Encontramos o ex-top do CT Victor Ribas acompanhando seu filho Lucas (20 anos) durante o Lay Back Pro, etapa do QS 1.000 disputada na semana passada na Prainha, Rio de Janeiro (RJ). Trocamos uma rápida ideia com Ribas sobre sua atual função de pai-técnico, a relação com a Prainha, e claro, julgamento dos circuitos promovidos pela World Surf League (WSL).
Muita gente se lembra de Ribas por conta de sua habilidade em surfar ondas pequenas, contudo, o cabofriense foi vice campeão do Globe Fiji 1999, etapa do circuito mundial vencida por Mark Occhilupo, campeão mundial daquele ano.
Na ocasião, competindo com nomes como Andy Irons, Kelly Slater, CJ Hobgood, entre outros de sua geração, o surfista de Cabo Frio (RJ) carimbou seu nome surfando esquerdas perfeitas, com até 3 metros na rasa bancada ao Sul do Pacífico. As condições estavam clássicas e Ribas mostrou todo seu conhecimento e go for it.
Confira a seguir a entrevista com essa lenda do surfe brasileiro.
Como você está se sentindo na função de pai-técnico?
Acaba que eu fico até mais nervoso que ele, né. Venho já acompanhando o Lucas há um tempo. Ano passado a gente veio para esse mesmo evento e este ano acho que está muito mais motivado (em tempo, Lucas finalizou o evento na 13ª posição).
Em termos práticos, como funciona a relação, você chega a opinar em detalhes como a escolha das pranchas, por exemplo?
Eu falo algumas coisas, mas ele tem sua opinião própria e vai sempre pela cabeça dele. Eu sempre filmo bastante o free surf e depois a gente conversa pra caramba, penso que está no caminho certo. Ele começou a levar o surfe a sério com 14 anos e hoje está com 20, e o nível do Brasil está bem forte, tem que correr atrás. Ele está conseguindo dar dura na galera da turma dele e vamos apostar. Cada campeonato uma evolução, cada dia, um dia. Vamos ver o que vai acontecer.
E você após vários anos vendo a Prainha voltando a sediar uma etapa do QS, o que isso significa pra você?
É muito legal a Prainha sempre foi um dos principais palcos do surfe brasileiro, já tivemos campeonatos super importantes aqui, até etapas do mundial da primeira divisão, e é muito bom poder voltar aqui e ver a galera surfando muito, o nível está absurdo.
O Lucas me acompanhou, mas eu já estava mais no fim da carreira, mas ele sempre vê as fotos na casa da minha mãe. Tive momentos memoráveis aqui como a final entre eu e Plínio (Plínio Ribas, irmão mais jovem de Vitinho, considerado um fenômeno nas marolas, deixou o surfe por conta de problemas pessoais) aqui no Limão Brahma (Circuito Estadual do Rio de Janeiro, nos anos 1990, disputado por surfista do Brasil inteiro). Ele pergunta como era o campeonato, como era. Vejo outras gerações, o filho do Fabinho (Ian Gouveia), do Toledo ( Filipe Toledo), e a gente tenta passar o melhor para nossos filhos. O Lucas tá no caminho.
Falando da parte mais técnica, como vocês escolheram a prancha para hoje (entrevista realizada no dia 7 de junho de 2023)?
O Ricardo (Martins) vem fazendo um trabalho com o Lucas já há algum tempo e ontem ele surfou com essa prancha novinha e se sentiu muito bem. Ele tá gostando e vai botar na água pra ver como irá funcionar na bateria.
Com toda sua experiência e conhecimento da Prainha, qual seria sua tática?
Eu procuraria pegar uma onda mediana, não precisa ser uma da série, porque ela tá meio gorda. Eu apostaria na direita e tentaria ia procurar fazer duas manobras fortes. Meter uma manobra logo de saída, porque a onda tem um volume e quem conseguir dar essa manobra forte, jogando água, estará em outro patamar.
Saindo um pouco do QS da Prainha, não tem como a gente falar com você, um cara que já passou por situações semelhantes, e não te perguntar o que você acha das últimas polêmicas sobre o julgamento no CT da World Surf League (WSL) e essa espécie de desconstrução da história do surfe brasileiro.
Eu vejo que o surfe é um esporte muito subjetivo. O regulamento deu uma evoluída mas acontecem ainda pessoas que acham que é justo e outros não. Acho que esse campeonato na piscina é um campeonato fácil de julgar, porque é uma onda parecida com a outra, na realidade igual.
A direita é diferente da esquerda, mas é bem fácil de distribuir as notas e analisar com calma. Tem um critério estipulado, mas sempre vai ficar nas mãos de cada juiz. Na minha opinião a gente teria que ter mais juízes, cada um na sua salinha, sem juiz central, ou dead judge.
Isso não dá mais já acabou o tempo deles, chega de head judge! Tem que ter vários juízes, 10, 12, de diversos países, e assim a gente vai chegar em uma decisão melhor. Vejo a Ginástica Olímpica, por exemplo, que apesar de eu não entender, vejo que não há polêmicas e praticamente ninguém contesta as notas, mesmo sendo um esporte subjetivo, tendo as notas de saída.
Relembrando, e aquele polêmico episódio em 1993, durante uma etapa do WQS, em Maresias, (nota no rodapé abaixo) no qual o Todd Holland te marcou. Naquela época já havia prioridade?
Sim, naquela época já tinha prioridade. Mas a partir daquele incidente, o cara que faz duas interferências tem que sair da água, virou uma regra. Demorou um ano inteiro para os caras classificarem aquilo como anti desportivo, mas pelo menos reconheceram o erro.
E normalmente os brasileiros são acusados de atitudes dessa natureza. O que estava em jogo?
Era minha classificação para o CT. Eu precisava daqueles pontinhos para chegar nas etapas do Havaí tranquilo, sem precisar de muito resultado. Fui eliminado e acabou que cheguei no Havaí, passei umas baterias no evento de Haleiwa e me classifiquei. O que eu acho é que o surfe precisava evoluir suas regras naquela época e hoje essa melhora segue sendo necessária.
(abaixo dois anos após o fatídico episódio, Vitinho fazendo a mala de Holland e vencendo o Gotcha Lacanau Pro, etapa do CT disputada em Lacanau, França, em 1995)
*Em 1993 o norte-americano Todd Holland cometeu uma interferência e, sem chances de classificação, passou a perseguir Ribas, impedindo que o brasileiro surfasse, com a intenção de ajudar os outros estrangeiros na bateria (Ross Clark dependia de um bom resultado para se manter no WCT). Inflamados pelos comentários de Taiu na locução, o público na praia quis avançar em Holland, que permaneceu na água após a bateria e saiu somente com proteção dos seguranças. No caminho do palanque recebeu areia na cara e três socos na cabeça. Segundo a matéria (que tem o título “A farra do bode”), Holland raspou a barba e saiu de Maresias anônimo.
Fonte: Postagem Data Surfe fazendo alusão à matéria de cinco páginas na edição nº 98 da revista Fluir (dezembro/1993), com texto de Adrian Kojin e fotos de Sebastian Rojas.