No ano de 2010 fui mais uma vez colunista da revista Fluir. A coluna Surfabulas encerrou-se no último mês, quando finalizava mais uma passagem dos anos de trip pelo mundo.
Foi muito legal compartilhar algumas coisas que vivi com os leitores. Agradeço à equipe da revista pela oportunidade.
Quem ganha com isso são os internautas uêiveanos, que me acompanham e que muitas vezes compartilham meus textos com complementos, dicas, puxões de orelha e outras coisas que são muito bem-vindas e proveitosas.
Abaixo segue a nova coluna Espêice Fia. Abraços, obrigado e boas ondas.
Surf e comédia em Bali Depois de um dia de surf clássico em Uluwatu e algumas cervejas Bintangs, lembro de me empolgar em uma tremenda conversa com Amaury Pereira, o Piu, ex-surfista profissional e que hoje trabalha no marketing da Quiksilver Brasil.
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O papo era em torno de um juramento que, a partir daquele dia, não deixaríamos de estar presentes em nenhuma temporada na ilha dos mil e tantos templos e de muitas ondas.
A temporada de 1988 foi minha primeira e até 1991 bati ponto. Depois o circuito mundial não deu praticamente mais brechas e ficou difícil cumprir o trato. Até que, em 1995, voltamos naquele evento que foi a porta de abertura do Dream Tour, o Quiksilver Pro em Grajagan.
E aí claro, a base era Bali. Surfar as ondas de “Ulu” era sonho para qualquer um e no final da década de 80 ainda era pura aventura chegar ao pico. Caminhos escorregadios nos levavam até próximo dos Warungs para logo recebermos uma força dos famosos “miquerrís”, garotada que carregava nossas pranchas.
Era parar a moto e a molecada já vinha pegando a prancha, dizendo em um português carregado de sotaque indonésio: “me carregô, ok?”.
O nome do meu miquerí era Wayan Jack, um moleque franzino muito gente boa – como todos dali – e que anos mais tarde estava com uma estilera danada nos arredores de Kuta, fruto do crescimento estrondoso de Bali. Corrente de prata no pescoço e cigarro entre os dedos. Seu sorriso era fácil como de costume.
Sempre fui contido para conduzir motos, mas na época era a solução mais rápida para se chegar a Uluwatu. Logo uma carta de condução tinha que ser providenciada. Lembro de sairmos eu, Piu e Teco Padaratz (presente nesta ocasião) na garupa de três motos com indonésios muito loucos na “pilota”. O destino era Denpassar para irmos a uma espécie de Detran local.
Confusão danada. Aquele entra e sai de gente. Imagine como eram obscuros os trâmites das coisas por ali. Sentamos em três cadeiras escolares depois de pagar a taxa para obter a habilitação. Um dos indonésios que nos levara ficava com um gabarito de uma prova escrita e ia apenas nos passando a cola na maior cara dura.
Nós ficávamos em um mix de nervosismo e ao mesmo tempo de risos, tamanha a comédia que presenciávamos. Com uma manhã inteira perdida nessa função, com certeza o resto do dia era de muito surf.
Quem já visitou a ilha e alugou algum veículo barato naquela época sabe bem do que estou falando, tudo ali era hilário e bem capenga. Sempre havia pepino com as motos. Hora era um cabo de freio, hora combustíveis misturados, embreagens e aceleradores defeituosos…
Havíamos nos hospedado no Hotel Sandi Phala, próximo a Kuta Reef. Certa manhã, ao tentar sair para Uluwatu, não conseguia fazer a moto pegar.
A bicha já estava encharcada de combustível quando o Piu resolveu me dar um empurrão. Tão logo a moto começou a embalar, o acelerador emperrou no máximo e saí a milhão sem conseguir parar. No mínimo o acidente ia ser grande, porém, sem pensar duas vezes, resolvi pular da moto e deixá-la sair sozinha.
Me joguei para trás e caí em pé, porém a velocidade era tanta que saí capengando. A moto seguiu alguns metros e acabou tombando, rente a um muro de uma residência. Eram cerca de oito horas da manhã e o barulho do motor causado pelo acelerador colado era estridente.
Levantei rindo pra caramba e logo o Piu, que veio atrás correndo, apareceu para ajudar. Nesse momento aparece um balinês por cima do muro e rapidamente jogou uma bacia de água por cima da moto. Minha adrenalina era grande, pois antes disso achava que a moto iria explodir. É impressionante como nessas horas aparecem gente curiosa para ver os acontecimentos.
Um cara que apareceu do nada foi levantar a moto e o grito que deu depois de ter se queimado fez a galera rachar o bico. Sem entender uma palavra do que as pessoas em volta falavam, esperei a moto esfriar em meio a muitas risadas, pois o Piu também não parava de rir e só falava: “Fia, tu é doido!”.
Ligação para o dono da moto tentando explicar o ocorrido e mais uma manhã perdida com o episódio. O surf acabou rolando em Kuta Reef, que ainda não era crowd na época. Fazíamos a cabeça no surf perto do hotel. À tarde moto consertada e partimos os três para Uluwatu. Na parte mais crítica da trilha, Teco não conseguiu acelerar o suficiente e desceu de ré sem conseguir manter uma boa meia embreagem.
O barulho da aceleração mais uma vez causava aquela adrenalina e risos em meio ao tombo. Eu que vinha subindo atrás também acabei caindo. Ficamos os dois deslizando e rindo bastante. Ao chegar ao cliff de Uluwatu, quando tirei minha prancha da capa, vi que havia quebrado um palmo de bico, pois como estava sentado em cima da prancha quando pilotava a moto, no momento do perrengue o bico acabou partindo.
Por sorte havia deixado uma prancha no Warung em que havíamos ficado no dia anterior e seguimos para o inside corner, que bombava com tubos insanos em uma bancada muito rasa.
Nos últimos dois anos visitei a Indonésia, porém a querida Bali ficou distante. As ilhas da Sumatra foram meus destinos. Sei que não mais terei o feeling daquela aventura na ida até Ulu, pois a especulação imobiliária da região foi enorme. Em relatos de amigos e publicações de revistas e sites deu pra ver que a concorrência é ferrenha.
Quero voltar, não para cumprir o trato que “faiou”, mas para relembrar as boas ondas e os momentos divertidos passados ali.