Filipe Toledo

Escalada para o topo

Filipe Toledo abre o jogo sobre a difícil caminhada em busca do primeiro título mundial.

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Em 2018, Filipe Toledo venceu duas etapas e chegou bem próximo do título mundial.

Terceiro melhor surfista do mundo no ano passado, o brasileiro Filipe Toledo chega novamente como um forte candidato ao título do Championship Tour nesta temporada.

Em entrevista ao jornalista Fábio Maradei, ele fala sobre as expectativas para o Circuito Mundial, o balanço sobre a temporada anterior, a preparação, o que quer e precisa fazer, a importância da família e vaga olímpica.

Confira na entrevista abaixo.

Como está a expectativa para esta temporada, depois de, novamente, ter chegado tão perto do título?

A expectativa é a melhor! Ano passado tive um ano de experiência, de mudança para mim, em todos os aspectos da minha vida e acho que esse ano, com um pouco mais de experiência, sólido nesse sentido, a expectativa é sempre a melhor e vou tentar brigar pelo título mais uma vez.

Chega confiante para disputar o título?

Sem dúvida, a confiança é grande para chegar no Havaí disputando o título e tentar essa taça.

Ficou em sentimento de frustração, de poder fazer mais em 2018?

Eu acho que de repente em alguns momentos sim. Poderia ter feito algo melhor, mas tudo o que eu consegui alcançar em 2018 foi realmente muito gratificante. Então, apesar de não ter ganhado o título, eu me senti muito feliz com a minha performance, meu desempenho, minha evolução.

Radicado na Califórnia, ele promete evoluir ainda mais nesta temporada.

Você fez essa reflexão de 2018 e poderia mudar alguma coisa? Fazer algo diferente?

Não sei alguma coisa diferente, porque tudo o que fiz, achei que foi muito bom. De repente acho que evoluir em alguns pontos, me dedicar um pouco mais e treinar um pouco mais. Acho que nesse sentido, poderia ter sido um pouco diferente.

Você se cobra disso? De querer treinar mais, sempre querer mais?

Sem dúvida! Acho que a cobrança tem de estar presente, no limite, claro. É o que mantém a gente focado e batalhando pelo sonho.

O que foi mais difícil? A perda do título de 2015 ou de 2018?

Ah, eu acho que de 2015, pelo fato de eu não estar esperando, eu acho. Foi tudo tão natural e, quando me dei conta, eu estava perdendo aquela bateria para o Mason Ho em Pipe. Quando eu vi, estava tudo indo embora e foi tudo muito rápido. Mas 2018 foi um ano planejado, a gente já tinha metas traçadas e já sabia o que poderia acontecer e o que não poderia acontecer. Então já estava preparado psicológica e fisicamente.

E agora 2019, muda algo, renova algo, chega diferente?

Acho que sim! Pega o que 2018 trouxe para gente e evolui esses resultados. A gente sabe agora como funciona, o que tem de ser feito. Acho que é só evolução, prestar atenção no que errou ano passado, tentar não errar esse ano. Confiança nível máximo.

Você fala em evolução, o que mais você evoluiu nesses anos de Tour?

Acho que na cabeça. A parte psicológica conta muito para um atleta profissional e esse ano de 2018 foi de muita aprendizagem para mim. Teve momentos ali que se não estivesse preparado, não teria conseguido. Acho que se a cabeça está muito boa, o resto flui. Então foi a minha dedicação no Taiti, minha bateria em Pipe, enfim campeonatos que as pessoas não imaginassem que eu fosse me dar bem, eu acabei me dando bem, então foi legal para caramba.

J-Bay é um dos lugares onde o brasileiro se sente mais à vontade no Tour. 
WSL / Tostee
J-Bay é um dos lugares onde o brasileiro se sente mais à vontade no Tour.

Ainda falando em evolução. Em manobras aéreas você é indiscutivelmente um dos melhores do mundo, o que acha que falta para chegar no mesmo patamar em ondas grandes?

Experiência! Evolução, é tempo dentro d’água surfando, dedicação. Eu acho que ainda falta um pouco. E é um dos pontos que a gente tende a melhorar nesse ano e nos próximos anos.

No ano passado você teve uma estratégia no Taiti, chegou antes, infelizmente teve aquela queda, que prejudicou um pouco o treinamento. No dia da etapa, a onda não estava gigante como você tinha treinado antes e pode ter influenciado um pouco, apesar de ter sido terceiro, mas você pensa em fazer algo especial de novo esse ano pensando nas ondas grandes?

Essa mesma estratégia do Taiti eu vou fazer de novo, passar um tempo lá, me sentir familiarizado com o lugar, com a onda, com a bancada. Tenho a ajuda de todos os locais, o que me traz muito benefício, de saber onde é a onda, aquela coisa básica de line-up. Então acho que essa estratégia vai ser muito boa para Teahupoo e me manter focado na evolução dessas ondas maiores.

E temos Saquarema e J-Bay, onde você está se destacando. São ondas que chega confortável, pensando no título mundial?

São lugares que me sinto em casa, são especiais para mim. Me ajuda na hora da performance, de estar dentro d’água, estar confortável, não pensar em mais nada, apenas em surfar. Isso traz benefícios na hora do vamos ver.

Que outra onda pode te trazer benefício na hora da disputa do título?

Todas as outras eu sinto que tenho potencial grande, de poder ter um resultado muito bom. Claro que nem todas eu vou ganhar, mas manter a constância de resultados é muito importante. É o plano: tentar vencer todas, mas no mínimo manter uma regularidade de bons resultados.

Não é ousadia, é confiança querer vencer todas?

Sim, ousadia passa longe. O negócio é ser confiante, determinado, dedicado para tentar realmente vencer todas. Tentar fazer igual o mito Kelly Slater, chegar no Havaí já com o título, John John (Florence) e todos esses caras.

Filipinho durante a brilhante vitória no Oi Rio Pro em 2018.

Você gostou dessa mudança do calendário desse ano, de começar um pouco mais tarde, dar um tempo maior para preparação, para descanso?

Eu gostei, porque a gente tem um tempo maior nessa off season para a gente poder treinar. Essa pré-temporada fica mais tranquila. A gente tem tempo para família, consegue curtir, viajar, alguma trip que a gente não está acostumado a fazer durante o ano e ainda conta com bastante tempo para poder treinar. Eu acho que esse tempo foi realmente necessário para a gente.

Nas etapas que você sonha vencer, tem alguma que pode ser o fiel da balança?

Nessas de ondas tubulares, são etapas que tenho de ir bem, para poder manter o título bem pertinho. Pipe e Teahupoo são duas ondas que realmente tenho que me dedicar bastante para melhorar e ter um resultado bom.

Dessas, qual é a etapa que sonha vencer?

Acho que todo mundo sonha vencer o Pipe Masters, por ser um evento muito especial, ter muita história, mas se fosse para escolher uma das duas eu acho que Teahupoo é um evento que eu realmente queria vencer antes de qualquer outra coisa.

Esse ano o John John volta ao Tour. Muda alguma coisa? Acha que dificulta mais? O caminho fica mais complicado tendo ele, ou a dificuldade é sempre a mesma?

Independente dele, a dificuldade sempre vai ter, mas claro que ele é uma pedrinha no sapato a mais (risos). Assim, se você estiver bem treinado, com a cabeça boa e vier onda, não vai desperdiçar a chance, não vai deixar passar. Então, só traz mais emoção para o Tour ele estar de volta.

E o Medina, bicampeão do mundo? Ele ganha mais força? É o cara a ser batido ou entrar todo mundo igual nessa briga?

Bom, tem os dois lados, de ser campeão mundial. Às vezes pode trazer muito benefício no ano seguinte, igual ao John John, que ganhou dois títulos seguidos, ou pode trazer aquela sensação de dever cumprido, ficar mais tranquilo. Não sei te dizer como vai ser, mas sem dúvida alguma por ser o campeão mundial vai ser o cara a ser batido nessa primeira parte do ano, estando com a lycra amarela e tudo mais. Acho que ele é um cara que compete muito bem, é o melhor surfista do mundo na atualidade.

Melhorar em etapas como Pipe e Teahupoo é um dos objetivos do surfista de 23 anos.

Você falou do Kelly Slater, você se inspira em quem?

Cara, eu sempre me inspirei muito no Mick Fanning. Sempre foi um ídolo para mim, dentro d’água, fora d’água, nos treinamentos, em todos os aspectos ele sempre foi um cara que eu me espelhei muito, mas hoje em dia, todo mundo que está no Tour tem algo que eu gosto de assistir, de ver, de observar e tentar fazer igual. Estou sempre buscando aprimorar as minhas técnicas olhando todo mundo um pouquinho, pegando um pouquinho de cada um. Acho que todo mundo tem um talento diferenciado, que é legal você parar e perceber.

Você falou em aprimorar técnica, pode vir coisa nova em 2019?

Acho que sim. O trabalho está sendo esse. A gente está tentando aprimorar todas as técnicas, tanto de tubo, de aéreo, até o surfe de borda. Tem de se dedicar ao máximo, tentar melhorar isso e chegar na perfeição. Claro que a gente depende da Mãe Natureza, das ondas, se o mar fica flat ou não. O importante é quando a chance vier, é não desperdiçar.

Você falou que investiu no lado psicológico, mas também teve o treino físico ano passado. Você fez uma preparação intensa, que refletiu em bons resultados. Esse ano, o treinamento continua intenso, focado em ganhar força física, melhorar nas ondas?

Sem dúvida, o treinamento me deu uma confiança muito grande no ano passado e esse ano a gente mantém. A pré-temporada já começou, a gente está focado no trabalho e agora é manter, continuar trabalhado forte, com o Eduardo (Takeuchi), da Personal Boards, e manter essa constância de treinos para chegar preparado no final do ano, no meio do ano estar 100%.

Voltando ao lado psicológico, tem algum medo?

Todo mundo tem medo. Teahupoo é um medo que todos têm (risos). Claro que tem uns que se sentem mais confortáveis, mas na hora que o calo aperta, todo mundo sente o medo. Todo mundo fala que tem medo de morrer, medo disso, mas meu medo mesmo é não fazer o que tenho de fazer e depois me arrepender.

A gente sempre acompanha o seu lado bem família nas redes sociais. Como é ser pai tão jovem de um casal (Mahina e Koa) e isso fortalece seus objetivos?

Eu acho que nasci para ser pai. Sou suspeito para falar. Amo muito ser pai, meus filhos. Se eu pudesse fazer tudo com eles e com a minha esposa, eu faria. A gente acabou tendo a surpresa da Mahina e depois queria ter mais filhos, conversou, entrou no acordo e decidiu, se vamos ter mais, que tenha já. E a gente já fez outro. E quando passar, já vai de uma vez e fica mais tranquilo. Mas é um sentimento muito bom, me traz muita tranquilidade, força de vontade também, poder mostrar para eles que o pai é profissional. É legal, gosto muito e se puder estar perto deles o tempo todo, eu estou.

Família é um dos pilares para o sucesso de Filipe no circuito mundial.

Qual é a importância da Ananda nessa sua trajetória?

A Ananda é mãezona. Está sempre com eles, na maior parte do tempo, porque estou sempre viajando e ela está cuidando, dando educação necessária, passando tudo que tem de aprender. Eu já perdi algumas fases, por estar no Tour, mas ela está sempre do meu lado, me apoiando. Muitas vezes são momentos difíceis e ela estava do meu lado e sempre vai estar. A Ananda é nota mil.

Você também é muito ligado aos seus pais e seus irmãos. Sempre foi assim, desde o começo. Qual a importância da Mari (mãe) e, sobretudo, do Ricardo (pai)?

Estou onde estou hoje, por conta deles. Eles batalharam por tudo isso. O fato do meu pai ter sido competidor já ajudou muito e eles estavam sempre batalhando, apoiando, fazendo o melhor para que eu pudesse viajar, competir. Enfim, foram eles que começaram a abrir a trilha, para quando eu chegasse com tudo, o caminho estivesse aberto e eu conseguisse alcançar meus objetivos. E é o que está acontecendo agora, eles abriram o caminho e eu estou tentando ao máximo retribuir o favor.

Como é ter o Ricardinho como pai, gestor e técnico ao mesmo tempo?

É legal. Interessante para caramba, porque tem momentos que a gente tem de ouvir ele como técnico, mas pelo fato de ser pai, acaba ouvindo como pai e momentos que tem de ouvir como pai, acaba ouvindo como técnico. Tem de saber distinguir, os momentos certos. É legal demais. Meu pai sempre me deu todo o suporte, me apoiou muito e está sempre pegando no pé. É o Ricardinho. Quem conhece, sabe.

Vamos falar de olimpíada agora. Esse é um ano decisivo para a vaga nos Jogos de Tóquio, de 2020. Todos colocam você como um dos grandes cotados. Está confiante? É um objetivo além do título mundial.

Da mesma forma que estou focado no título mundial, também estou focado nessa vaga olímpica. Seria um sonho realizado poder fazer parte do time e, quem sabe, se Deus quiser, ganhar uma medalha. Seria muito bom para o nosso esporte. Então, foco total na vaga e quero muito poder representar o Brasil.

Para encerrar, quem é o Filipe Toledo hoje?

É um pai, marido, com dois filhos, continua sendo um filhão e muito mais dedicado, muito mais profissional, muito mais experiente e com sede de título mundial. Então, acho que esse ano, se Deus quiser, vai!

Manda um recado para os seus fãs?

Queria agradecer a todo mundo que está sempre torcendo, sempre mandando vibe positiva. Muito obrigado! A temporada já começou forte, os treinamentos já estão a todo vapor e já agradeço de coração todo o apoio. Vamos que vamos juntos, que se Deus quiser no final, vamos comemorar juntos.

Entrevista em vídeo: