Ian Gouveia

Reação fulminante

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A incrível reação de Ian Gouveia no QS começou em setembro, com o quarto lugar em Pantin, Espanha. Foto: © WSL / Masurel.

 

O segundo semestre deste ano foi incrível para Ian Gouveia, pernambucano criado em Florianópolis (SC). Com uma reação fulminante em setembro, o atleta de 24 anos ganhou força na briga por uma vaga na elite mundial e comemorou a sua classificação ao término do QS10.000 em Sunset Beach, Havaí, no último domingo.

Quando embarcou para a Europa, Ian ocupava a 70a posição no ranking do Qualifying Series e nunca havia disputado uma final no circuito.

Mas lá, tudo mudou. Foi quarto colocado no QS6.000 em Pantin, conquistou a vitória no QS6.000 em Açores, ficou em quinto no QS1.500 no Marrocos e encerrou a viagem com uma ótima terceira posição no QS10.000 em Cascais. Quando deixou a Europa, Ian já era o quarto colocado no ranking.

Na sequência, foi para a Costa Rica em busca de mais pontos no QS3.000, mas amargou o 25o lugar. Em Florianópolis (SC), obteve a nona posição no QS6.000. Na perna havaiana, o atleta foi mal em Haleiwa, ficando em 49o lugar. Já em Sunset, avançou uma bateria e melhorou a sua vantagem com a 17a colocação.

A partir daí, o pernambucano ficou na torcida para que seus adversários não o ultrapassassem. As chances de perder a vaga eram remotas, mas o suspense durou até a semifinal, quando finalmente teve a classificação confirmada.

Nesta entrevista, Ian fala sobre a emoção de chegar ao tour, a expectativa para enfrentar os tops da elite mundial, a importância da sua família e o sucesso na perna europeia do QS.

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Em Açores, o pernambucano conquistou a sua primeira vitória na WSL. Foto: © WSL / Masurel.

 
Como você recebeu a noticia de que estava garantido?

Quando eu competi no dia anterior, nas oitavas, tinha passado pelo round 3 e todo mundo estava falando que eu estava dentro, que não tinha como ficar fora. Meu irmão (Igor) mandou todos os cálculos, e a probabilidade de eu não entrar era muito pequena. No último dia do evento, perdi na primeira bateria das oitavas e fiquei tranquilo, fui pra casa relaxar. Na minha cabeça, eu já estava dentro, então fiquei numa boa, mas não falava nada pra ninguém. Só que aí, a galera que não podia passar começou a avançar e o sangue foi esquentando (risos), comecei a ficar nervoso. Veio a bateria do Filipe, e se o Frederico (Morais) avançasse, ele me ultrapassaria no ranking. Acabou que no fim não deram uma nota para o Filipe, que eu acho que merecia a virada, então comecei a cair no ranking. Fiquei tenso e fui para Pipeline surfar, pois no dia estava dando altas ondas lá. Não queria mais escutar nada, nem ver nada. Pensei comigo: ‘Os caras do CT vão dar conta do recado, né? John John, Kelly, Joel, Jordy… Os caras não vão dar mole, vão destruir’. Sunset tinha altas ondas… Aí, estava surfando em Pipe e aparece John John Florence (risos)… Falei ’não, não é possível que ele perdeu’. Eu não aguentei, fui pra casa, me tranquei sozinho no quarto e fiquei assistindo. Eu não podia acreditar que todo mundo que não podia passar, estava avançando, mas aí, no fim deu tudo certo. Na semifinal, com Frederico, Ezekiel, Jack e Tanner, havia uma combinação de resultado que se acontecesse eu já me classificava. O Ezekiel e o Jack Freestone não podiam passar juntos. Foi a bateria que me deixou mais nervoso em assistir até hoje. Quando acabou, estava trancado no quarto com a minha mulher e a minha filha. Comemorei, mas ainda sem reação. Fiquei emocionado quando a minha mãe chegou chorando. Foi uma sensação única, mas até agora a ficha não caiu.

Chegou a fazer contas?

Enquanto eu estava sozinho no quarto, ficava fazendo as contas, sim. Quem diz que está só divertindo, deixando rolar e sem fazer contas, está mentindo (risos). É impossível (risos). Foi a primeira vez que estive nessa situação e é impossível o cara não ficar fazendo conta, não olhando o ranking, as probabilidades…

Um dos concorrentes era Jessé Mendes, um dos teus melhores amigos. Torceu contra ele também?

(Risos). Não, foi tranquilo! Ele precisava fazer final para me passar. Se ele chegasse à semi, iria enfrentar uma galera que também estava na briga. As coisas complicaram para mim depois que Jadson foi pra semifinal, porque aí ele me passou no ranking. Nas quartas, eu estava torcendo pra caramba por Jessé. O que eu mais queria era ele no tour comigo, pois foi um cara que viajou comigo a vida inteira e não haveria companhia melhor. Estava certo de que nós entraríamos, mas infelizmente não deu pra ele.

Você teve uma reação incrível da Europa até o fim do ano. Teve algo especial que aconteceu de lá pra cá?

A reação que tive na Europa foi meio que inexplicável. Vinha fazendo o mesmo trabalho e acho que foi aquela coisa de sintonia. Achei o meu ponto ali na Europa, na etapa em Pantin, e foi legal porque foi na perna europeia, onde temos vários campeonatos na sequência, e consegui manter o ritmo, ser constante. O mais importante no QS, para se classificar, é ser constante. Eu não nunca havia tido nenhum resultado significante no QS e o evento em Pantin foi a minha primeira final. Foi uma virada de jogo, não sei o que aconteceu. Consegui ficar conectado durante três campeonatos e isso foi decisivo para a minha classificação.

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A terceira posição em Cascais também foi de fundamental importância para Ian. Foto: © WSL / Masurel.

 
Muitas pessoas acham que ser pai cedo atrapalha a carreira do atleta, tira o foco. Mas você cresceu de produção justamente depois do nascimento da tua filha. Qual o segredo para conseguir dar conta de tudo isso ao mesmo tempo?

As pessoas agora brincam que o segredo é fazer filho (risos). Muitas pessoas pensam que ter um filho sem ter planejado é o fim do mundo, que ser pai vai atrapalhar a carreira, mas pra mim foi muito diferente. Acredito que tenha sido um toque especial para eu amadurecer e uma alegria na vida, uma energia boa. Tudo começa a favorecer. Se estou onde estou hoje, o nascimento da minha filha ajudou muito.

Acredito que dar conta disso tudo não vai ser nenhum mistério. O meu maior exemplo é o meu pai, né? Ele viajou a vida inteira comigo e com os meus irmãos. Hoje em dia, você vê muita gente correndo o tour com a família, e não há nada mais prazeroso do que viajar o mundo inteiro, conhecer novos lugares e se divertir ao lado da família.

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Ian com a esposa Mayara e a filha Malia. Foto: Reprodução.

Teu pai pretende te acompanhar no CT?

O meu pai deve me acompanhar em algumas etapas, mas sempre competi no QS por minha conta e isso não vai mudar muito. Ele tem a vida dele, gosta de estar em casa, fazendo pranchas, já se cansou do tour, mas com certeza ele vai ficar amarradão em me ver competindo. Agora ele vai ter vontade de ir, mas vamos ver o que rola no decorrer do ano, deixar a ficha cair e só quando chegar ali perto de Snapper mesmo, na primeira etapa, veremos o que vai rolar. 

Como foi a reação de Fabinho quando viu que você estava garantido?

Pareceu a mesma reação de quando falei que ele iria ser avô (risos). Ele ficou meio sem acreditar, mas daqui a pouco a ficha cai.

Das etapas do Tour, em quais espera ter mais dificuldade e em quais acha que deve se adaptar melhor?

Talvez a que eu possa ter mais dificuldade seja Margaret, pelo fato de eu nunca ter ido e todo mundo falar que é uma onda difícil, volumosa. O campeonato também pode acontecer em The Box, uma laje com direitas. Tem o fator tubarão também, que tenho um medo ‘da bexiga’ (risos)! Então, acredito que Margaret seja o lugar em que mais terei de correr atrás para me adaptar. Já as etapas em que mais quero ir, são muitas. É o Dream Tour, né?! Competir em Snapper, Fiji, Teahupoo, Pipe, Trestles, esses picos aí são incríveis. Mas, com certeza, o lugar em que mais estou ansioso para ir é Fiji. Foi onde eu peguei as melhores ondas da minha vida e sonho em competir.

 

E não é que esse dia chegou mesmo?!

Um vídeo publicado por Ian Gouveia (@iangouveia) em Dez 5, 2016 às 3:05 PST