Teahupoo surf camp

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Pedro Aguiar na onda da vida em Teahupoo, Tahiti. Foto: Arquivo pessoal Pedro Aguiar.
Apesar da pouca idade, o gaúcho Pedro Aguiar, 23, já possui na bagagem bastante experiência em viagens para lugares como Hawaii, Austrália e México. A última delas, no entanto, merece destaque.

 

Pela primeira vez no Tahiti, enquanto o mar subia e alguns dos melhores atletas do mundo já praticavam tow-in, ele surfou uma bela onda na remada que chamou a atenção de todos.

 

Pedro não teve dificuldade em surfar Teahupoo de backside e passou cerca de sete meses no local, acampado em uma barraca em frente ao pico. Com tanta disposição, foi presenteado com o mar mais intenso da vida dele.

 

O free-surfer gaúcho ficou sete meses acampado no jardim de uma família tahitiana. Foto: Arquivo pessoal Pedro Aguiar.
?No dia grande estavam presentes alguns dos melhores caras do mundo no tow-in, feras como Shane Dorian e Laird Hamilton, e eu fiquei muito feliz de ver você e o Pato representando a galera, pegando algumas das melhores do dia. Eu vi tudo de muito perto, mais precisamente de cima da crista, pois eu estava na água tentando pegar alguma coisa na remada durante a manhã?, disse sorrindo Pedro.

 

Nessa sessão matinal o jovem impressionou a todos por ser um dos poucos surfistas que estavam na remada em um dos maiores dias da história de Teahupoo. O mar foi subindo pela manhã e ele surfou um dos melhores tubos daquela sessão na remada, enquanto o mar não ficou impossível para a o surf no braço.

 

Mordido pelo mosquito da adrenalina, ele agora procura patrocínio para provar outras ondas enormes como Mavericks e Jaws. Ele e a irmã ainda têm em mente a produção de um documentário nessas ondas, mostrando não somente as sessões, mas também a cultura local.

 

Nesta entrevista Pedro Aguiar fala mais sobre a incrível experiência vivida no Tahiti e outras passagens importantes na sua carreira de free-surfer fissurado.

 

 

Como você foi parar no Tahiti?

 

O negócio foi o seguinte, eu estava no Hawaii, meio de saco cheio do crowd, e meu visto estava expirando. Além disso, eu estava meio fraco de grana. Fui numa agência de turismo e a passagem mais barata que eu achei era pro Tahiti, lugar que eu já sonhava conhecer desde a infância. No fim deu tudo certo.

 

Que outras trips internacionais você já havia feito?

 

Vou descrever o meu trajeto nos últimos cinco anos. Parti de Porto Alegre para Califórnia, onde trabalhei um pouco e depois fui curtir a temporada havaiana. Depois voltei pro Brasil, estudei um semestre na universidade e tranquei a matrícula. Na seqüência fui para Austrália. Passei um ano no Oeste daquele país e embarquei para Puerto Escondido, México, onde passei seis meses entubando. Depois fui novamente para o Hawaii. No final da temporada voltei para Puerto e fiquei mais seis meses por lá, então voltei para o Hawaii novamente e de lá finalmente fui para oTahiti.

 

Como é o dia-a-dia em Teahupoo e o que você fazia nos dias sem onda?

 

Em Teahupoo raramente fica flat, mas quando tava marola eu ia pescar ou realizava alguns trabalhos na terra da família que me cedeu o espaço para acampar. Li vários livros também, que meu padrinho mandou via sedex do Brasil.

 

Você morou o tempo todo na barraca? Quais os pontos positivos e negativos dessa escolha?

 

Custo zero é a parte boa, mas de vez em quando caia muita água e molhava tudo. Mas valeu o sacrifício.

 

A vida é cara no Tahiti, como você se bancava? Quanto gastava em média por dia?

 

Conheci pessoas incríveis. Eles insistiam que eu comesse com eles e vivesse na terra deles. Com isso eu tinha poucos gastos, somente comida que eu volta e meia trazia pra casa da família. Se eu não conhecesse aquelas pessoas eu não iria durar uma semana. Tudo é muito caro.

 

Valeram a pena esses sete meses?

 

Olha, daria facilmente pra passar uma vida inteira naquele lugar.

 

Quais os melhores mares que você pegou nesse período?

 

Os melhores foram aquele dia grande de uns 15 pés a 20 pés que você e o Pato estavam fazendo tow-in e eu remei durante o início da sessão, e um outro swell de 8 a 10 pés que estava muito violento. Fora isso rolaram vários dias de 6 a 8 pés.

 

Fale sobre esse último swell que pegamos.

 

Foi o maior e melhor swell do ano e creio que um dos maiores e mais perfeitos já vistos no pico. Tem gente dizendo que a bomba que o Manoa Drollet surfou foi a maior já surfada ali. No dia grande estavam presentes alguns dos melhores caras do mundo no tow-in, como Shane Dorian e Laird hamilton, e eu fiquei muito feliz de ver você e o Pato representando a galera, pegando algumas das melhores do dia. Eu vi tudo de muito perto, mais precisamente de cima do lip, pois eu tava na água tentando pegar alguma coisa na remada durante a manhã. Quando as bombas da série (obviamente impossíveis de serem surfadas no braço) entravam, remávamos desesperadamente por cima das ondas e de vez em quando dava uma espiada de cima do lip pra dentro do buraco e via a galera do tow-in colocando pra dentro muito fundo, cenas chocantes. As baforadas então, sem comentários, depois do baforada ficava uma nuvem branca pairando sobre os barcos no canal.

 

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Visual aéreo da mais famosa bancada tahitiana. Foto: Arquivo pessoal Pedro Aguiar.
Descreva aquela onda que você pegou no braço.

 

Aquela onda foi nesse dia grande que eu descrevi. Eu cheguei remando no pico e nem parei em meio aos barcos pra analisar a situação, pois eu sabia que se eu olhasse as bombas muito tempo eu ia ficar petrificado de medo no canal o dia inteiro, então remei direto pro pico. No início tava uma galerinha na água tentando pegar alguma coisa no braço. Eu e mais dois brasileiros, o Marcos Baiano e o Guile, além do local Heiarii Williams e Laurie Towner, um australiano que desce ondas absurdas. Além de nós cinco de prancha, havia meia dúzia de bodyboarders.

 

Pedro durante o banho diário no quintal de “casa”. Foto: Arquivo pessoal Pedro Aguiar.

Logo de cara eu desci uma que parecia boa, mas embiquei e tomei uma vaca no drop, mas saí numa boa. Para minha sorte não vinha nenhuma onda atrás, assim consegui retornar para o pico sem demora. Depois disso fiquei umas duas horas só amarelando e desviando das séries, nesse meio tempo todo mundo que tava no braço foi pro canal assistir e eu fiquei sozinho no pico com uns cinco bodyboarders. De repente veio essa onda que parecia sarada, mas eu não tinha noção de quanto era grande. Ela parecia estar vindo com bastante influência de Sul, e ao longo do tempo no pico eu fui me ligando que direção é um elemento importante em Teahupoo. Se a onda vem de Oeste ela fica mais curvada no bowl, com aquela esquina, e fica mais rápida e perigosa. Se ela vem mais de Sul, vem enroscando aberta e com a boca virada pro fundo, não tão curvada em direção à praia. Quando eu vi aquela onda vindo bem de Sul, mesmo que ela parecesse fechadeira, me encorajei e remei com tudo. No momento que eu remei nela eu ouvi a galera nos barcos gritando e depois disso foi tudo um susto. Só lembro de cair pra dentro de um salão gigante e depois veio a baforada que me cegou, a real é que eu não vi nada durante a maior parte do caminho. O que eu recordo mais é a sensação de aceleração e potência que senti no corpo, como quando um carro esportivo acelera com tudo e cola o corpo no encosto do assento. Quando a baforada e a bola de espuma me engoliram, eu continuei agarrado na minha prancha e de alguma forma consegui avançar por cima da bola de espuma sem ser derrubado por ela, e fui até o final da onda, onde caí com muita velocidade na parede, lesionando meu ombro na queda. Meu leash arrebentou quando eu vaquei no final do tubo e minha prancha foi em direção à bancada. Para completar, quando eu subi do caldo com o ombro baleado, eu estava na parte mais sinistra da bancada, onde não tem quase água e o quebra-côco gigantesco na bancada quase exposta.

 

A primeira coisa que vejo quando subo do caldo é a serie de 15 pés vindo atrás, o Pato sendo cuspido no canal uns 20 metros à minha frente, e o rabo gigantesco da onda vindo na minha direção, armando pra explodir de novo, toda branca e espumada. Precisamente onde eu me encontrava, numa parte do reef que estava tão raso que dava pra ver rugas na superfície da água, eu estava em uma situação que não sabia se nadava pro outside ou se tentava nadar pro reef exposto pra sofrer menos com impacto da explosão. A real é que eu não podia tomar aquela junção na cabeça, então comecei a nadar com tudo pra cima dela e, em vez dela quebrar na minha cabeça, ela continuou drenando água do reef por mais um par de segundos e foi ficando cada vez mais cascuda, o que foi minha sorte, pois ela me deu tempo de mergulhar e nadar por baixo dela. Senti o lip explodindo pertinho dos meus pés. Depois veio outra bomba atrás e eu me encontrei na mesma situação novamente, e o quebra-côco ficou empinando na bancada e isso me deu tempo para passar por baixo dela na última hora. Depois disso nadei pro canal onde peguei uma carona com um jet-ski e recuperei minha prancha que já estava perto da praia. Aí fui assistir a brincadeira do canal, já de cabeça feita. Meu ombro ficou ruim e eu não surfei mais até o final da trip, que durou mais uma semana. Fiquei olhando do canal vários mares clássicos.

 

Você estava usando uma prancha do Andy Irons, como ela foi parar nas suas mãos?


Nos últimos dois meses no pico eu só tinha uma prancha 7 pés de Porto Rico. Mais ou menos uma semana antes desse dia que eu descrevi acima, remei numa onda de um metro, mas ela era um pico de Oeste, rápida e oca, e decidi que eu não queria de fato, então tentei puxar o bico, mas a ela já estava me puxando com o lip. Depois da explosão eu só encontrei metade da minha prancha presa ao leash. Comecei a perguntar nas redondezas se alguém tinha uma gun pra vender. Um amigo norte-americano que vai sempre para Teahupoo tinha essa 7?2 Arakawa que o Andy Irons usou no Pipe Masters e ganhou do Kelly Slater na final. A prancha já tinha quebrado duas vezes no meio, portanto estava um pouco pesada, mas o shape dela continuava lindo. O Arakawa deve ter colocado várias horas naquela prancha. O americano queria US$ 100 por ela. Eu não tinha certeza se comprava ou não, pois eu só teria mais duas semanas antes de retornar ao Brasil e eu estava com a grana curta, mas quando eu vi a previsão para um swell grandão na semana seguinte, comprei a prancha. Acabou sendo a prancha com a qual peguei o tubo da trip, vai ver que já estava ensinada pelo Andy mesmo…

 

Quais são seus planos agora?

 

Quero conseguir dinheiro para comprar um jet-ski e fazer tow-in por aqui e pegar um pouco de experiência  antes de ir para o Tahiti de novo. Tem vários outros picos que quero surfar como Mavericks e Jaws, e também quero voltar para Puerto Escondido e pro Oeste da Austrália. Minha irmã trabalha com filmagens e edição então pensamos em viajar juntos e registrar essas trips e fazer um documentário sobre os diferentes picos, tendo o surf como espinha do projeto, mas que não fosse limitado ao mundo do surf. Pensamos em mostrar as pessoas do lugar, os personagens, um pouco da vida do lugar, o feeling de cada pico. Quero ver se escrevo mais, isso seria bom, escrever episódios das trips que vivi, estou com 23 anos então tenho bastante tempo para fazer essas coisas se tudo correr bem. Seria uma boa se eu encontrasse patrocínio(s) pra comprar o jet e financiar o projeto do documentário. Também preciso de pranchas, se alguém estiver interessado em me ajudar ou saber mais sobre meus projetos, entre em contato [email protected] .

 

E o dia-a-dia em Porto Alegre, você está sentindo muita diferença?

 

É totalmente diferente, cidade gigante, aula de business todas as manhãs, praia somente no fim de semana. Mas é tranqüilo, acho que eu sobrevivo. Obrigado.