Reportagem feita pelo colunista Carlos Madeiro, revela que um dos destinos litorâneos mais tradicionais do turismo no Nordeste, Jericoacoara (CE) está sofrendo com a erosão marítima, que tem causado prejuízos e alterado o cenário de praias paradisíacas.
Após perder a duna do Pôr do Sol no primeiro semestre de 2023, o processo de erosão costeira tem se intensificado e causa preocupação.
O professor do Labomar (Instituto de Ciências do Mar) da Universidade Federal do Ceará, Paulo Sousa, explica que as dunas funcionam como uma barreira natural ao ataque das ondas e são uma importante fonte de sedimentos para a costa. “Daí a importância da preservação desses ambientes”, entende o pesquisador.
As dunas ficam dentro do Parque Nacional de Jericoacoara, administrado pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), órgão do governo federal. O parque foi criado em 2002 e tem área de 8.416 hectares.
Efeitos agravados
Em dezembro, uma ressaca do mar gerou ondas, que causaram uma erosão severa em um curto espaço de tempo, e preocupou os moradores locais, observa a presidente do Conselho Comunitário de Jericoacoara, Lucimar Marques. “A gente nunca tinha presenciado essa erosão, como a de agora. É uma das maiores que já tivemos”, diz.
Por conta do problema, a população colocou rochas para conter o avanço do processo de erosão.
“A água nunca tinha cavado tanto. E a nossa maior preocupação é que ali passa a rede de esgoto, e o temor é ter rompimento. Foram colocados sacos de areia e pedras, mas não resolveram muita coisa; e esteticamente fica feio”, conta Lucimar.
Porém, a tendência é que o cenário se agrave, caso ocorra novos eventos similares, diz o professor da Universidade Federal do Ceará.
“Essas ondas chegaram no período de maré de lua nova, período de marés de lua cheia ou nova sempre apresentam marés com maiores amplitudes. Isso causou grandes alterações nas praias, que já apresentavam algumas características de erosão”, revela Paulo Sousa.
Duna sumiu
O exemplo mais claro do problema foi o desaparecimento da duna do Pôr do Sol.
O professor explica que, na década de 1970, a duna ficava afastada da costa.
“Como é uma duna móvel, sem vegetação sobre ela, o vento transporta esse material. Então, a direção do vento predominante na região fez com que essa duna migrasse para próximo ao oceano”, explica Paulo.
Em paralelo à migração da duna, houve uma intensificação do turismo no final da década de 1990.
“Quando a duna chegou perto o suficiente do oceano, as ondas e correntes geradas por ondas intensificaram a erosão e transportaram os sedimentos das dunas para as praias a oeste. Quando ela chegou em frente ao mar efetivamente, as ondas começaram a quebrar no corpo da duna retirando grandes volumes de areia”, ressalta Paulo Sousa.
Até o ano passado, o local era um ponto de visita obrigatório de turistas, que iam para cima da duna assistir ao pôr do sol, que se põe em direção ao oceano. Inclusive, muitos pulavam pela duna em direção a praia.
Os processos de avalanche de areia, causada pela movimentação sobre a duna, fez o processo de erosão acelerar. Isso fez com que essa duna desaparecesse no primeiro semestre de 2023.
Ondas, ventos e ser humano
Segundo o professor, os processos de erosão e deposição no litoral são naturais, associado aos ventos, marés e ondas; mas o processo de ocupação desordenada gera áreas de risco e intensifica esses processos.
O professor estuda e visita Jeri há anos e explica que a vila tem crescido em direção ao sul, uma região que era trajeto de areia que vinha de leste para oeste na parte continental.
“Essa areia que alimentava as praias, ao oeste da vila, não chega mais. Ela iria alimentar dunas e iria alimentar praias”, conta o professor.
Somado a esse processo, o pesquisador cita que o crescimento urbano promove um aumento da compactação do solo.
“Nos períodos de chuva, é possível encontrar registros de que ali na proximidade da rua principal existe uma vazão hídrica muito acentuada, que proporciona também processos erosivos no solo. Isso causa prejuízos à região”, revela.
Órgãos monitoram
Responsável pelo Parque Nacional de Jericoacoara, o ICMBio afirma que monitora a situação “por se tratar de área contígua ao parque e se coloca à disposição dos órgãos competentes para auxiliar com estudos.”
Recentemente, a gestão do parque foi concedida à iniciativa privada por R$ 61 milhões em um leilão realizado este mês. O vencedor foi o Consórcio Dunas, que fez uma previsão de investimentos de aproximadamente R$ 116 milhões em infraestrutura no parque.
Segundo o ICMBio, porém, o contrato de concessão se restringe à prestação de serviços de apoio à visitação no interior do parque e não inclui intervenções e projetos fora dos limites da unidade.
A Secretaria do Meio Ambiente e Mudança do Clima do Ceará informou que o estado possui apenas uma unidade de conservação próxima a Jeri, a APA (Área de Preservação Ambiental) Lagoa da Jijoca, mas que ela não apresenta problemas de erosão.
Em nota, a Prefeitura de Jijoca de Jericoacoara informou que “foram acionados todas as secretarias municipais em ação coordenada pela Autarquia de Jericoacoara e Secretaria Municipal de Infraestrutura e Planejamento para envidar esforços para contenção e melhorias na área de praia”.
Além disso, afirma que estão apoiando no monitoramento de toda faixa de praia a Cagece (Companhia de Água e Esgoto do Ceará), o Labomar e governo do estado.
“A finalidade é encontrar soluções práticas de problemas em decorrência ao avanço das marés no nosso município”, afirma.
Fonte UOL