Hawaii 5 a 0

Surfanáticos Futebol Clube

Bruno Santos, Pipeline, North Shore de Oahu, Hawaii

Bruno Santos enche os olhos da torcida brasileira em Pipeline, Hawaii. Foto: Luís Cláudio Duda.

Geralmente, as colunas em todos os meios de comunicação são contra os atletas. Às vezes, brasileiro é um povo muito exigente!


Temos um país maravilhoso, com fenômenos em esportes como o automobilismo – um esporte muito caro para os padrões brasileiros – e tênis, em que no masculino, antes do Gustavo Kuerten, não tínhamos história alguma.

Temos verdadeiros heróis em vários esportes como atletismo, hipismo, vela, natação, vôlei, bodyboard (não digam que é puxação de sardinha, mas no masculino são sete títulos e no feminino mais de 10 mundiais), esportes em que muitas vezes não há investimento algum.


Os atletas se superam e alcançam seus objetivos, seja por um talento único, uma dádiva divina, seja por um lance de sorte. Mas, para se chegar a uma final, não existe sorte.


Acho que foi do lutador Vitor Belfort a seguinte frase: “quanto mais eu treino, mais sorte eu tenho”. Isto é uma realidade, não adianta ter sorte, e surf pede muita sorte em baterias, muita sorte.


Tem de estar com o surf em dia, lógico, mas bateria é bateria e onda nunca é igual. Uma junçãozinha a mais, em mares pequenos, às vezes salva a pátria, ou uma bateria na troca de maré, como em Teahupoo e Pipeline, te massacra.


Às vezes, vir aquela onda salvadora no fim da bateria, com mais quatro no mar é sorte, mas você tem de estar preparado para destruir e arrancar o score que precisa. 


Falo isso em campeonatos de nível WCT, que tirando os “semi-deuses”, todos têm um nível técnico parecido e qualquer onda um pouco melhor já muda a história da bateria. O surf no Brasil é um esporte novo?


Não, novo ele não é, mas profissionalmente ele é novíssimo e já alcançou status de “paixão nacional?. Hoje, chegar ao pai da gatinha e estufar o peito dizendo “sou surfista profissional” não é mais tão estranho. Eu, particularmente, sou da época em que ouvi pela primeira vez a frase surfista profissional em uma música com um grupo de mulheres chamado Sempre Livre (tá bom, busquei no fundo do baú).


Temos o maior circuito nacional do mundo! Muito bem organizado, premiação boa. Brasileiro quando tem a chance de fazer algo bom, arrebenta. Se não fosse a economia do País, o circuito brasileiro estaria muito a frente dos “países de primeiro mundo”.


Temos eventos locais, por exemplo, que humilham os eventos locais havaianos. Mas, e aí, quando teremos um campeão do mundo?


Esta é a pergunta que não quer calar. Temos boas chances? Talvez. Primeiro tem de nascer um surfista com o talento natural para ondas pesadas e tubulares do Bruno Santos, com a técnica de ondas médias e pequenas do Mineirinho e a raça e disposição do Peterson Rosa.


Seria o ideal! Mas, vale lembrar que o Mineiro ainda tem muita lenha pra queimar em sua carreira. Os leões Slater, Irons, Fanning e cia não durarão o tempo que ele durará no tour. Hoje, um atleta tem uma carreira competitiva muito maior e consegue manter um ritmo até, pelo menos, os 33 anos (não esqueci o Occy, não, que está aí já quase de bengala e dando uma dura na galera).

O Mineiro ainda terá muito chão e, se investir mais em ondas pesadas, pode, sim, ser um campeão, mas isso tomará tempo ainda. Quem sabe mais uns cinco anos!

 

O problema é como ele lida com essa pressão negativa vinda de nós mesmos, torcedores fanáticos que querem resultados já! O surf não é como o futebol, onde já temos atletas com um nível técnico absurdo.


Não existe campo de futebol cavado, gordo, com fundo de coral ou areia, entende? É muito mais fácil! Surf é difícil, é o mesmo esporte em várias fases. Você não dá uma cavada em Pipe do mesmo jeito que em Jeffrey’s Bay.


São milhares de macetes. O jeito de o Andy Irons manobrar arqueando o joelho é diferente do Slater; são técnicas, jeitos, truques, que, por mais talento que se tenha, demora para aprender.


O Mineirinho tem apoio financeiro? Tem. Vontade de aprender a surfar ondas como Pipeline e Teahupoo? Não achava, mas depois dessa sua estendida em Teahupoo e as fotos que vi aqui no Waves.Terra, acho que ele acordou legal.

 

Assim como a maioria dos internautas do site, sou um técnico, “um Luxemburgo do surf”. Sinto, às vezes, que a minha coluna é meio que a voz do povo. Tento falar como um internauta, das minhas conversas, e-mails e divagações no meu dia-a-dia a respeito desse esporte que dominou a mente do povo brasileiro na última década.


Se pararmos para olhar, nosso ataque começou com Fábio Gouveia, Teco, Piu e logo após o Renan, isso em mil novecentos e guaraná de rolha.


Muita água rolou, o circuito mudou, antes tínhamos campeonatos e mais campeonatos em beach breaks. Era um tal de Japão, Brasil e França que facilitavam surfistas que no circuito de hoje provavelmente nem correriam o tour. Se a ASP tivesse mantido o formato, teríamos um campeão brasileiro, talvez Gouveia fosse o nosso primeiro campeão do mundo.


O que não lembramos é que muitos dos que estão aí – brothers Irons, Slater, Parko, Mick Fanning – são caras que cresceram surfando ondas nos moldes do tour. Ok! Slater veio da Flórida, mas é americano, seus primeiros patrocinadores investiram pesado na sua formação em ondas de tamanho e seu talento anormal fez o que vemos hoje e há mais de uma década e meia.

 

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Adriano Mineirinho precisa investir em ondas pesadas para tentar o sonhado título mundial. Foto: Luís Cláudio Duda.

Todos os nossos representantes no WCT são surfistas excelentes, sem exceção! Uns com menos vontade de aprender a surfar ondas de calibre, outros sem nenhuma vontade de aprender – eles querem sobreviver. Outros estão aí, na raça. Quem não achou animal o tubo do Leo Neves no Chile?


Pura atitude. Quem não enche os olhos vendo o Bruno em Pipe? Coisa de três anos atrás, a etapa de Haleiwa estava uma pedrada. Lembro de uma bateria do Mineiro com o mar grande, grande mesmo. Haleiwa 12 pés não é surf, é castigo!


O moleque vinha lá de trás mandando ver. Surfou muito bem, foi de impressionar. Um cara que surfa um mar daquele não pode ser chamado de merrequeiro. Pode, sim, ser chamado de inexperiente em mar grande. Um merrequeiro nem cairia ali!


Nesta geração que está entrando no WCT, vai um nome aí pra lista! Pigmeu, atleta do clã de Jamie O’Brien, surfa muito em ondas pesadas e dará um trabalho gigante se continuar ? assim como o Mineiro – com essa instigação de aprender mais, porque não vão deixar nunca de aprender, ainda mais em um esporte como o surf, que, pelo fato de ser feito para se interagir com algo tão forte e ao mesmo tempo frágil como a natureza, está sempre mudando, seja por causa da maré, vento, etc.


Às vezes reclamamos de boca cheia! É o que acho. Temos atletas merrequeiros? Não é o que vejo no Fórum? Galera, temos atletas que surfam bem ondas pequenas, afinal cresceram surfando nelas, ou alguém acha que Pitangueiras vai te dar base para surfar um Backdoor 10 pés?


Antes de os ?malufbrothers? me apedrejarem, isto é um exemplo. Já peguei mares clássicos aí, mas que não dá base, não dá, apesar de talentos em bombas como Mancusi, Haroldo e Pacceli, que são todos ali do Guarujá, mas esta outra história – é big surf, coisa de maluco!


Às vezes temos que ver, também, a pressão que essa galera sofre. Sei que deve ter alguns (principalmente da nova geração) que sofrem com essas críticas. Possa ser que o fato de parecer que torcemos contra chegue a prejudicar o rendimento de alguns.


Os atletas de outros países têm estrutura de sobra, viagens desde cedo, técnicos, preparadores e toda uma estrutura para evoluir seu surf degrau por degrau.


Qual o grommet aí do Brasil que, antes de ir pra aula, cai na água pra surfar Backdoor 6 pés por uma hora, como John John Florence faz?


Quantos têm a possibilidade de ir a Bali com os irmãos Hobgood para aprender a entubar, como a Globe fez com seu time?


Isto é estrutura! Alguns dos nossos atletas, talvez com essa estrutura desde cedo, conseguiriam atingir o nível técnico dos tops caso não estrelassem, é obvio. O Brasil é um país intenso demais, todos os tops amam competir no Brasil devido à intensidade e calor da torcida. Já ouvi Slater e Fanning dizendo isto em entrevistas aqui.


Mas, dá pra perceber que, com uma estrutura bem montada, um plano de ataque pode vencer o talento nato.

Ou já esquecemos que os EUA venceram o Brasil por 2 x 1 no futebol sub-20? O futebol aqui é praticamente um esporte feminino. Onde quer que vá, só se vê mulheres jogando. A liga feminina é muito mais forte também, mas aí é que está. Estão planejando, investindo no masculino, e isto já vem surtindo efeito.


Um país, com um talento no futebol que beira a loucura, perder em um esporte praticamente esquecido aqui na América?


Mas, aí está. Eles estão se preparando, planejando! É o que as empresas de surf aí devem fazer (e algumas fazem). De duas temporadas pra cá, tenho visto alguns grommets vindo tentar a sorte aqui na ilha. Mesmo que não surfem, estão vendo, sentindo o que é o Hawaii.


Parece pouco, mas é muito bom ver outros moleques surfando, aprendendo, vendo “os corais” que tanto assustam os recém-chegados, e com razão, porque pra cortar basta encostar, mas nada pra se ficar paranóico.


Devemos parar de pegar no pé da galera? Acho que não! Devemos cobrar resultados, mas devemos saber a limitação dos nossos surfistas.


Cobrar uma vitória num Teahupoo gigante eu acho injusto. Ainda não temos alguém capacitado para uma vitória como esta. Não é falta de vontade deles, é que “simplesmente não dá”. Devemos entender e torcer, na medida do possível, por boas atuações, bons exemplos para a próxima geração.


Talvez esta do Mineiro, Bruno e cia possa dar mais um passo para um dia sermos e termos atletas com nível de campeão do mundo.
 
Já somos campeões mundiais de bodyboard masculino e feminino, longboard e surf amador mais de uma vez com o próprio Gouveia, Mineiro, Pedrinho, Pablo, etc.


Fica aqui registrada minhas desculpas pela seguinte frase no meu último texto: “caras com talento, mas que já vivem a rotina do estrelato, esquecem o que é o esporte e se entregam muitas vezes ao green planet, ‘viva Bob Marley’!?.


Não quis, apesar de ter feito um comentário que ?estereotipasse? alguém. Realmente me desculpo se atingi alguém com essa frase. Não sou o dono da verdade. Como já disse, sou um torcedor, um surfista como todos aqui,. Este espaço me foi dado para escrever sobre coisas que todos pensamos. Meu e-mail bombou com mais de 100 mensagens nos dois primeiros dias e respondi a todos. Aprendi muito, e outras matérias virão dessas conversas.


Obrigado a você que lê esta coluna. Trato-a com muita seriedade e espero poder ajudar, trocar idéias com a galera, aprender cada vez mais. Só para constar, aprendi a ser humilde com estes ensinamentos.


Provérbios 29:23 – A soberba do homem o abaterá; mas o humilde de espírito obterá honra. Provérbios 11:2 – Quando vem a soberba, então vem a desonra; mas com os humildes está a sabedoria.
 
Fiquem com Deus e até a próxima.

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