Engraçado como muitas pessoas na praia da Vila desacreditaram de Slater dessa vez. Seu começo ruim na primeira fase e uma repescagem mais ou menos, as pranchas estranhas com quilhas esquisitas deixaram seu surf com um pouco menos de segurança e até com um pouco menos de radicalidade.
Ele chegou meio chato, reclamando de assédio excessivo, elogiando o power das ondas mas criticando a formação e parecia mais uma vez neste ano que Slater ficaria pelo caminho no campeonato.
Então apareceu uma outra prancha e ninguém sabia ao certo que tamanho era. Em entrevista Slater disse que era uma 6 pés, mas um ?entendido? do assunto, com acesso aos bastidores afirmou que a prancha não passava de uma 5?10?.
Especulações à parte, o que Slater queria ele conseguiu: correu por fora. Enquanto Mineiro ficava com a parte difícil do trabalho ao tirar do caminho Parko e Bede, Slater não ficava atrás e mandava pra arquibancada Taj e CJ.
A torcida ficava cada vez mais confiante que desta vez a hora seria de o brasileiro chegar ao topo do pódio. Afinal, nunca se viu os dois juntos numa decisão aparentemente tão teoricamente equilibrada.
Essa confiança contaminou também Mineiro. Um grande erro, aliás, uma grande mania brasileira que devemos e temos que tirar.
Não que devemos perder nossa fé, não que devemos perder nossa garra, não que devemos deixar de acreditar. Mas os exemplos são cada vez mais claros de que o campeonato só acaba mesmo na hora que a buzina soa!
Claro que vibrar e levar a torcida junto vale a festa, não tem como não se empolgar com uma praia lotada torcendo ao seu favor. Porém, desde que a bateria começou, todos os que estavam realmente antenados com toda a força histórica do surf do Mr Alien Slater, sabia que ele vinha evoluindo a cada bateria, se acertando com o mar e com a prancha.
Não é novidade Slater fazer duas notas excelentes na final. Virar resultados nos minutos finais também não. Nós brasileiros acreditarmos que ?desta vez vai dar? também não é nenhuma novidade. Semana passada mesmo viramos a final da Copa das Confederações com um placar totalmente adverso, qual o motivo de no surf não ser assim?
Respondo: o Pelé do Surf não é brasileiro, é americano e se chama Robert Kelly Slater. Hoje só ele tem nove títulos mundiais e esse talento anormal para soltar o pé nas pesadas esquerdas da Vila, mandando pancadas e floaters tão extensos que fizeram com que nossa torcida se colocasse de volta no devido lugar, ou seja: reconhecendo quem é o rei do surf.
O nobre súdito Mineirinho bateu na trave mais uma vez. Sentiu sim por alguns instantes uma posição louvável de colocar o rei em situação complicada, porém complicada só para quem coloca demais o coração na esperança não de ver o improvável acontecer. A frieza, a força, a garra e a determinação só quem dá um floater de 9 metros num mar não muito simples de surfar e segue destruindo a onda para arrancar notas classificadas como excelentes. Não se pode brincar com Slater, mesmo se ele estivesse manco e cego de um olho, o que não era o caso!
Adriano de Souza, agora na vice-liderança do ranking, passa a posição de alvo, uma característica nova para sua fase atual de WCT. Será que toda a preparação já chegou a esse nível de lidar com a pressão de entrar como favorito de agora em diante?
Slater mais uma vez fez o coração brasileiro trepidar de alegria e tristeza. Porém, todos com a mesma certeza de que, cenas como as vistas hoje, fazem parte de mais um capítulo fantástico da história do surf.
O que teria eu a dizer do resto do time brazuca em meio a tanta força do que aconteceu no dia final do evento?
Bom, Neco, sem dúvida alguma merece os parabéns por ter mostrado estar um pouco mais maduro psicologicamente e ainda surfando de igual para igual com os tops do tour, pelo menos em beach break.
Heitor ainda não convenceu e não mostrou a força que todos esperamos que ele mostre. Está parecendo muito ?maluquinho? quando está na pressão do resultado adverso. Começa a querer inventar demais quando um arroz e feijão bem feito já seria o suficiente para virar um resultado. Desespera-se fácil demais e está faltando alguém dizer para que ele tenha um pouco mais calma na bateria. Se está no WCT é porque surf ele tem!
Jihad até mostrou uma pressão legal de backside e jogou bastante água. Mas em termos de variação de manobra foi um fiasco. Era um tal de rasgada-replay que fazia com que suas notas ficassem igualmente baixas. Parece que apesar de tanto tempo de surf competição de alto nível ele ainda não percebeu que variação é algo que também entra bastante no critério que tanto os juízes querem ver.
Gustavo Fernandes tem um grande talento e poderia incomodar mais se tentasse forte o WQS. Vejo seu surf muito bem encaixado nos beach breaks e seria uma boa se investissem no garoto em ondas mais cascudas. Atualmente está muito mais pra Supersurf do que para bater de frente com os tops globais.
Gui Ferreira tem um surf um pouco ?retrô? para ficar pau-a-pau com esse time que corre o WCT. Precisava ser um Greg Emslie ou um Taylor Knox para conseguir alguma coisa. Mero coadjuvante.
Bernardo Pigmeu, já disse diversas vezes e volto a repetir que Pig é um excelente surfista, mas falta potência nas manobras e uma linha mais convincente. Para fazer juiz soltar nota ou o cara tem as duas coisas ou pelo menos uma delas com bastante presença, o que não é seu caso quando falamos de WCT, infelizmente. Apesar da idade, Fia Gouveia merecia mais esse wildcard do que ele.
Agora é J-Bay galera, outro capítulo, outra história, outra vibe, mas a mesma certeza: cuidado e respeito com quem vem fazendo mágica desde os primórdios da década de 90.