SpeedFreaks

Rapper carioca solta o verbo

Rapper Speed faz show na Casa da Matriz, São Paulo (SP)

Speed utiliza a realidade das ruas nas letras de seus raps. Foto: Divulgação.

Cláudio Márcio, o Speed, é considerado um dos precursores do rap carioca, em atividade desde a década de 1990, quando fundou o grupo SpeedFreaks.

 

Suas rimas ácidas de temas macabros, descontraídos e a ótima escolha dos graves na produção das batidas faz jus ao estilo da maioria dos rappers sem capa, que ?não precisa de maquiagem?, como Speed cita em uma de suas letras.

 

A experiência como baixista, DJ e produtor musical deixa evidente a habilidade artística, além do lado criativo para fazer arte a partir da realidade das ruas.

 

Uma prova é que o próprio rapper define o estilo brincalhão como uma forma leve de lidar com assuntos pesados do cotidiano.

 

Speed passou pelo Planet Hemp, formado por Marcelo D2, Bnegão e Black Alien, tocando em shows da ?Hemp Family?, como eram chamados os integrantes e aliados da banda.

 

Ao lado de Black Alien e o guitarrista Digão, do Raimundos, participou da música ?Punk´n Bass? da trilha sonora do filme ?Surf Adventures ? O Filme?, de 2001. Speed foi reconhecido pela crítica musical com o lançamento de Expresso em 2002, seu primeiro disco solo, apontado como ?o melhor disco de rap de todos os tempos?.

 

Atualmente, segue firme com o novo disco ?Meu nome é velocidade?, no qual define de uma vez por todas quem é Speed.

 

Sua música reflete uma fixação por temas sobrenaturais. Porém, o respeito por certos temas é feito por uma ótica particular do que rola nas ruas, como ele mesmo diz.

 

Artista independente, Speed não se considera criativo, mas sim observador. O rapper observa e molda as formas artísticas do jeito que melhor lhe agrada pra fazer sua música.

 

O resultado da irreverência, dinamismo, humor negro nas rimas é a principal característica do Rio de Janeiro, assim como seu próprio estilo de vida.

 

Confira a entrevista em que Speed analisa a sua tragetória, entre influências, parcerias, polêmicas e novidades.


Você estudou no Colégio Estadual Liceu Nilo Peçanha em Niterói, Rio de Janeiro (RJ).

 

No colégio Liceu Nilo Peçanha todo mundo tocava na minha época. Existiam várias bandas no colégio, pessoal gostava de fazer arte e isso me influenciou muito. Era um colégio livre, o pessoal era livre e mais aberto. Os professores incentivavam projetos artísticos dentro do colégio. Isso foi importante, pois se você estudar em um colégio que é muito reprimido, você pode até fazer arte, mas sua arte vai ser influenciada por isso. No caso, estudando no Liceu Nilo Peçanha resultou nisso, na obra que eu fiz até hoje.

 

Esse contato com o saber foi o que te levou à primeira fase de criação das rimas, ou a ciência das ruas foi mais significativa no processo criativo? Como foi o início de tudo?

 

Eu comecei ouvindo rap americano na década de 1980. Mais ou menos em 1986, ouvi o primeiro disco de rap que foi do Run DMC, Ice T e nos anos 1990 o Naughty By Nature. No Brasil tinha Thaíde & Dj Hum e no começo dos anos 1990, Os Racionais Mc´s. Isso falando de influência artística. Agora, influência das ruas, eu não me baseio muito em arte pra fazer arte. Baseio-me na vida real para fazer arte. Eu observo muito a rua, sou um cara que gosta de andar na rua. O que acontece muitas vezes com o cara que fica famoso é que ele pára de andar na rua e começa a perder o contato com a realidade. Para se inspirar na rua tem que andar na rua.

 

Qual foi seu maior incentivo?

 

Incentivo pessoal não sei, várias pessoas na minha família cantam, tocam violão, apesar disso não ter diretamente a ver com rap. rap é música, mas foge um pouco às vezes. Uso minha sensibilidade de homem para fazer rap. É uma sensibilidade de observar mais o que está acontecendo na rua. Procuro ser mais escritor no caso.

 

Como o Cláudio Márcio ficou conhecido como Speed? Foi na mesma época que fundou o grupo Speed Freaks?

 

Eu sempre fiz tudo muito rápido, como diz o nome do meu disco: meu nome é velocidade. Prefiro observar, captar coisas da realidade em vez de criar um pseudônimo. Não é como se fosse um artista criado em laboratório. Eu era chamado nas ruas de Speed durante algum tempo e dessa realidade eu tive a idéia de criar o grupo SpeedFreaks.

 

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Dupla Speed e Black Alien nos anos 1990. Foto: Arquivo pessoal.

Qual é o registro histórico, principais influências da banda e componentes?

 

Nós fizemos uma fita demo, que na época não conseguimos lançar. Em 1992, eu, Black Alien e DJ Rodrigues fizemos essa fita K-7 em gravador de quatro canais de fita. Para mixar não tinha automatização, a gente mixou em seis mãos. Hoje você automatiza o sistema de produção e aquilo funciona como se fosse um robô. É uma fita lendária, uma fita histórica. Muitos artistas conhecidos têm essa fita como se fosse um marco na história do rap nacional.

 

Seu disco Expresso foi apontado pela crítica como ?Melhor Álbum de Rap Brasileiro de Todos os Tempos?.

 

Foi na Folha de S. Paulo. Esse meu disco tem participação do Rappin?Hood, Otto, Black Alien, Bnegão, Zé Gonzáles, Dj Nutz, Rodrigo Brandão e Paulo Napoli. Todos são ícones do rap nacional, por isso é um disco muito respeitado. Além de possuir batidas de minha produção.

 

A antiga ?Hemp Family? atualmente tem os integrantes com seus respectivos trabalhos e que ao mesmo tempo não alcançaram prestígio do grande público, com exceção do Marcelo D2. Como você explica esse fenômeno, já que mesmo os que não têm o trabalho tão popularizado mantêm o público fiel?

 

Você tem que contar com a sorte, contar com o seu trabalho, contar com seu talento. Todos nós temos talento até hoje.

 

E esse público continua?

 

Continua, por causa do talento. Se você tem apoio de uma mídia maior e tem a sorte de conseguir uma gravadora grande, uma major, você consegue agregar público. Aí você junta talento, sorte e o trabalho executivo de gravadora. Para mim e para todos nós não foi ruim o D2 fazer mais sucesso do que a gente, porque o sucesso faz as pessoas lembrarem-se de nós. Nada impede de nós conseguirmos isso também, porque ainda estamos em atividade, fazendo o que sempre fizemos e cada vez melhor. Artisticamente todos nós estamos melhores, inclusive ele.

 

Como você encara o fato de ser mais conhecido como cantor de rap?

 

As pessoas são conhecidas fazendo o que elas se sentem à vontade. Eu toco instrumentos, mas não me sinto tão à vontade quanto cantando rap. Raramente eu uso contra-baixo e guitarra para gravar algumas coisas nos meus raps, que para mim são importantes. Se o cara é músico, eu dou maior valor, mas na minha vida o importante é fazer meu rap e me sentir bem à vontade. Esse é o segredo. Se a pessoas não se sente à vontade fazendo o que faz, dificilmente vai alcançar o sucesso. Não só sucesso financeiro, mas também o sucesso de se sentir feliz.

 

O dinamismo foi a marca da sua parceria com Gustavo Black Alien, rendendo rimas seculares e ascensão internacional com o som ?Quem Que Caguetou (Follow Me)?, que deu origem à propaganda européia da Nissan, além do remix do DJ FatboySlim.

 

Aqui no Brasil falou-se que a música é um funk. Não é um funk. Nos Estados Unidos e na Europa, qualquer matéria que você pegar está escrito ?hip hop?. Porque é uma batida baseada no hip hop dos anos 80. Parece um pouco eletro, mais rápida, que foi da onde o funk saiu. Essa era a nossa idéia, apesar de eu ter o maior respeito pelo funk, mas não vou dizer que eu faço funk, pois eu não faço.

 

A polêmica em torno do término da dupla permanece até hoje, após mais ou menos seis anos.

 

As pessoas não se juntam à toa, têm que ter alguma afinidade. A gente tinha alguns desentendimentos. Eu sou o primeiro MC de Niterói (RJ) e um dos primeiros do Rio a fazer música com DJ. Na década de 1980 e início de 1990, havia grupos de rap no Rio de Janeiro, mas faziam com banda. Eu e Black Alien começamos a fazer com DJ, a nossa prioridade era os MC?s e o lance do show também, divertir e entreter as pessoas.

 

Entre divergências e trabalhos em conjunto, como você vê o saldo dessa parceria?


A parceria foi uma coisa natural, a gente se entende até hoje. No caso ele tomou um rumo na carreira que não é o mesmo da minha. O meu estilo de vida é um pouco diferente do dele. Eu acho que ele perdeu um pouco o humor. Ele ficou meio amargurado, eu estou achando. E eu não sou amargurado de jeito nenhum, eu posso estar numa situação perigosa na minha vida, mas eu continuo vivendo minha vida com bom humor. Black Alien é um cara ranzinza e eu acho engraçado. Por isso que existem duplas, um completa o outro e funciona. Não só artisticamente, como nos negócios também. Já tivemos empresário, mas nós fizemos tudo praticamente independente e tomávamos conta dos nossos negócios.

 

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Speed lança o disco “Meu nome não é velocidade”. Foto: Arquivo pessoal.

Também está sendo rodado o documentário ?Mr. Niterói ? O Filho Pródigo? (Máfia Filmes) que retrata a trajetória de Black Alien. Tendo em vista sua participação efetiva nessa história, você também participa do documentário?

 

Eu dei uma entrevista e falei dele, falei do passado, presente também, tudo. E fiz com o maior prazer, porque acho que Black Alien é um cara respeitado no rap e meu amigo.

 

Afinal, dá para sobreviver de rap no Brasil, mesmo sem estar inserido na indústria?

 

Eu sobrevivi por 15 anos. Eu fiz publicidade, shows, vendi disco. Na verdade o meu primeiro disco foi lançado numa gravadora em São Paulo. Não é uma major, mas é uma gravadora de rap de médio porte que vende essas coletâneas que eu já lancei na Europa e tudo mais. No Brasil, se você canta, ou faz participação com alguém, você ganha uma grana e não é sempre que eu tenho dinheiro também. Já ganhei muita grana, mas perdi muita grana também porque é o estilo de vida da pessoa. Eu não sou de economizar, acabo gastando demais.

 

Você viveu os últimos anos em São Paulo. Pode ilustrar brevemente como foi no aspecto de parcerias e de trabalho solo?

 

Últimos anos não, porque eu estou vivo ainda! Em São Paulo, fiz meu disco, esse lance todo que aconteceu na Europa da música ?Quem Que Caguetou? (Follow Me)? com vários remixes de Fatboy Slim, de Afrika Bambaataa. Participei do disco de Lúcio Maia e Nação Zumbi, fiz coisas com o Mamelo Sound System, SESC em São Paulo, toquei em vários shows com Fernandinho Beat Box e Razel, que era do The Roots. Abri show de De La Soul e Common Sense, toquei junto com o filho do Afrika Bambaataa, TC Slam, o Afu-Ra, que tinha um lance com os caras do Wu Tan Klan.

 

Que fatores implicaram na mudança, nessa temporada lá?

 

Eu me mudei porque eu cheguei em São Paulo, conheci uma mulher, casei e fiquei por lá. E em Sampa tem mais propostas de trabalho e o dinheiro é diferente do Rio, rola mais grana, consegui viver tranqüilamente durante muitos anos. Mas também gasta-se muito. Foi natural também, fui pra lá gravar meu disco em 2000 junto com o Black Alien, que não saiu por meios ortodoxos, mas saiu na Internet e tudo mais.

 

E esse foi o álbum ?Sinistro Bonde do Terror??

 

Não, isso não existe! ?Sinistro Bonde do Terror? é mentira. Isso aí foi algum palhaço que fez. O problema é dele que está divulgando meu som e eu quero que se dane!

 

Com o disco novo na pista ?Meu Nome é Velocidade? pra ser lançado, o que seu público pode esperar em matéria de som, parcerias e temas?

 

Eu fiz em 15 dias as 21 músicas. Eu compus as músicas na madrugada, três músicas por dia. Chegava no dia seguinte gravava três músicas de primeira. A produção é minha, mas tem duas batidas que são de Daniel Sydens. Tem participação de Rhossi, do Pavilhão 9, Vitor Binghi-I, Tigrão, da Aliança 21, e de Julia Blum, que fez a abertura do disco comigo. A guitarra é do Gilbert ? T e tem também o Bnegão, que passeia entre os estilos, mas que canta rap. Esse disco não foi lançado ainda, só estou esperando um selo para lançar. Então, se na hora de lançar o disco aparecerem batidas melhores, pode ser queaté entre no disco original e, no caso, por causa do outro disco de remix que eu estou fazendo, entrem outros convidados nesse disco.

 

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