Tragédia

Incêndio devasta Maui

Confira o depoimento do brasileiro Pedro Robalinho, morador da ilha havaiana de Maui que foi atingida por um intenso incêndio sem precedentes.

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A população de Maui foge do fogo.

Na última quarta-feira (9) milhares de residentes do Havaí correram para escapar de suas casas em Maui enquanto as chamas varriam a ilha, destruindo partes de uma cidade centenária e matando pelo menos 36 pessoas em um dos incêndios florestais mais mortais dos Estados Unidos nos últimos anos.

O fogo pegou a ilha de surpresa, deixando para trás carros queimados em ruas antes movimentadas e montes de escombros fumegantes onde prédios históricos haviam ficado em Lahaina Town, que remonta ao século XVIII e tem sido há muito tempo um destino turístico. As equipes lutaram contra as chamas em vários locais da ilha e as chamas forçaram alguns adultos e crianças a fugirem para o oceano.

A marina devastada pelo fogo.Mason Harvi/ Reuters
A marina devastada pelo fogo.

Pelo menos 36 pessoas morreram, de acordo com um comunicado do Condado de Maui na quarta-feira (9) à noite, que afirmou que outros detalhes não estavam disponíveis. Autoridades disseram anteriormente que 271 estruturas foram danificadas ou destruídas e dezenas de pessoas ficaram feridas. O incêndio florestal em 2018 na Califórnia matou pelo menos 85 pessoas e praticamente reduziu a cidade de Paradise a cinzas. Autoridades alertaram que o número de mortos no Havaí poderia aumentar, com os incêndios ainda em chamas e equipes se espalhando para procurar áreas carbonizadas.

Cena da devastação causada pelo fogo em Maui.Junstin Johnson / Reuters
Cena da devastação causada pelo fogo em Maui.

O prefeito do Condado de Maui, Richard Bissen Jr., disse que a ilha foi “testada como nunca antes em nossa vida”.

“Estamos lamentando juntos durante este momento inconsolável”, disse ele em uma declaração gravada. “Nos próximos dias, seremos mais fortes como uma ‘kaiaulu’, ou comunidade, enquanto reconstruímos com resiliência e aloha.”

Brasileiro dá depoimento – Conversamos com o brasileiro Pedro Robalinho, que desde 2016 reside em Lahaina, Maui, um dos focos mais intensos do incêndio que arrasou a ilha havaiana na última quarta-feira. Em seu relato o brasileiro conta que perdeu praticamente tudo em termos materiais, mas que já está abrigado em uma casa de americanos. Atualmente ele mantém sua escola de surfe em parceria com sua esposa, Rafaela, que também é instrutora de yoga. O casal têm duas filhas, Alana, 12 anos, e Mila, 9. Confira o relato emocionado de Robalo.

Robalinho abandona a cidadeArquivo pessoal
Robalinho abandona a cidade

Como está sendo a rotina após a catástrofe?
Robalinho – Neste momento que falo com você estou chorando irmão…Estou aqui fazendo compras e cada coisa que eu compro me emociono. Acabei de comprar um guarda sol novo, pois é um material fundamental pra eu trabalhar na praia para um recomeço mesmo. Sobre tudo que aconteceu, até agora estamos realizando, pois aqui é um lugar em que os avisos realmente funcionam, mas dessa vez acho que as autoridades talvez tenham subestimado a potência desses ventos. Acho que as coisas foram acontecendo em uma cadencia muito rápida, e acabou trazendo risco nesse nível e causou essa catástrofe que acho que é sem precedentes em Maui. O incêndio foi muito brabo.

Mapa de satélite da Nasa mostra focosNASA Maps.
Mapa de satélite da Nasa mostra focos

Foi a primeira vez que testemunharam um incêndio em Maui?
Robalinho – Já enfrentamos um incêndio há cerca de três ou quatro anos. Naquela ocasião, recordo-me de termos abandonado a casa às 1h30 da madrugada. Na época, residíamos na área mais alta de Lahaina, próximo às montanhas. O fogo ocasionalmente se espalha por Lahaina, mas as chamas geralmente não ameaçam as residências ou a cidade diretamente. Desta vez, a situação foi bem diferente, com múltiplos focos de incêndio. Inicialmente, estávamos mais tranquilos, enfrentando apenas os ventos intensos que vira e mexe nos assustam. Eu acreditava firmemente que nossa casa e região estariam seguras. Nunca imaginei que isso ocorreria.

Visão da casa de Robalo antes da evacuação da áreaPedro Robalinho
Visão da casa de Robalo antes da evacuação da área

Conseguiram salvar algo da casa a tempo?
Robalinho – Pude pegar apenas minha mochila com meu iPad novo, meu celular e documentos. Surpreendentemente, durante esse momento de sobrevivência, agarrei um skate novinho (rs), embora tenha olhado para minha pranchinha novinha de carbono, que desejava estrear, mas preferi não arriscar. Naquele instante, minha mente estava focada em sobreviver. Já havia removido meu carro de debaixo de uma árvore e estava em total estado de alerta. O vento foi o mais forte que já presenciei, com rajadas registradas a até 94 km/h.

Qual foi o momento em que decidiram que era hora de fugir do fogo?
Robalinho – Inicialmente achamos que seria mais um daqueles ventos nos quais já estávamos acostumados. Minha esposa sugeriu irmos para a casa de amigos do outro lado da ilha, mas declinei. No entanto, a situação continuou a se agravar e por volta das 16h avistamos uma densa nuvem de fumaça escura se deslocando em nossa direção a partir do centro da cidade. Ao ver aquela nuvem espessa, percebi a necessidade urgente de partir, temendo a possibilidade de sufocamento caso a fumaça nos alcançasse. Reunimos o que pudemos e partimos de carro. Surgiu a dúvida se deveríamos retornar para buscar mais pertences, mas o tráfego congestionado nos fez lembrar da cena do Titanic na qual pessoas acabam morrendo por conta de terem voltado para pegar seus pertences. Continuamos a avançar, contornando postes caídos, árvores quebradas, um verdadeiro cenário de catástrofe.

Antes e depois na Marina em MauiReprodução internet
Antes e depois na Marina em Maui

Onde vocês estão abrigados?
Robalinho – Eu, minhas filhas Mila, de 9 anos, Alana, de 12 anos, e minha esposa Rafaela Bentes estamos abrigados na casa de amigos americanos. Os filhos deles são amigos de nossas filhas e tem  sido muito bom perceber que podemos contar com amigos tão solidários. Eles são guerreiros como nós, pessoas que não possuem riquezas abundantes, mas nos receberam com generosidade e apoio. Mantemos nosso ânimo, planejando visitar nossa casa para avaliar os estragos, embora imagens aéreas sugiram uma devastação total. Sofri a perda de cerca de 50 pranchas, incluindo aquelas que utilizo para dar aulas, bem como meu HD contendo imagens de anos de trabalho e momentos históricos. Essa perda me deixou bem triste pois representa não apenas um trabalho, mas também lembranças preciosas. Mas vamos nessa, estamos focados em seguir em frente, superando mais essa série na cabeça. Seguimos remando e pensando positivo.

Como foi a reação da cidade como um todo?
Robalinho – A eletricidade caiu desde cedo e acho que isso foi até bom porque as pessoas estavam em casa por causa da falta de luz. As aulas começariam hoje e por conta do que aconteceu nem escola as meninas têm. Ainda não sabemos se elas terão outra escola ou se receberão algum suporte em casa. Ainda há várias dúvidas.

O que você diria que ficou após tudo isso?
Robalinho – Desejo que essa história seja inspiradora para ajudar a outras pessoas que perderam tudo entender: o que realmente nos importa nessa vida não são as coisas materiais. No mais, vamos em frente sempre pesando positivo. Começamos uma pequena campanha para nos ajudar a recuperar esse preju.

Quem puder dar essa força, segue nosso PIX: Cpf 073486077-30

Causas do incêndio – Os incêndios foram impulsionados por fortes ventos do furacão Dora, que passou bem ao sul. Isso é o mais recente de uma série de desastres causados por condições climáticas extremas ao redor do mundo neste verão. Especialistas dizem que as mudanças climáticas estão aumentando a probabilidade de tais eventos. Os incêndios no Havaí são diferentes de muitos dos que estão queimando no Oeste dos Estados Unidos. Eles tendem a se espalhar em grandes pastagens nas partes secas das ilhas e geralmente são muito menores do que os incêndios no continente. Um grande incêndio em Big Island em 2021 queimou casas e forçou milhares de pessoas a evacuar. Big Island também está atualmente enfrentando incêndios.

Fonte AP

Agradecimentos Pedro Robalinho e família.