Leitura de Onda

Xadrez sob pressão

Volcom Pipe Pro 2014, Pipeline, Hawaii

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Daqui até a decisão do título, de 8 a 20 de dezembro, a temperatura e a pressão chegarão a níveis estratosféricos no arquipélago havaiano. Foto: Bielmann
 

Falta pouco para o Brasil inteiro parar dentro dos salões de Pipeline. Os amigos fissurados não falam de outra coisa, a grande imprensa nacional já faz as malas para trabalhar pela primeira vez no Havaí e muitos surfistas já estão no arquipélago. Gabriel Medina, o pivô dessa revolução no surfe brasileiro, acaba de finalizar os treinos funcionais em São Paulo para seguir ao North Shore.

O foco é treinar em Pipeline até o dia 8 de dezembro, quando começa o evento mais importante do ano, mas na última hora ele decidiu arrumar um tempo para competir no Prime de Sunset, onde fez final em 2012. O movimento surpreendeu a todos, até pelas declarações recentes de que se pouparia para Pipeline.

As expectativas são grandes em torno da possibilidade do primeiro título. A ansiedade é tanta que tem amigo achando que os demais integrantes da esquadra brasileira vão contribuir para dar o título ao garoto de Maresias. O seed deve favorecer, por exemplo, o encontro de um dos candidatos com Raoni Monteiro. Se ele cair com Mick Fanning ou Kelly Slater, dizem os torcedores, vai vencer a primeira bateria na temporada de 2014 do WCT.

E se um deles cair com Gabriel? Bom, antes que alguém ache que é possível deixar o garoto ganhar, Miguel Pupo, que ano passado fez um quinto lugar em Pipeline e é o melhor amigo do líder entre os surfistas da elite, dá o recado:  “Já imaginei a situação. Para mérito dele e por questões profissionais, eu optaria por levar a sério. Tenho certeza de que ele iria preferir competir assim. Mas, claro, o melhor é não competir com um amigo.”

O evento, por enquanto, tem baixas confirmadas e outras dúvidas. Taj Burrow está fora. Contundido no ombro, o australiano aproveitou para fazer uma cirurgia em Los Angeles, com expectativa de três meses de repouso para recuperação. Adriano de Souza, recuperando-se de ruptura de ligamento do joelho, também desfalca o evento. CJ Hobgood e John John Florence, também contundidos, ainda não confirmaram nem descartaram presença.

Já Slater, que se apresentou à mídia recentemente com dois dedos do pé quebrados, anda às voltas com o seu velho jogo psicológico. Afirmou, esta semana, que precisará de mais algum tempo para se recuperar, e que torce por alguns dias de flat na janela do evento.

Ele sabe como ninguém criar um cenário heroico de drama, suspense e incerteza em torno de seu nome e, depois, surpreender. Parece Odisseia de Homero.

Lembro-me de uma vitória dele em Bell’s Beach, em 2010, quando ele deixou vazar para a imprensa que estava com uma fratura no pé. A praia inteira ficou comovida. Divulgaram, por fim, que tratava-se de uma microfratura, chamada de hairline, exatamente por ter a espessura de um fio de cabelo. Poderia doer, mas não inviabilizaria o surfe. Não importa: àquela altura, a praia inteira torcia pelo herói, que venceu de pé quebrado.

Quem tem cabelo branco ou é calvo lembra de Michael Ho, em 1982, vencendo o Pipe Masters com o braço direito engessado. Detalhe: o cara era regular, e, na época, o grab-rail era uma necessidade para entubar de backside.

Alguém em sã consciência imagina Kelly Slater, o mais feroz competidor da história, abandonando a disputa do título em Pipeline por causa de dois dedos quebrados? Eu me arriscaria a dizer que ele surfaria até sem os tais dedos.

Enquanto isso, Mick Fanning, em silêncio, treina silenciosa e obsessivamente no Havaí. Chegou às quartas no Prime de Haleiwa sem fazer muita marola.

Do lado brasileiro, Gabriel se esforça para vencer também o excessivo assédio da mídia e de outros públicos, consequência direta do sucesso no Brasil. A família, no entanto, já avisou que o garoto será blindado e só vai falar após os eventos.

Na casa da Rip Curl, onde Medina vai ficar, ao lado de Fanning, o clima será tranquilo. Quem garante é o CEO da empresa no Brasil, Felipe Silveira:

“Gabriel faz parte do time de elite da Rip Curl desde os 16 anos. Já viajou e participou de vários projetos com Mick, Owen, Wilko. Tem ótimo relacionamento com todos na Rip Curl Internacional. Divide a casa com a equipe internacional há vários anos, inclusive com o apoio especial do Mick. Gabriel esteve com ele no Havaí no último título mundial e vibrou junto. As condições são as mesmas, e não existe preferência”, explicou.

A sorte está lançada. Daqui até a decisão do título, de 8 a 20 de dezembro, a temperatura e a pressão chegarão a níveis estratosféricos no arquipélago.

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