Hawaii 5 a 0

Terra de ninguém

Norte-americano Kelly Slater comenta seu amor ao surf no filme Bustin Down The Door

Norte-americano Kelly Slater revela seu amor ao surf no filme Bustin Down The Door. Foto: Luiz Cláudio Duda.

O surf, assim como a vida é um eterno aprendizado. Uma cavada com mais projeção, um cutback mais redondo, um El rollo melhor, uma batida mais vertical e por aí vai. Sempre tem algo para se aprimorar.

 

O surf como esporte nos ensina muito. Nos dá um envolvimento maior com a natureza. Aprendemos e sentimos na pele a força do oceano. Aprendemos a dividir este prazer com os outros (mesmo às vezes sendo muito difícil).

 

E continuando esse aprendizado fui ver o novo filme/documentário Bustin Down The Door, produzido por nada menos que Shaun Tompson.

 

Nunca fui muito fã de seu estilo e, quando comecei a me aventurar pelas ondas ele já duelava contra outra geração.

 

Época boa. Tom Curren,Tom Carroll, Pottz, Occy e muitos outros que ajudaram a solidificar o trabalho feito pela geração de Tompson, Rabbit Bartolomew, Lopes, entre outros.

 

O filme conta a história da temporada havaiana de 1968/69. Uma história que mostra o começo de uma trajetória de conquistas, vitórias e leis.

 

Leis que ainda regem aqui no North Shore, a ?terra de niguém? do circuito mundial. Um lugar onde não existe democracia nem monarquia. Por um lado é bom, mas por outro prejudica muito.

 

Por exemplo, no Pipe Masters surfistas que não competem no mundial, não acompanham as etapas, não lutam por uma vaga, simplesmente por não saberem surfar outra onda que não seja Pipe (não que seja mau negócio) entram passando por cima de toda ética esportiva, competindo com atletas que mal tem a oportunidade de treinar em Pipe. Muitos deles dependendo de um resultado para garantir vaga e mais um ano de ?dream tour?, patrocínios, etc.

 

Alguns vão falar que nossos atletas deveriam treinar mais em Pipeline. Acorda, galera! Aqui é ?Disneylândia?, mas não é o paraíso!

 

O amor pelo surf morreu há muito tempo por aqui. Aquele romantismo visto no documentário, pessoas que vinham em busca de ondas e diversão com os amigos morreu com a primeira nota de cem dólares oferecida como premiação.

 

O povo havaiano mais do que depressa viu que tudo viraria um circo e já em 68, fez sua primeira vítima histórica, o próprio legend ?Rabbit? Bartolomew tomou um ostensivo ?esfrega? e aprendeu que tudo bem vir ao Hawaii, mas querer sero xerife da aldeia não dá certo!

 

Não sou a favor de localismo! É uma linha muito tênue entre ordenar e desordenar as coisas usando esse método. Não inventaram um meio de controle para o que acontece entre os meses de outubro e março!

 

O Hawaii já não é o lugar para surf diversão! O que digo é que se você quiser vir e pegar a onda da sua vida, ficar ali no meio de um crowd muito bizarro e perder um bom tempo, com sorte você a terá. Mas existe inúmeros lugares onde você pegará várias excelentes ondas sem o mesmo stress!

 

Voltando ao filme, levei minha esposa para assistir porque acho muito importante a impressão de alguém totalmente fora do meio ?surfistico?.

 

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Bustin Down The Door conta a história da temporada havaiana de 1968/69. Foto: Luiz Cláudio Duda.

Reparei que até ela percebeu o jeito com que Shaun Tompson, Mark Richards, Rabbit, entre outros, falavam do surf!

 

Para eles o surf é como um ente querido, um ser vivo! Infelizmente, vejo isso cada vez menos. Hoje o que mais vejo são os ?posers? do surf. Às vezes acho que pego pesado no texto, mas se eu não escrever quem vai escrever?

 

Temos colunistas de calibre, mas voltando é realmente um problema. É um tal de leske, loski, batida na parede, sinais com a mão, um show completo. Mas na hora do vamos ver… nada!

 

E o pior, são esses que mais cobram de tudo e de todos. Não sabem do passado, não surfam no presente e bagunçarão no futuro.

 

Mesmo nas cenas em que os ídolos Slater, Irons, Machado comentam no filme, ainda dá para perceber uma diferença na forma de tratamento no amor ao esporte!

 

Os surfistas atuais, envolvidos em planos de marketing, milhões de dólares em salários e bônus, esse tipo de pressão acaba tirando um pouco do verdadeiro felling. Tudo agora é uma máquina!

 

Máquina da campeonatos em ondas boas, máquinas de filmes, bermudas com nomes de banda, sapatos com nomes de surfista, surfista que vira cantor (e muito bom por sinal), enfim, o surf virou moeda corrente.

 

Ainda falta um meio de passar isso para a telinha de forma verdadeira, porque não agüento essa formula de gatinha apresentando programa. Mulher bonita é bom de se ver, gírias copiadas da ?Malhação? e colocadas na pauta do programa, isso já era! Temos nossa própria forma expressão, não é?

 

Mas como ia dizendo a respeito desse documentário, acho que o surf não é mais para os surfistas!

Perdemos para nós mesmos! Com cada vez mais interesse pela mídia, multinacionais, canais de TV, mais se vende a alma ao ?vocês sabem quem?.

 

Não que as empresas não ajudem. Ajudam e muito. Mas o problema é que quando começa a entrar muitas ?verdinhas? na jogada é difícil encontrar quem resista.

 

Nesses 22 anos que surfo de pé, deitado, de jacaré, de caiaque, stand-up, já acompanhei muitas mudanças. Estamos em uma fase perigosa para nós que amamos nosso esporte. Uma fase que a bruxa já viu que nossos dedos estão gordinhos e que estamos prontos para sermos triturados. Estão aí e, estarão cada vez mais atrás do nosso suado dinheiro.

 

Fique de olho, porque com consciência ainda podemos fazer o mercado ver que não somos robôs e que temos opinião e desejos próprios. O felling de quem surfa é único e vamos manter isso.

 

Destaque total para a cena final do filme. Não vou contar, mas foi impressionante como em um cena um cara demonstra todo o sentimento por tudo que o surf lhe deu.

 

E lembrem que, quem não conhece o passado atrapalha o futuro.

 

Boas ondas!

 

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