Na semana passada, recebi um convite para conhecer a Praia da Grama, endereço da primeira piscina de ondas boas para o surfe aqui no Brasil. Pego onda desde 1985 e já surfei algumas das melhores ondas do mundo, mesmo assim fiquei animado com a ideia de surfar numa piscina.
Ainda mais por poder dividir a aventura com meu filho, Luiz Henrique, 16 anos.
Quando viajo para pegar onda, é comum perder muitas horas analisando as previsões: direção do swell, período, vento, marés. Todos os detalhes são importantes para conseguir pegar as melhores condições.
Aqui na piscina foi mais simples, eles enviam uma mensagem na véspera e informam os horários em que rolam as ondas para iniciantes, surfistas intermediários ou avançados. Com o “swell” no radar e com os horários de cada série programados, partimos para nossa surftrip.
A primeira sensação foi estranha: sair de casa, com o carro cheio de pranchas, e não seguir para o litoral. A praia da Grama fica na região de Campinas, cerca de 80 km de São Paulo.
A viagem foi rápida, pouco mais de uma hora. Chegamos à praia, validamos nosso cadastro – o surf é exclusivo para convidados -, pagamos a taxa pra surfar, taxa que não é doce como a água da piscina, recebemos as pulseiras e imediatamente estávamos de frente ao pico.
Na verdade, são dois picos, duas ondas diferentes: uma esquerda e uma direita. Cinco minutos para trocar de roupa, colocar as quilhas, passar parafina e correr para o surf. Novamente uma sensação estranha, remar na água doce e fria.
Apesar do calor de 30 graus, a água não passou dos 18º. Eu, teimoso, cai sem roupa, “na casca”… Luizinho foi de short john e a maioria do crowd usava long. Confesso que não senti muito a falada diferença de flutuação pela água doce, mas segundo a ciência vale sim usar uma prancha com mais volume.
Caímos nas esquerdas, ao final do horário dos iniciantes. A onda dos iniciantes é bem marola, fraca, mas perfeita. Ideal para a molecada. Logo, passamos para a fase que eles chamam de intermediária e que começa com a onda Malibu.
Essa já é uma onda fun, meio cheia, só que mais forte e perfeita. Já dá pra começar a diversão. E com o passar das séries vão mudando os tipos de ondas, elevando o nível. O próximo desafio é a onda “T”, mais manobrável, mais em pé, com um drop um pouco mais difícil.
Muita gente, inclusive alguns mais experientes, param ali mesmo, no drop, e que por ser bem próximo da parede, acaba quebrando o bico de várias pranchas. Fiquei imaginando que daqui a um tempo a saída da piscina da grama vai ser como sair de Uluwatu, cheio de ding repairs aguardando seus clientes.
Voltando ao surf, após essa onda mais manobrável, eles começam a soltar a onda “B” ou barrel. É essa onda que aparece na maioria das fotos divulgadas da piscina, com uma seção tubular com um lip bem grosso.
Tem um drop mais fácil, espaço para uma manobra, ou duas, para os mais habilidosos, e termina na seção tubular. Dá pra passear dentro do tubo. E são alguns tipos de onda “B”, B1, B2, não sei exatamente quantas, mas o tubo vai mudando, trazendo um nível diferente de dificuldade.
Depois da seção de tubos, as séries começam a voltar para o nível intermediário, com ondas mais manobráveis, e depois, mais cheias. Aos poucos, voltam para o nível da molecada.
Tudo é muito organizado na piscina. A fila para o crowd funciona perfeitamente. E, ao lado do pico, no outside, fica um coordenador, explicando o melhor local para o drop – a parede é numerada para você saber exatamente onde dropar, avisando qual será a onda da próxima série e quantas séries faltam para mudar o estilo da onda.
Além disso, você surfa o tempo todo ao som de rock’n’roll.
O dia de surf na piscina tem seis horas, a primeira e a última são para os iniciantes, ou seja, sobram quatro horas para os mais fissurados. Dessas quatro horas, a onda “B” – quando rolam os tubos – funcionou só por uma hora, mas, pelo que entendi, eles podem definir isso, aumentando o tempo de cada onda ou alterando a ordem das séries.
Eu e o Luiz, marinheiros de primeira viagem na piscina, e fissurados, ficamos cinco horas surfando, quase todo o tempo nas esquerdas, e terminamos o dia dividindo as direitas dos iniciantes com a molecada.
E enfim veio o anúncio da última série. Fim de papo. Numa questão de segundos a piscina vira um lago. Terminamos o dia exaustos. Pode parecer que não, mas na piscina você rema o tempo todo, sem parar. Tem um canal que ajuda a voltar para o fundo, mas ficar cinco horas na água, sem intervalo, é um bom exercício.
Fiquei com braços e pernas cansados depois de tanta onda. A saída é rápida. Em cinco minutos você está no carro. O estacionamento dos visitantes fica ao lado da praia. Voltando para casa, na estrada, os pensamentos iam longe.
Quando eu poderia imaginar, depois de tantos anos surfando mares mexidos, difíceis, fechando, passando horas na arrebentação, que um dia eu poderia sair de casa para surfar numa piscina, com ondas perfeitas e tubulares.
Acho que o futuro chegou!
Olhei para o Luizinho e lembrei que na idade dele, o mais incrível era passar o dia no Playcenter.
Luiz Fernando Magalhães ou Tuí tem 47 anos, é viciado em viajar para pegar onda e é pai do Luiz Henrique, Mariana e Pedrinho. Sócio da Indotrips, Motorhome California e Octo. Instagram @tuiocto.