WCT carioca: lembranças de um passado glorioso

Visual Arpoador (RJ)

O Arpoador foi a sede de uma das edições do WCT no Rio de Janeiro. Foto: Luis Henrique Leitão.

O Rio perdeu o WCT. A notícia abriu minha caixinha pobre de memórias pessoais: a satisfação ao ver Teco vencer para uma multidão ensandecida de mais de 10 mil pessoas; o surfe-treino dos sonhos ao lado do ídolo Carroll numa sexta sem aula na Barra; os amigos fissurados que filmaram todas as edições do evento (imagens que agora ganham ares de posteridade); a subversão da subjetividade na final entre Potter e Macaulay; o suor de Peterson; o tubo+floater de Slater…

 

Eu queria explicações, queria saber o que todos achavam. Perguntei a quem confio, Fabinho Gouveia.

 

“Fala, Tulio. Tudo bem? Mano, tal como a mudança para Saquá, acho que só o tempo vai dizer se foi melhor. Mas, em minha opinião, acho que vai ser um evento mais tranqüilo para surfistas, pois no Rio é muita badalação extra surfe. Só que essa badalação é foda, né? Sai na imprensa para caramba e não sei se em Floripa teremos a cobertura de mídia em geral tal como temos no Rio. Na real, já teríamos que ter dois eventos no Brasil: um no Rio e outro em qualquer lugar. Ou Noronha ou Floripa mesmo. Mas a mudança será válida também para ver se os gringos gostam, pois a maioria não gosta do Rio e alguns deles não vêm todas as vezes. Agora, me fala, você como repórter, qual a sua opinião?”

 

Para Fábio Gouveia ainda é cedo para comemorar a mudança de endereço da etapa brasileira do mundial. Foto: Grant Ellis/ASP.

No pandemônio da redação, entre senhoras queimadas em Botafogo e peixes mortos no Paraíba do Sul, eu tinha a obrigação de dar uma resposta ao e-mail do Fabinho. Sem subsídio nenhum e apressado, escrevi a primeira coisa que me veio na cabeça, mais ou menos assim (não guardei o e-mail):

 

“Como jornalista, acho que o governo do Estado de Santa Catarina é hoje mais comprometido com o surfe que o do Rio (e por isso merece o evento); como carioca, acho lamentável; como surfista (amador, claro), penso que o Brasil já deveria ter dois eventos há muito tempo. Um no Rio.”

 

Que coisa vazia. Faltava informação. No fim de semana, liguei para a Leilane Barros, dona da bola aqui no Rio. Dez telefonemas depois, resumo tudo para vocês. Ela nem foi à reunião da ASP, onde teria que pagar a taxa de homologação da etapa, de US$ 25 mil. Viu que o governo do Rio não pagava nem o décimo terceiro para seus funcionários, sentiu que não teria as cotas de patrocínio fechadas e decidiu abrir caminho para os catarinenses, que estavam com tudo na mão. Desistiu depois de muita luta, mas também porque tinha outros planos pessoais.

 

O havaiano Kalani Robb levantou a taça em 2000, na Barra da Tijuca, com Neco em terceiro. Na ocasião, Sunny Garcia garantiu o título mundial. Foto: Ricardo Macario.

A Federação de Surfe do Rio gritou indignada, com a sua razão. Não foi ouvida na transferência do evento para Saquarema, não foi ouvida na entrega da licença para Santa Catarina. Não tiveram chance de buscar grana para o evento, de tentar mantê-lo no Estado.

 

Não seria fácil, e os dirigentes cariocas sabem disso. A licença de três anos foi concedida para Teco Padaratz, que já é visto pelos cartolas da ASP como um futuro e bem-sucedido executivo do surfe, antes mesmo de terminar sua carreira como top do WCT.

 

Pesou contra também a opinião dos surfistas e dirigentes sobre a etapa de Saquarema. Nada contra a cidade ou os nativos. Muitos menos contra as ondas. Mas a cena do Al Hunt, ex-diretor de circuito da ASP, pelado numa cabine de polícia não deve ter sido das mais agradáveis. Quem conta o caso é Roberto Perdigão, diretor regional da ASP na América Latina:

 

“Eu sempre fui um dos maiores incentivadores da ida do WCT para Saquarema. A cidade tem ondas de qualidade internacional e isso faz diferença. As maiores críticas ao evento foram feitas pelos próprios surfistas e pela diretoria da ASP em relação aos preços abusivos cobrados pelas pousadas e hotéis da cidade no fim de semana do evento.

 

Teco Padaratz é o novo licenciado do WCT no Brasil, e já dá pistas do que irá fazer quando se aposentar. Foto: David Husadel.

Além disso, a Polícia Militar ficou de plantão na estrada dando geral em todo mundo e achacando tanto surfistas e organizadores como a própria diretoria da ASP, com gerais vergonhosas e imorais. O Al Hunt teve que ficar pelado na guarita da PM chegando em Saquarema.”

 

Agora está explicado. É o fim de um casamento de 15 anos – a etapa está desde 88 no Rio, com a primeira vitória de Macaulay. É também o início de uma nova história, que tem tudo para ser bem contada – no Sul, em terra de povo hospitaleiro e com altas ondas.

 

O Rio vai aprender a viver sem o WCT, pelo menos nos próximos três anos. Até porque, vão-se os gringos, mas ficam para sempre Itaúna, Arpoador, Prainha, Pontão, Barra…

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