Tentem pronunciar ?Lower Trestles?. Olhando assim parece fácil, duas palavrinhas curtas, mas tenho certeza que você enrolou a língua aí pra falar, não sabe ao certo o sotaque e percebeu que não é tão simples como aparenta.
A onda da Califa é a mesma coisa. Para quem olha pela transmissão webcast a vala perfeita parece uma onda tranqüila, um point break seguro, ondas não tão grandes e fáceis de arrepiar. E é mesmo, a onda é digna de performances arrasadoras, onde todos poderão soltar o repertório de manobras com força, estilo e precisão.
Mas é uma onda rápida e forte. Nada comparado às preciosidades de Pipe, Teahupoo, Cloudbreak ou Padang, claro que não. Mas uma das ?piores? ondas do tour, ainda é muito melhor do que a maioria das ondas do WQS.
Bem, nem preciso dizer que é a casa do rei Careca. Pode não ser na costa de sua moradia, mas titio Slater vai competir mais uma vez diante do seu povo e em território totalmente amigo. Se no Brasil ele é ovacionado como em lugar algum no mundo, lá não deixa de ser diferente. Só que lá ele entende os gritos das tietes, em terras brasilis não! Mas isso não importa, seu reinado no surf tem sido comparado ao de Pelé no futebol, ultrapassou idiomas e fronteiras.
As tranças do rei Careca em forma de cortinas de água voando para trás da onda estão prestes a tirar o sono de seus adversários uma vez mais, sejam os que lutam pelas primeiras posições do ranking ou pelos desesperados da zona de rebaixamento. Ele foi o campeão na Califa no ano passado e não é mole derrotá-lo no ?quintalzinho?.
Falando nisso, vocês já devem ter percebido que os surfistas do WCT que não conseguiram bons resultados até agora, já pularam pra divisão de acesso no desespero de conseguir manter-se na elite utilizando essa ?facilidade? que o regulamento da ASP permite.
Particularmente não concordo! Imagine se os times de futebol da primeira divisão na zona de rebaixamento pudessem disputar jogos na série B para ganhar pontos e se manter na série A do ano seguinte. Claro que estou fazendo uma comparação bizarra. Mas se o atleta está na primeira divisão, que se vire nela. Quem é bom de verdade que se mantenha por lá mesmo. Quem não for… volta pra segundona e rala novamente. Só assim a renovação é justa e abre caminho pra novos talentos.
Por exemplo, se surfistas com as características de Jihad e de Pedro Henrique disputassem todo ano todo o WQS, a chance de serem campeões mundiais seria enorme, mas no WCT eles não têm chance, pois seus estilos de surf não se adaptam às condições de mar do WCT.
Jihad em Jeffreys surfou em paralelo com a onda. Esse tipo de ataque ficou na década passada e agora só os tubos que continuam a ser feitos em paralelo. O resto é tudo perpendicular. É pancada reta e rabetada onde antes só se via floaters e rasgadas.
Em compensação vi o mesmo Jihad surfando em duas etapas do WQS em beach breaks de 1 metrinho que fiquei chocado, pensei ‘caramba, esse cara surfa muito, deveria se dar bem no WCT!’. Mas esse tipo de pensamento é exatamente o errado que está na cabeça de nós torcedores brasileiros.
Vários de meus amigos dizem ‘fique de olho em fulano, fique de olho em ciclano, esse vai ser bom, esse tem linha de surf’. Sim, ele vai ser bom, mas bom em que condição de mar?? A linha de surf sem a matação de barata, vários já têm, mas vai surfar Padang ou Pipe treinando somente na Joaca, Silveira, Noronha, Ubatuba ou praia do Forte. São ondas ótimas, concordo, mas só preparam mesmo para o WQS. O resto é conversa fiada.
Quem tem realmente talento, ou treina desde cedo, ou vai dançar no vai-e-vem entre o WQS e o WCT, como estão fazendo a maioria de nossos atletas já faz tempo.
Com exceção de Mineiro com seu foco, força, concentração, preparação e modernidade no surf, o resto dos guerreiros continua na rabeira do ranking e isso incomoda demais quem veste a camisa e acredita no surf dos atletas. Mas se for pra ficar ali só pra ser saco de pancada de gringo, então fiquem de uma vez no WQS e tragam taças para casa.
Assim como Bruno Santos depois de vencer no Tahiti, quem deu uma lição de humildade e de jogar limpo foi nosso ?hermano? Tiago Pires. Exibindo seu ?bigodon? digno de Joaquim da Padóca, o portuga concedeu uma entrevista de arrepiar no dia seguinte à sua vitória sobre Slater em Bali. Ele revelou detalhes íntimos de quem realmente sente a pressão de surfar contra os tops alienígenas e não escondeu a felicidade absurda de vencer ao ídolo.
Enquanto isso a marra e as desculpas de falta de sorte prevalecem nas declarações de nossos atletas.
Li inúmeros artigos antes de Jeffreys que era a hora das direitas e que nossos regular footers iriam mostrar ao que vieram. Que piada boa…
Vamos a Trestles desesperados e sob a pressão de posições duvidosas