Por mais que seja o sonho de qualquer surfista profissional, nem o mais otimista membro da família Pupo poderia imaginar um cenário tão positivo para os irmãos Miguel e Samuel na perna europeia do Qualifying Series (QS).
Miguel, o mais velho, começou vencendo o 10.000 de Pantin, na Espanha, praticamente garantindo o seu retorno ao Championship Tour (CT) em 2020, e Samuel, o caçula, fechou a festa com o título do outro 10.000 em Ericeira, Portugal, saltando da 39ª para a nona colocação, entrando na briga direta por uma das dez vagas para a próxima temporada.
Os dois voltaram para casa, em Maresias, no litoral norte de São Paulo, confiantes, mas com os pés no chão de que ainda faltam as etapas decisivas do Havaí. Apesar de bem encaminhados, sobretudo Miguel, preferem ser cautelosos e esperar para comemorar somente no final do ranking uma possível nova dupla de irmãos na elite do surfe mundial.
Também em comum, enaltecem o apoio mútuo nas campanhas vitoriosas na Europa, a família, que sempre deu total suporte nas trajetórias, e claro, os patrocinadores, que acreditaram e confiaram nos resultados.
Tanto Miguel quanto Samuel vibraram muito com as vitórias, principalmente o mais novo, por ser a sua primeira conquista num QS, logo num 10.000 na Europa, com apenas 18 anos. Como amador, ele garantiu a maioria dos principais títulos, como o Rip Curl Grom Search Internacional (também conquistado por Gabriel Medina), e em seu início como profissional, mostrou estar no caminho certo, com o sul-americano Pro Junior e o terceiro no Mundial da mesma categoria pela WSL.
O mais velho, que apesar de ser considerado muito experiente, tem apenas 27 anos, chegou ao lugar mais alto do pódio pela quinta vez num evento desse porte, mas para ele o título significou a volta da confiança, depois de ficar fora do CT.
Em suas falas, sempre evidenciam a importância dos pais, Wagner Pupo, que foi um grande competidor e hoje é shaper das pranchas que os filhos usam, e Jeane, o “alicerce” de toda a família. E esperam poder vibrar juntos no Havaí e formar uma nova dupla de irmãos entre os top 34 do Mundo, com Miguel podendo passar toda a sua vivência para Samuel.
“Vencer o primeiro QS foi incrível. A primeira vitória não tem preço. É uma felicidade incondicional. Dez mil pontos é muita coisa, mas estava focado em fazer o meu surfe e o que viesse junto era bônus. Disse para o meu pai que queria sair da Europa com chances reais de me classificar no Havaí e o objetivo foi atingido”, diz Samuca. “Ainda não parei para fazer as contas, mas a meta principal no Havaí é passar o máximo de baterias possíveis e quero estar garantido no CT”, acrescenta.
Apesar de já ter vitórias no 10.000, Miguel também comemorou muito, por representar a reviravolta. “Foi demais. Foi a quinta vez que consigo vencer um evento desse porte e, então, eu já meio que sabia o caminho das pedras. Minha última vitória foi em 2015, então a gente acaba desacreditando que é capaz. Mas fui surfando bateria por bateria e quando eu vi, já estava atingindo o pico da minha performance e confiança no último dia de evento”, fala.
“A classificação para 2020 não é 100% ainda, mas estou feliz de estar bem próximo e em ótima posição para carimbar o meu passaporte antes do evento de Sunset. Agora é seguir com o trabalho e deixar as coisas acontecerem”, complementa Miguel, também comemorando muito o feito de seu irmão em Portugal.
Os elogios mostram a parceria dos dois e ele até vislumbra uma futura dupla no CT. “Foi lindo ver meu irmão caçula vencendo o seu primeiro evento profissional. Todos nós já sabíamos do potencial dele. Venceu a maioria dos eventos internacionais da sua idade e isso mostrava que já ia ter um futuro promissor. Agora, as chances de entrar são reais e ele já sabe o que fazer para concluir o objetivo. Então, é só seguir com o trabalho e as coisas vão acontecer”, confia.
“Sempre imaginei nós dois juntos no CT, desde que ele entrou para correr o QS. É quase impossível não imaginar essa possibilidade. Mas depende de vários fatores para que isso se concretizar. Hoje, as chances são reais e só depende da gente para realizar esse sonho, mas seguimos com o trabalho dia após dia e, se tiver de ser, vai acontecer”, reporta Miguel.
Samuel também fala da parceria com o irmão. “Fico muito feliz em estar com ele. Um ajuda o outro. Ele já tem muita experiência no Tour e pode me passar tudo isso. Durante os campeonatos, me dá força e amor de irmão, me ajuda muito na parte mental, me deixa confortável”, afirma.
“Não consigo imaginar ainda estar no Tour com ele. Até estar vivendo aquilo, não tem como pensar, mas vai ser incrível”, revela. “Se eu entrar no CT, claro que o meu irmão vai me ajudar muito. Já fez isso por muito tempo, já passou por isso. Vai conseguir me acalmar um pouco”, argumenta.
Miguel descarta o rótulo de reinado da perna europeia e simplifica os feitos nas duas etapas. “Sem dúvida dominamos parte dos eventos e conseguimos aquilo que trabalhamos para conquistar. Então, o sentimento não é bem de reinado, mas sim de missão cumprida”, sintetiza.
Para o Havaí, o sentimento é tentar garantir boas performances logo de Haleiwa, para depois administrar em Sunset. “É uma etapa boa para mim. Já passei várias baterias no ano que disputei a Tríplice Coroa. Fiz uma bateria muito boa com o Kelly (Slater) e acho que é um lugar que tenho potencial, que posso ir bem longe. Vou focar tudo no primeiro campeonato, para chegar em Sunset um pouco mais tranquilo”, explica Samuca.
Família e patrocinadores Tanto Miguel quanto Samuel evidenciam o suporte da família e patrocinadores em suas performances. Miguel também fala da esposa, Bruna, e das filhas Luna e Serena. “Meus pais são importantes, não só agora. Sempre foram e serão a base da minha vida pessoal e profissional. Eles são os únicos que estavam presente no primeiro contato com o esporte, primeira derrota, primeira conquista, em tudo”, elogia.
“Minha esposa veio para somar e só tem me dado forças desde que as coisas começaram a não dar muito certo. Minhas filhas são o maior presente que o ser humano pode ganhar e tudo isso junto, pais, esposa, filhas, serve de combustível para conquistar algo maior e seguir batalhando. Apesar de já ter ficado oito temporadas entre os tops do CT, ainda tenho 27 anos e muita lenha para queimar”, complementa o irmão mais velho.
Samuca vai na mesma linha e também lembra a irmã, Dominik. “Família é tudo. Meu pai, minha mãe e também minha irmã fizeram tudo pela gente. É a melhor parte do surfe, poder ter uma família que está envolvida e está lá por nós”, ressalta, também falando bem da gigante Rip Curl, seu patrocinador principal desde 2013, quando ainda tinha 13 anos, e que acaba de renovar por mais três temporadas.
“A Rip Curl está sendo incrível comigo. Em nenhum momento duvidou da nossa parceria. Sou muito grato em poder devolver a eles uma parte da confiança que me deram. Só tenho a agradecer por toda a parceria. Vou tentar dar meu melhor para conseguir representar a marca e tenho certeza de que ainda temos muitos anos de parceria”, agradece.
Miguel vive outro momento e depois de amargar a perda de patrocínio, teve na construtora de Praia Grande Nossolar o impulso que precisava, com o logo no bico de sua prancha esse ano, colaborando financeiramente também no fator psicológico. “Acabei perdendo meus principais patrocinadores ainda quando estava na elite e isso não fazia muito sentido para mim. Me pegou de surpresa e, obviamente, refletiu dentro e fora d’água. Mas, graças a Deus, ainda existem pessoas de confiança e vários dos meus co-patrocinadores seguiram ao meu lado como HB, Futures, Nossolar e outros que vieram para agregar”, explica.
“No começo desse ano eu e meu pai ficamos pulando de um lado para o outro atrás de alguém para entrar como patrocinador principal e ninguém quis ‘arriscar’. Me senti muito mal. Parecia que estavam me tratando como um aposentado, poucos abriram as portas para nos ouvirem. Eu liguei para o Rodrigão (o empresário Rodrigo Pacheco) e perguntei se ele não queria assumir esse ‘risco’, porque já era fevereiro e a maioria já tinha seu budget planejado e etc. Ele não pensou duas vezes e me deu esse voto de confiança. E a consequência foram os resultados, era o empurrãozinho que eu precisava! Hoje só tenho que agradecer a ele pelo carinho e suporte”, finaliza Miguel.