Canoagem Polinésia

Sobre Va’a, irmandade e rivalidade

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Sejamos no máximo rivais, mas jamais inimigos. Foto: Carla Falleiros.

 

Você que acompanha o SupClub deve ter percebido que temos dado cada vez mais espaço para a canoagem polinésia, em especial para a OC / V 6. O site, é verdade, vez ou outra sempre postou algum artigo relacionando à Va’a, mas, desde 2015 a modalidade ganhou peso maior e agora está incorporada a nossa identidade editorial.

 

Ainda assim, imagino que para muitos competidores eu seja um completo desconhecido, pois nunca participei de nenhuma prova de Va’a. No entanto, nascido e criado em Santos, desde cedo me envolvi com o surfe e com a canoagem. Remo há um bom par de anos de OC2 e OC6, sempre a convite de amigos de longa data como o Naldo Lima, o Luís Cláudio Negrini e o Marcelo Lins. E sempre na camaradagem, espírito aloha, que é o que a canoa tem de melhor. Uma travessia aqui. Um domingão até o Moisés, e, assim, entre uma remada e outra, absorvendo o que esse esporte tem de mais puro. Depois, em 2015 me mudei para Florianópolis e meus laços se tornaram mais estreitos pois agora participo efetivamente de um recém formado clube brasileiro de Va’a: o Praia Mole Paddle Club.

 

Desde muito garoto, o surfe falou mais alto em meu coração.  Porém, quando o stand up paddle entrou em minha vida, em 2009, e mudou tudo pra sempre, passei a dar mais atenção ao Va’a. E, cada vez mais mergulhado nesse universo, percebo que tudo está interligado e vem do mesmo lugar.

Sem as canoas não haveria surfe, não haveria SUP, não haveria Polinésia. E quando você alcança esse nível de percepção, você percebe que a canoa tem muito mais a oferecer do que um troféu. Na real, um troféu não é nada comparado ao que podemos ganhar da canoa se nos permitirmos (ou se a canoa nos escolher, dirão alguns místicos).

 

No último final de semana viajei a minha querida Salvador para trabalhar na cobertura do Aloha Spirit, válido como segunda etapa do Brasileiro de Va’a (OC/ V 6).

 

Como todos sabem, a vitória da equipe Rio Va’a tem causado muita polêmica, pois eles foram os únicos a competir com um modelo taitiano de canoa que, em tese, é mais veloz e tem mais autonomia em águas abertas do que as canoas havaianas.

 

Isso tem causado muito ruído nas redes sociais e, o mais triste, sinais de inimizade têm se aflorado. Não é uma vibe legal, mas é compreensível até certo ponto, pois tem coisas importantes em jogo: uma vaga para o Sul-Americano e um título Brasileiro, mas, a meu ver, esse racha, em si, é muito mais prejudicial à cultura da canoa polinésia no Brasil.

 

Uma das primeiras lições que aprendemos quando entramos em uma canoa para seis remadores é o espírito de equipe. E isso deve ser levado para frente, para o nosso dia a dia. A OC6 ensina que o “Nós” é mais importante do que o “Eu” e que, de uma forma ou de outra, estamos todos no mesmo barco.

 

E o barco em questão é o Va’a brasileiro. E, por hora, ele não está evoluindo bem porque há muita controvérsia. Precisamos resolver isso à nossa maneira. Se a CBCa quiser nos acompanhar, melhor para ela.

 

Primeiro, é preciso deixar claro que a equipe Rio Va’a é composta por grandes remadores. Por melhor que seja a canoa, ela não anda sozinha. Os caras merecem respeito.

 

Segundo, a equipe Samu é composta por atletas de alto rendimento, que treinam em alto rendimento e sem receber um apoio na mesma proporção de seu nível de dedicação aos treinos. Isso tem que ficar bem claro pra que a gente não confunda autoconfiança e garra com arrogância.

 

E terceiro, tanto a Samu, quando a Rio Va’a, quanto a Taho’e, e mais uma boa leva de equipes que se dedicam aos treinos e estão elevando o nível técnico desse esporte merecem nosso respeito e admiração.

 

Isso tudo foi dito na tentativa de conduzir você, amigo leitor, de maneira serena, à minha conclusão: A Rio Va’a deveria aceitar o desafio da Samu e competir com o mesmo tipo de canoa.

 

Não para mostrar quem é melhor ou pior. Até porque na canoagem polinésia isso é subjetivo. Afinal, o que é “ser a melhor equipe”, dentro do âmbito da cultura polinésia? É a equipe que chega mais rápido do ponto “A” ao ponto “B”? Só isso? Pra mim é muito pouco.

 

O que vejo aqui é a possibilidade de se resgatar uma rivalidade saudável enquanto ainda há tempo. Adoraria ver esse “pega” entre Samu e Rio Va’a com canoas parelhas. Imaginem se os caras aceitarem o desafio? Seria histórico e muito simbólico.

 

E, independente de quem chegue à frente, que ao final, as equipes se cumprimentem com respeito e espírito aloha.

 

Sejamos, no máximo, rivais. Jamais inimigos. Imua.

 

“A força da alienação vem dessa fragilidade dos indivíduos, quando apenas conseguem identificar o que os separa e não o que os une.” (Milton Santos)

 

 

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Luciano Meneghello é editor chefe e fundador do site SupClub. Foto: Reprodução.

 

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