Assim que a californiana Courtney Conlogue abriu os braços para acelerar e, em seguida, frear sua prancha para se encaixar naquele tubo de backside, tive um flashback dos anos 70.
A havaiana Laura Blears, de Honolulu, irmã mais nova do campeão mundial Jimmy Blears, foi a primeira mulher a conquistar prêmio em dinheiro em um campeonato de surfe quando venceu o Smirnoff Pro (sim, vodka), em 1974. Esse foi o primeiro evento de surfe feminino profissional da história.
Porém, a foto da Laura que me veio à mente foi a dela fazendo um botton turn de backside, sem a parte de cima do biquíni. O clique ficou famoso na época. Aquilo foi uma das expressões da liberdade do surfe mais contundentes que já vi.
Laura deixava claro com aquela imagem que a beleza feminina pode ir muito além do sexismo sempre aplicado à imagem de uma mulher. Era como se ela dissesse, “sim, sou mulher, mas tenho controle e consciência do meu corpo e do que faço com ele”. É uma imagem para se admirar muito além da atração sexual que poderia despertar.
Aliás, que curvas. Tanto a da Laura quanto a da Courtney. É preciso entender o grau de complexidade aplicado nesse tipo de movimento. Parece fácil, mas ter controle e força necessária para que tudo funcione requer habilidade. Qualquer erro e, pronto, a onda já era. É bem mais difícil recuperar a linha e consertar a trajetória, caso a curva não seja exatamente como o planejado.
Gerry Lopez fazia isso de frontside em Pipe, assim Mark Richards, Shaun Tomson, Peter Townend e Terry Fitzgerald em ondas para a direita, só para citar alguns famosos. Sam Hawk perpetuou em foto essa curva de backside. Mas a diferença é que todos esses e a Laura usavam pranchas grandes e mais pesadas.
As pranchas de hoje, muito menores, pedem movimentos de aceleração, em curvas mais curtas, o tempo todo. Só quem já experimentou e tem o controle de fazer curvas com pranchas maiores acaba incorporando com mais naturalidade esse tipo de movimento.
A Courtney quis simplesmente inovar, fazer uma linha diferente para quebrar um pouco da mesmice do surfe moderno, explicitado pelas condições de ondas mecânicas como as de Lemoore. Pena que isso nem sempre se reflete positivamente na pontuação.
De todo jeito fica aqui minha homenagem à californiana que mostrou a curva com mais personalidade e espontaneidade do evento, bem ao estilo da risada dela. Inspiradora.