Espêice Fia

Session em Laguna

Fabio Gouveia, Laguna (SC)

Vindo da Paraíba, Laguna (SC), foi palco para que eu usasse pela primeira vez um long john. Isso no ano de 1987, quando passei no Sul uma temporada de uns três meses em pleno inverno. Na ocasião, estava hospedado em Floripa, na casa do chefe de equipe da Mormaii, José Filomento Neto, o famoso Netão, que, de passagem pela fábrica da Mormaii em Garopaba, conseguiu meu ingresso na equipe e foi ali que adquiri a roupa.

Naquele longínquo fim de semana, nos molhes de Laguna, acontecia uma etapa do Circuito Catarinense. Por não ter residência no estado, não pude participar, mas nem por isso deixei de curtir e pegar altas ondas com toda a galera antes do evento e ao término das baterias.

 

E o long não saiu do corpo o dia inteiro. Molhava e secava no couro. Anos depois, no feriado recente de Corpus Christi, voltei a Laguna para uma session memorável na companhia do local Pepeu e da turma do big surf – Thiago Jacaré, André Paulista, Fabiano Tissot e Marcos Cabral. Essa empreitada havia sido em um grande swell, e o nosso destino seria a laje da Jaguaruna, mas um forte vento sul acabou impossibilitando a session.

 

Já em Laguna, as ondas ficavam protegidas pelo morro e pelos molhes. Por coincidência, foi lá onde surfei também pela primeira vez com um roupa de borracha munida de  flutuadores (uma maravilha). Sem saber o real tamanho do mar e pelo fato da turma ter optado pelo uso do jet-ski para nos rebocar ao outside, era um dia perfeito. Como vínhamos de Jaguaruna, passando pelo Farol de Santa Marta, parqueamos do outro lado do Rio Tubarão, onde o visual era exótico devido à luz da manhã.

 

Do outro lado dos molhes vinha um cara remando calmamente em um SUP. Ao passar pela margem e depois de uma marola, constatamos que era Pepeu. Troca de papos daqui, dali e a turma acelerou pra botar as roupas e o jet na água. Estava indo ao desconhecido, pois dali não avistava as ondas, e sem saber o real tamanho do swell, partimos ao fundo um por um na garupa do jet. Todos com gunzeiras de 10 pés pra mais, e o Fabiano Tissot com seu SUP acima de 11 pés que acabou indo ao outside primeiro.

 

Fui o segundo a ser dropado lá fora e sem noção de posicionamento. Fui remando mais ao fundo, pois não queria ter nenhuma surpresa caso uma ondulação daquelas quebrasse mais afora. Na sequência vieram Pepeu e, logo depois, Thiago Jacaré. O posicionamento era difícil. A ondulação vinha marchando bem ao horizonte e não conseguia fazer uma leitura de onde iria quebrar. Tentava me basear por Tissot, que, de cima de seu SUP, tinha uma visão bem mais ampla. No entanto, o line up era espaçado, com ondas mais ao inside e outras extremamente no outside.

 

Tissot não parava de pegar ondas, e na maioria das vezes se encontrava mais abaixo de onde estávamos eu e Pepeu, que, com sua lycra Mormaii número 10, era fácil ser avistado pela turma que filmava e fotografava em um dos molhes. Ali se encontravam Luciano Burin, gravando para seu novo documentário (“A Pedra e o Farol”) e Lucas Barnis, o videomaker oficial da turma da Atow Inj.

 

Conhecedor do pico, Thiago pediu para que André – que pilotava o jet -, o colocasse mais para o inside e pra dentro do pico. Ali ele acabava pegando muitas ondas, dando bons drops e seguindo ziguezagueando por longas distâncias.

 

Demorei bastante pra entrar no ritmo e pegar mais ondas, pois quando eu ia para o outside as ondas entravam mais abaixo, e quando eu descia, elas vinham mais de fora. Só depois que adotei a tática de Thiago é que fui recompensado, ao mesmo tempo em que a maré ia mudando e as paredes turvo-amareladas melhorando.

 

Quando estava me posicionando melhor, foi a vez de André Paulista trocar o turno com o Jacaré, quando assumiu a gunzeira azul com amarelo shapeada por Jorge Vicente, um Cadillac. Nessa hora eu me encontrava mais ao outside, quando uma da série entrou e eu estava bem no meio da parede. A onda era grande e volumosa, mas, com minha 10’4”, entrei confortavelmente bem. André também remou junto, e quando eu iria começar a virar na base, tive que esperar um pouco pra ver qual trajeto ele iria fazer. De fato ele tardou seu drop esperando que eu passasse por baixo e ficamos indecisos, até que ele desceu depois que completei meu bottom.

 

A adrenalina foi grande e a felicidade de ambos em ter feito uma onda juntos foi a vibe. Em determinado momento não consegui seguir adiante e André seguiu rumo ao inside quando peguei outra onda logo atrás. Nessa hora foram mais ondas surfadas, inclusive por Marcos Cabral, que apareceu rebocado por Jacaré no tow-in.

 

Foram várias ondas de Marcos que, colocado nos momentos exatos pelo piloto, também ia ziguezagueando rumo ao inside. Em determinado momento, vi que Tissot pegava umas esquerdas pra dentro do canal, e em uma dessas seu leash estourou. Ele acabou levantando o braço para tentar auxílio do jet, mas como Thiago deveria ter ido trocar a pilotagem mais uma vez com André, demorou um pouco pra vê-lo. Fiquei no outside esperando uma onda, pois dado ao grande campo aberto que era o line up, seria mais fácil chegar ao Tissot mais rápido. Foi nesse momento que vi Pepeu remar para uma grande parede que vinha do alto-mar. Também com um gunzeirão, ele remou confortavelmente, mas devido a alguns bumps, teve de usar toda a sua destreza pra completar o drop e seguir ladeira abaixo.

 

Neste momento já fazia umas três horas e meia que estava na água, e de certa forma bem cansado, quando uma parede longa também veio ao meu encontro. Nem cheguei a dropar tanto no pico como gostaria, mas a onda tratou de reformar depois que botei meu bico ladeira abaixo. Estava usando a configuração de quadriquilhas em minha gunzeira e fui no down the line por incríveis um minuto e quatorze segundos. Subi, desci, rasguei com mão na borda, dei lay back e fui embora até a onda acabar no meio do mar.

 

Acho que deve ter sido a onda mais longa que peguei na vida, nem em Jeffreys percorri distancia tão longa. Mas é claro, nada de radicalidade, pois a prancha era uma 10’4”. Mas o drive foi muito divertido.

 

E Thiago apareceu também no meio do mar logo depois de mim, quando eu tentava retornar de encontro ao píer. “Nem tente, pois a corrente, apesar de não ser muito perceptível, não vai poder ser vencida. Vamos esperar aqui pela carona do jet. André foi resgatar Tissot e já regressa”, disse ele.

 

Neste meio-termo, passamos cerca de 15 minutos contemplando o visual e comentando a session, quando nos demos conta de que já realmente estávamos longe da costa, no meio do mar. Foi aí que vi que naquele momento o mais seguro era termos dois jets na session para o resgate, até porque fomos bater tão longe que deu trabalho pra André nos avistar. E usamos até o bico longo de nossas gunzeiras pra facilitar.

 

Devido ao longo período na queda, minha cervical já estava “apitando” quando pedi para André me levar de volta à margem do rio, pois queria me preservar para o surf que iria rolar também no dia seguinte. Fissurado que é, Jacaré voltou para o outside.

 

Eu me troquei rapidamente e ainda corri pra ponta do molhe pra tentar gravar umas ondas da turma. Veio uma série e vi que o jet tinha posicionado André Paulista, pois em algumas ocasiões íamos deitados no sled para facilitar a entrada na onda e também para sermos colocados mais abaixo do pico. O cara deu um bonito drop e seguiu rumo ao inside com o jet acompanhado. A luz já era de fim de tarde e eu não conseguia ver muito bem por causa do back light.

 

Quando a turma chegou na beira e eu disse ter filmado a saideira de André, foi que descobri que quem havia surfado a onda era Thiago. O fato gerou uma brincadeira, pois André resmungou dizendo que Jacaré o havia travado na session e não tinha deixado-o ser o último no surf. Que bicho fissurado!

 

E pra finalizar, só mesmo uma tainha assada no restaurante do Célio, que, aliás, é gente fina. O cara não surfa mais, mas no passado pegou as ondas e nos contou algumas histórias da área enquanto também assistíamos a mais um jogo da Copa.

 

E à noite um churras no capricho oferecido por Marcos Cabral na Jaguaruna, afinal, se naquele dia de mar grande o vento tinha frustrado nossas esperanças na laje, o dia seguinte prometia. E o dia seguinte, na real, já foi contado aqui na coluna anterior.

Bom, fora um feriado intenso, pra mim foi como se tivesse feito uma viagem internacional, devido ao tamanho e à qualidade das ondas. E os agradecimentos, claro, a toda a galera que me acolheu e me proporcionou esse surf. Agradecimentos especiais à fotógrafa Ana Barzan. Para a surpresa de todos, ela também estava nos molhes e cedeu os cliques para a galeria de imagens.

Exit mobile version