus patrocinadores. Então, entre estas e outras coisas, expliquei por baixo o que fazia um surfista profissional, que ao longo daquele engarrafamento, fez o senhor refletir e se desculpar ao final do trajeto.

Exit mobile version